Ligados ao fundamentalismo islâmico, os atentados de Paris, voltam a colocar as populações muçulmanas ocidentais no centro das atenções. Muitos
Ligados ao fundamentalismo islâmico, os atentados de Paris, voltam a colocar as populações muçulmanas ocidentais no centro das atenções.
Muitos seguidores do Islão receiam ser alvo de represálias e de uma estigmatização, apesar de responsáveis políticos terem apelado à tolerância e de terem sublinhado que não existe qualquer ligação possível entre a violência e a religião muçulmana.
Entre os clérigos franceses há quem assuma a sua cota parte de responsabilidades, como o imã de Drancy, que aponta também o dedo à própria França.
“Porque utilizam eles a nossa juventude? É uma juventude francesa que vem combater a França, que esteve no Mali, estão atualmente na Síria e por aí adiante. Esse é o momento para se ver a responsabilidade de cada um, a sociedade civil, os políticos e também os magistrados. Penso que não os sancionamos como deveria ser”, afirma Hassen Chalghoumi.
As mensagens e gestos de solidariedade de responsáveis religiosos sucederam-se em França na sequência dos últimos ataques, mas também se verificaram atos contra símbolos islâmicos.
Estima-se existirem mais de 50 milhões de muçulmanos na Europa. Para percebermos melhor o fundamentalismo islâmico, a Euronews entrevistou Tariq Ramadan, professor de Estudos Islâmicos Contemporâneos na Universidade de Oxford.
Isabelle Kumar, euronews: Para ir diretamente ao assunto: porque é que estes homens mataram tanta gente?
Tariq Ramadan: Há várias razões. A primeira, é claro, é a forma como eles interpretam o Islão, ou a forma como o Islão lhes foi ensinado, segundo uma perspetiva maniqueísta. É essa a visão que tem eco na Síria, no Iraque, entre os grupos extremistas violentos, entre aqueles que defendem que os muçulmanos têm toda a razão e que todos os outros estão errados; que a França, os Estados Unidos, o Ocidente em geral oprime todos os outros. Há uma interpretação errónea.
IK: Há quem aponte o dedo a um falhanço da política de integração francesa…
TR: Não, não creio que a questão de fundo tenha a ver com a integração. A esmagadora maioria dos muçulmanos franceses, dos muçulmanos europeus, está inserida na sociedade. Basta ver as reações – todas as comunidades do Ocidente são consensuais na condenação do que aconteceu. Estamos a falar de um fenómeno à parte, que não tem nada a ver com o longo processo de integração. Em termos históricos, a verdade é que os muçulmanos fazem parte das sociedades europeias, das sociedades ocidentais. Temos de evitar colocar constantemente essa questão.
IK: Está a França a tornar-se num país racista?
TR: Não, esse tipo de generalizações é completamente errado. A França não é racista… apesar de haver racistas no país.
IK: Vive no Reino Unido. Como é que olha para as diferenças entre os dois países, nomeadamente na forma como se aborda a comunidade muçulmana?
TR: Aquilo que há é uma realidade transnacional, que existe na Alemanha, na Bélgica, em França, no Reino Unido – onde assistimos à subida do partido UKIP que estigmatiza os imigrantes e os muçulmanos, afirmando que o Islão não tem lugar no continente europeu. A minha posição é precisamente a contrária: o Islamismo é uma religião europeia, é uma religião ocidental, e essa é a realidade que temos de aceitar para construir um futuro em conjunto.
IK: Considera que os terroristas estão determinados a criar a divisão, de forma a agravar a islamofobia e a provocar uma maior radicalização?
TR: O que eles pretendem é alimentar a islamofobia, alimentar um sentimento de alienação e frustração. É isso que temos de enfrentar, é essa a mensagem que tenho transmitido a muçulmanos do mundo inteiro: que não se isolem, que não fiquem à margem, que se juntem à sociedade, que se tornem visíveis, que falem em nome dos que não têm voz, da maioria silenciosa que é contra o que está a acontecer.
IK: O Islão está a ser interpretado de forma cada vez mais violenta… estamos perante uma espécie de fileira religiosa que veio para ficar?
TR: Não é possível saber o que vai acontecer. Uma vez mais, isto é um fenómeno marginal em relação à esmagadora maioria dos muçulmanos.
IK: Mas que está a crescer…
TR: Está a crescer, mas continua a ser marginal. Eu passo 90% do meu tempo nos media a falar sobre o que o Islão não é. Ninguém me convida para falar sobre o que é o Islão, quais são os seus valores, como partilhamos a nossa espiritualidade. Colocam-me sempre numa posição defensiva. Explique-me porque é que você também não é um perigo? Porque é que não me pergunta sobre o meu contributo para a sociedade? No Ocidente, os muçulmanos são colocados ou na defensiva ou na posição de se desculparem. É preciso parar com esta forma de tratamento. Eu sou tão ocidental quanto a senhora, sou muçulmano e faço parte do futuro.