Didier Reynders, MNE belga: "Esperamos que o novo governo grego respeite os compromissos"

Didier Reynders, MNE belga: "Esperamos que o novo governo grego respeite os compromissos"
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De  Euronews com Audrey Tilve
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Didier Reynders já era vice-primeiro-ministro da Bélgica entre antes de 2011, no executivo de Guy Vorhofstadt, acumulando esse cargo desde 2004 com o

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Didier Reynders já era vice-primeiro-ministro da Bélgica entre antes de 2011, no executivo de Guy Vorhofstadt, acumulando esse cargo desde 2004 com o de ministro das Finanças e das Reformas institucionais. Atualmente, aos 56 anos, mantém-se como vice-primeiro-ministro no executivo de Elio di Rupo, mas passou a acumular com a liderança do Ministério dos Negócios Estrangeiros (MNE), do Comércio Exterior e dos Assuntos Europeus.

Numa altura em a mudança política na Grécia está no foco da atualidade europeia e em que os números oficiais apontam para que, à proporção, a Bélgica seja o maior fornecedor europeu de combatentes jihadistas para o grupo Estado Islâmico – cerca de 200 continuam a combater no Iraque e na Síria, uma centena já terá regressado ao país -, encontramo-nos com Didier Reynders para uma entrevista onde a Ucrânia e também o conflito israelo-palestiniano são abordados.

*Audrey Tilve, euronews: Didier Reynders, fala-se muito do seu país neste momento porque, tal como a França, está sob alerta de ameaças terroristas. Já vamos falar das estratégias em curso, mas, antes: como explica que a Bélgica seja um dos principais centros de operações “jihadistas” na Europa?
Didier Reynders: Estamos num país que integra comunidades diferentes e muito importantes. Fazemos um trabalho diário para identificar “jihadistas”. Em termos estatísticos, não sei se todos procedem da mesma forma. Espero que todos os países europeus sigam o que temos feito e que permitiu há dias à nossa polícia intercetar certos grupos que se preparavam para passar à ação. É por isso que este trabalho é essencial. Temos aqui células terroristas importantes, mas estamos a segui-las de perto e, repito, este é, provavelmente, o tipo de trabalho que faz a diferença: a identificação muito precisa das pessoas que representam algum risco.

Para tentar prevenir ou reprimir o terrorismo, muitos países europeus apresentaram um conjunto de propostas, onde se inclui, por exemplo, a privação do passaporte, do bilhete de identidade ou até da nacionalidade aos “jihadistas” ou aos potenciais “jihadistas”. Fala-se também da abertura nas escolas de aulas de cidadania e de moral laica. Parecem apenas medidas superficiais, à falta de melhor. Será que este tipo de medidas é realmente eficaz?
É muito importante que se retirem os passaportes e os bilhetes de identidade. Mas não por uma questão de identidade porque lhes será dado um outro cartão de identificação. O que pretendemos é mais por um controlo de circulação. Sem esses documentos, essas pessoas não podem voltar a viajar de forma livre se houver uma identificação clara do perigo que representam. Deve ser esta a abordagem. Referiu também outro aspecto na pergunta: a prevenção do radicalismo, a desradicalização. Aí, temos de agir onde já temos os meios. As prisões também são uma medida eficaz de isolar… (é interrompido)

… De reagrupar os fanáticos. Acredita mesmo que essa é uma boa solução?
Criar áreas específicas permite evitar que estes radicais contactem os jovens e os menos jovens de outras prisões, onde estes poderiam mais facilmente ser recrutados pelos extremistas.

Por outro lado, estarão em contacto uns com os outros…
Não necessariamente. Podemos criar um isolamento por células. Em todo o caso, eles já estão radicalizados. Por mim, podem ficar juntos. O que não devem, de forma alguma, é contaminar outros. Este deve ser o primeiro passo. O segundo, é a educação e o processo de aprendizagem.

Podem, estes cursos de cidadania, compensar de alguma forma as falhas da educação parental ou poderá isto atrapalhar o ensino normal?
Há duas coisas que temos de fazer na Bélgica – e, atenção, o caso belga não é igual ao francês nem ao de outros países. Aqui, antes de mais, temos de estar muito mais presentes na educação fornecida pelos imãs. Não temos, na Bélgica, uma formação específica de ensino para o culto muçulmano como temos, por exemplo, para o ensino do culto católico ou para a moral laica. Outro elemento ainda são os jovens. Na Bélgica, temos uma situação especial herdada da nossa própria história: Existem aulas de religião nas nossas escolas. Mas nas escolas oficiais, as crianças são separadas e cada uma segue uma doutrina religiosa diferente. O que devemos fazer é tentar mantê-las juntas numa sala. Falar-lhes não apenas de cidadania, mas da história das religiões e da capacidade de vivermos em sociedade mesmo quando temos convicções diferentes. Estas não são, contudo, soluções que permitam evitar um eventual ataque na próxima semana. Vão permitir, sim, que as próximas gerações possam – e esta é que é a verdade – reparar as falhas cometidas na promoção da actual convivência entre as diversas comunidades.

