Síria: A escuridão da guerra

Síria: A escuridão da guerra
De  Ricardo Figueira com BEATRIZ BEIRAS, LAURENCE ALEXANDROWICZ
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As imagens de satélite mostram um país apagado. As luzes de Alepo desapareceram quase por completo.

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A Síria é um país mergulhado nas trevas. Cidades como Alepo foram literalmente apagadas do mapa. Uma boa forma de provar isso é através das imagens de satélite. Basta comparar as de 2011, no início do conflito, com as de agora, para assistir ao completo ou quase completo desaparecimento das luzes. 83% no total do país, 33% na capital Damasco e 97% em Alepo, uma das cidades mais martirizadas.

Satelite images show how 83% of lights in #Syria have now gone out. Syrians literally plunged into dark http://t.co/1bR7g5vLGL#WithSyria

— Hadeel Al-Shalchi (@hadeelalsh) March 12, 2015

Ao quinto ano, o conflito não dá sinais de abrandar. Imagens agora divulgadas mostram um avião da força aérea síria a bombardear uma cidade nos arredores de Damasco, ou ainda um helicóptero, também do regime de Assad, a largar um barril de explosivos no bairro de al-Sakhour, em Alepo.

Estes barris podem destruir bairros inteiros, como denuncia a WithSyria, uma união de 130 ONG. Como acontece sempre nas guerras, são os civis a pagar a fatura mais elevada. 2014 foi o ano mais sangrento, com mais de 76 mil mortos na Síria. Desde março de 2011, morreram 210 mil pessoas, vítimas do conflito.

An entire generation of Syrian children like 3-year-old Nabil* have only known life during war. #WithSyria: pic.twitter.com/dCl8wM2jnO

— Save the Children US (@SavetheChildren) March 10, 2014

A chegada de ajuda humanitária a dois bairros cercados, em Alepo, em abril do ano passado, foi uma imagem rara, fruto de um acordo pontual entre o governo e a oposição. Segundo as ONG, 7,8 milhões de sírios vivem em zonas de acesso difícil para a ajuda humanitária, o dobro dos valores de 2013.

Uma exposição na sede da ONU em Nova Iorque revela outra faceta do horror da guerra: A da tortura, que continua a ser praticada pelo regime de Assad. As fotos foram realizadas por um fotógrafo do exército sírio que fugiu do país com a ajuda da oposição.

“No último mês, segundo uma organização de direitos humanos, o regime torturou até à morte 84 prisioneiros. O regime tem de responder por esses atos e isso tem de fazer parte de qualquer solução política. Foi a impunidade que encorajou estes crimes, tal como encorajou grupos extremistas como o dito Estado Islâmico”, diz Najib Ghadbian, representante da oposição síria na ONU.

Na semana passada, o Conselho de Segurança da ONU votou uma resolução a condenar o uso de cloro.

No ano passado, foram votadas quatro resoluções para proteger os civis sírios, mas a verdade é que nenhuma delas foi, até agora, aplicada.

Some images of people around the world standing #WithSyria Please Visit http://t.co/AJGjxNNSwC and stand with them pic.twitter.com/I3ZfKmyOf5

— #WithSyria (@WeAreWithSyria) March 11, 2014

Entrevista

A repórter Laurence Alexandrowicz falou com Laurent Chapuis, perito da UNICEF, sobre a situação humanitária das crianças sírias.

Laurence Alexandrowicz. euronews: Quatro anos depois do início da guerra na Síria, o senhor conhece bem a situação no país, sobretudo das crianças, já que trabalha na Jordânia para a UNICEF. Pensa que ainda é possível trabalhar na Síria?

Laurent Chapuis: É extremamente difícil, mas respondemos às necessidades de 14 milhões de crianças que são hoje afetadas por esta crise, seja na Síria ou nos países vizinhos. Durante o ano de 2014, a UNICEF e os parceiros conseguiram vacinar três milhões de crianças contra a poliomielite na Síria, sobretudo nas zonas controladas pelo governo, mas também nalgumas zonas controladas pela oposição. Já vacinámos mais de 800 mil crianças contra o sarampo e apoiamos o acesso à educação de 2,8 milhões de crianças na Síria.

Laurence Alexandrowicz. euronews: Como pensa que a situação evoluiu nestes quatro anos? Há as bombas de Bashar el-Assad e, desde há alguns meses, a crueldade do dito Estado Islâmico…

Laurent Chapuis: As condições de vida das crianças só se deterioraram na Síria. As crianças são expostas a atos de violência gravíssimos. São recrutadas para os grupos armados, são detidas e são alvo de abusos sexuais. As escolas e centros de saúde são atacados. Estas violações não param de crescer desde há quatro anos.

Laurence Alexandrowicz. euronews: Temos muito pouca informação sobre o que se passa na Síria: Há zonas onde as crianças são mais poupadas, ou onde tenham uma vida mais ou menos normal?

Laurent Chapuis: Na Síria, há locais onde há escolas e centros de saúde que ainda funcionam. No entanto, mesmo se podemos pensar que a situação está normalizada nestas zonas, é preciso notar que mesmo em Damasco há populações cercadas. Falámos há pouco tempo do campo palestiniano de Damasco, o campo de Yarmouk, disputado entre as forças governamentais e da oposição, onde 20 mil palestinianos tentam sobreviver e onde a ajuda humanitária, seja ela médica ou alimentar, só entra a conta-gotas.

Laurence Alexandrowicz. euronews: Há crianças a fugir sozinhas?

Laurent Chapuis: Há hoje dois milhões de crianças sírias a viver nos países vizinhos. Dois milhões de crianças refugiadas, das quais 8000 passaram a fronteira sozinhos, sem os pais, não acompanhadas. Estas crianças beneficiam também da ajuda dada pela UNICEF e pelos parceiros.

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São programas muito complexos, que exigem muitos recursos. Se a UNICEF quiser levar a bom porto as operações que prevê para 2015, vai precisar de 900 milhões de dólares para responder às necessidades das crianças sírias, tanto no país como nos países vizinhos, mas também das crianças das comunidades de acolhimento, ou seja, crianças libanesas, jordanas, turcas e iraquianas. Infelizmente, até agora, a UNICEF só conseguiu arrecadar 100 milhões de dólares e já estamos em março.

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