Frank Gehry: "As caixas de vidro enfadonhas são frias a pouco amigáveis"

Frank Gehry: "As caixas de vidro enfadonhas são frias a pouco amigáveis"
De  Euronews
Partilhe esta notíciaComentários
Partilhe esta notíciaClose Button
PUBLICIDADE

Frank Gehry é o arquiteto do momento, uma estrela que muitos países e investidores sonham contratar. Em Oviedo, foi distinguido pelo percurso profissional que acumula sucessos.

Aos 85 anos, o arquiteto canadiano, naturalizado americano, e autor do Museu Guggenheim de Bilbau não pensa em reformar-se, bem pelo contrário. Quer continuar a fazer história com os projetos icónicos que o caracterizam.

Javier Villagarcía, Euronews: Acabou de inaugurar um luxuoso museu em Paris. Numa altura em que o Centro Georges Pompidou lhe dedica uma retrospetiva, em Oviedo é galardoado com o Prémio Príncipe das Astúrias das Artes 2014. Como se sente com tanto reconhecimento?

Frank Gehry, arquiteto: “Muito desconfiado. Trabalho sempre com uma insegurança saudável. Por isso não acredito muito nestas coisas. Mas é bom, sinto-me bem. É uma sensação que não consigo explicar.”

Javier Villagarcía, Euronews: O presidente francês descreveu a Fundação Louis Vuitton como uma “catedral da luz.” Outros convidados da festa de inauguração puderam ver um barco de vela, um peixe, uma nuvem. Do que se trata?

Frank Gehry, arquiteto: “Tudo. Engloba todo o tipo de metáforas. Sou um marinheiro, navego, e quando se usa vidro não se podem pendurar quadros, por isso o verdadeiro edifício está dentro, um duplo edifício.”

Javier Villagarcía, Euronews: Em que se inspirou para criar um edifício tão surpreendente?

Frank Gehry, arquiteto: “Primeiro inspirei-me em Paris. Depois no aspeto sagrado do lugar. O Jardim da Aclimatação é um parque do século XIX (…) por onde passou Proust. Isso foi muito inspirador. Tenho um cliente, Bernard Arnauld, que de certa forma é uma espécie de artista. Tem formação na área da engenharia, mas com muita experiência no mundo da moda. Sabe trabalhar com artistas, com pessoas criativas.”

Javier Villagarcía, Euronews: Falamos de Bernard Arnauld, o presidente do grupo Louis Vuitton Moët Hennessy. Tornou-se seu cliente depois de uma visita ao Museu Guggenheim de Bilbau. Até que ponto é que é uma obra importante na sua carreira?

Frank Gehry, arquiteto: “Bilbau? Não posso dar uma percentagem, mas foi bastante importante.Teve impacto na cidade, mudou a cidade. Todos saíram a ganhar do ponto de vista económico. O preço foi modesto, 80 milhões de euros em 1997. Desde então já foi pago 17 vezes. A cidade está muito diferente agora em comparação com a minha primeira visita. Fico muito feliz, de certa forma é um milagre.”

Javier Villagarcía, Euronews: Muitas cidades gostariam de ter o próprio Guggenheim e contar com os seus projetos de arquitetura.

Frank Gehry, arquiteto: “Mas não me contratam. Contratam outros arquitetos para fazê-lo. É curioso. Não querem um arquiteto como eu, querem que seja outro a fazê-lo e por vezes não encontram.”

Javier Villagarcía, Euronews: Como arquiteto, é possível prometer a outra cidade ou a um investidor rico ter o mesmo impacto?

Frank Gehry, arquiteto: “Não posso prometer. Mas produziu-se o mesmo impacto com frequência. Aconteceu com o Walt Disney Concert Hall. Aconteceu em Chicago. Talvez tenha sorte.”

Javier Villagarcía, Euronews: Há oito anos disse num documentário: “quero esconder-me debaixo dos lençóis quando se inaugurarem edifícios com projetos meus. Aterroriza-me o que as pessoas possam pensar.” Ainda é assim?

Frank Gehry, arquiteto: “Sim. Se me puser na pele de outras pessoas, é certo que por vezes se sentem muito importantes quando fazem um edifício. Mas não me revejo nisso com facilidade. Talvez seja falsa modéstia, não sei. Mas eu sou mesmo assim, não posso evitá-lo. Como estou sempre a trabalhar num novo edifício tenho sempre uma insegurança saudável, como lhe chamo. Estou sempre a fazer algo, mas não estou certo se terá utilidade.”

Javier Villagarcía, Euronews: Li que algumas pessoas descrevem o talento de Frank Gehry como uma “loucura brilhante.”

Frank Gehry, arquiteto: “Não é assim tão louco. Primeiro sou um ser humano, tenho ADN humano e não consigo fugir à limitação do ser humano. Os grandes artistas foram sempre considerados loucos por isso devo sentir-me honrado.”

PUBLICIDADE

Javier Villagarcía, Euronews: Tem muitos projetos em curso. Um novo museu Guggenheim, agora em Abu Dhabi. O campus do Facebook na Califórnia. O Eisenhower Memorial em Washington. Alguma vez pensou abrandar o ritmo, reformar-se?

Frank Gehry, arquiteto: “Estou a pensar nisso agora (…), não sei. Gosto do trabalho, de conhecer pessoas. Tenho uma boa equipa. Tenho uma espécie de missão de devolver o poder ao arquiteto. Atualmente, no mundo, o arquiteto é menos importante do que um empreiteiro e quero regressar ao ponto em que pelo menos o arquiteto gere o projeto. Desenvolvi programas de computador com as empresas Dassault e Trimble para mudar os nossos programas (…). Bilbau representou o primeiro esforço real para usar este software no processo e poupámos muito dinheiro, num edifício que em condições normais custaria mais ao empreiteiro. Trabalhamos para baixar os preços. Isso deu mais poder ao arquiteto, uma margem maior para fazer as coisas, para fazer construções mais expressivas. A única razão para fazer edifícios mais expressivos é querer humanizá-los. As caixas de vidro enfadonhas são frias a pouco amigáveis, por isso tento mudar essa tendência.”

Partilhe esta notíciaComentários

Notícias relacionadas

Preservar a identidade do Qatar através do seu património arquitetónico

As mesquitas e as casas históricas são as maravilhas arquitetónicas do Qatar

Eliud Kipchoge: "A minha ambição é fazer deste mundo um mundo de corrida"