Pelo que escutamos, aqui na Bélgica, alguns muçulmanos referem-se às crises dos palestinianos, dos iraquianos e dos afegãos para relativizar os atentados de Paris. Existe um certo atrito entre estas crises, a sorte destes povos e o equilíbrio nas nossas sociedades. Será que isto não vai prejudicar a própria política belga, ou talvez até a política europeia, em relação a dossiês emblemáticos como o do conflito israelo-palestiniano?
Eu gostaria que houvesse maior presença da União Europeia no conflito israelo-palestiniano. Somos frequentemente relegados para segundo plano, deixando o protagonismo para os americanos. Devemos trabalhar em conjunto neste problema. Mas antes de tudo, deve ser retomado o diálogo entre Israel e a Palestina. Por outro lado, o que se passou em Paris é diferente: Jornalistas e caricaturistas foram mortos por exercer a liberdade de expressão; os polícias porque representam a autoridade; mas os judeus foram mortos simplesmente porque são judeus. Não podemos desculpar nem sequer entender os motivos que levaram a este tipo de atos, sejam eles sociais ou provocados por conflitos em curso pelo Mundo.

Gostaria que falássemos agora da Ucrânia, onde a situação continua a piorar. Constatámos isto com o recente ataque a Mariupol. Os europeus esperavam que as dificuldades económicas impostas à Russia levassem Putin a recuar, mas não. Qual será a solução para o conflito na Ucrânia, vê alguma?
Temos de colocar mais pressão sobre a Rússia. Isso faz-se através das sanções. Económicas, mas também individualizadas sobre as pessoas e sobre as entidades. Mas temos de aplicar estas sanções mantendo sempre um canal aberto para que possamos negociar com a Rússia.

Mas, senhor Reynders, há um ano que se tenta combinar firmeza e diálogo, mas sem grande sucesso. Já são mais de cinco mil os mortos na Ucrânia…
Temos de insistir nesta solução e manter o máximo de pressão possível sobre a Rússia.

O cenário de eventual divisão da Ucrânia, para si, ainda se mantém tabu? Pelo que temos visto, é isso o que está a acontecer. Putin está a dar forma ao conceito da Nova Rússia, uma Rússia expandida.
Isso é o que ele quer. O que nós queremos é que a Ucrânia promova reformas e tenha em conta a integração de todos os seus componentes. E, na Ucrânia, esse é um dos desafios em jogo. É provável que haja quem não se sinta representado, nem tão pouco se sentiria no passado, pelo poder de Kiev. Há, por isso, muito a fazer. O que não impede que se mantenha a integridade territorial e a soberania da Ucrânia.

Uma palavra sobre a Grécia, que esta semana está no foco da atualidade europeia. O novo governo vai pedir aos parceiros europeus o perdão de parte da dívida grega e para pagar o resto num prazo mais alargado, congelando o pagamento de juros durante um certo tempo. Estará a Bélgica aberta a ceder em alguns destes pedidos da Grécia?
Primeira coisa: a Grécia, sejam quem forem os seus governantes, deve respeitar os compromissos. Por isso, o que esperamos, antes de mais, deste novo governo grego é que respeite os compromissos… (interrupção ?)

Isso significa?…
Isso significa o regresso a uma situação saneada. Dito isto, se o novo governo grego vier com pedidos para que se alarguem os prazos de reembolso, para conseguirem forma de o pagar, isso poderá ser possível…

Há, então, uma abertura para prolongar o prazo de pagamento mas não para perdoar parte da dívida à Grécia, é isso?
Apenas recusamos colocar em causa todos os compromissos que a Grécia aceitou de livre vontade. Um governo deve respeitar os contratos que assina.

Foi, curiosamente, ministro das Finanças durante muito tempo. Sabe que 180 por cento de dívida é insustentável e que se não houver concessões, no final, haverá incumprimento da Grécia em prejuízo dos credores, boa parte deles os países os contribuintes europeus. É a isso que queremos chegar?
O que me surpreende mais no debate atual é que se coloque a Grécia contra a Europa. Não é a Europa que surge no caminho da Grécia, são todos os contribuintes europeus.
Quando se pergunta: “Estão preparados para perdoar a dívida à Grécia?” Isso significa que estão a pedir a um francês, a um alemão ou a um belga que eles paguem parte da dívida grega. Penso que não é por aí que estamos a trabalhar. Mesmo o Fundo Monetário Internacional diluiu bastante a dívida da Argentina e de outros, mas isso para que, no final, se chegue ao equilíbrio e que [o devedor] se consiga reembolsar por si só, um dia. O equilíbrio é o objetivo que temos de alcançar. O novo governo da Grécia deve dizer-nos o que pretende, mas também o que estão prontos a fazer dentro da própria Grécia.

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