A pequena Lituânia enfrenta o gigante Gazprom

A pequena Lituânia enfrenta o gigante Gazprom
De  Hans von der Brelie
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Romas conduz os seus homens até ao “Vitória” e ao “Independência”. O “Vitória” é um pequeno barco que faz o transporte entre o porto lituano de

Romas conduz os seus homens até ao “Vitória” e ao “Independência”. O “Vitória” é um pequeno barco que faz o transporte entre o porto lituano de Klaipeda e o gigantesco “Independência”, um terminal metaneiro flutuante que chegou ao país em outubro. A infraestrutura permite armazenar gás natural liquefeito (GNL) proveniente de qualquer parte do mundo que é, em seguida, distribuído pelos países Bálticos.

Romas e os seus homens têm como missão proteger o “Independência” que desempenha um papel vital na atual política energética da Lituânia. Antes da chegada deste terminal, a totalidade do GNL que o país importava era fornecido pela companhia estatal russa Gazprom. O governo de Vílnius pode agora diversificar as fontes de aprovisionamento.

Tadas Matulionis, diretor do terminal GNL de Klaipeda:

“Este terminal permite à Lituânia, pela primeira vez na história, escolher o seu fornecedor em qualquer parte do mundo e deixar de estar dependente de uma única companhia, como a Gazprom. Agora temos gás natural a fluir da Lituânia rumo à Letónia e à Estónia, algo que era impensável há apenas um ano.”

A Comissão Europeia acusa a Gazprom de abuso de posição dominante nos países Bálticos, Bulgária, Eslováquia, Hungria, Polónia e República Checa. De acordo com Bruxelas, as tarifas são sobrecarregadas em 40 por cento, em alguns casos. A companhia russa diz que a acusação não tem fundamento.

A UE fomenta a cooperação regional para que os estados da região se tornem menos dependentes dos fornecimentos russos. Uma nova rede de gasodutos está atualmente a ser construída entre a Finlândia e a Estónia e entre a Polónia e Lituânia. A capacidade da rede existente também está a ser alargada, nomeadamente para rentabilizar o potencial do terminal metaneiro que foi instalado em Klaipeda. Este gasoduto foi classificado como um “projeto de interesse europeu comum” e deverá estar terminado no final do ano. A ligação de 110 quilómetros ao terminal flutuante foi orçada em 64 milhões de euros. Quase metade do financiamento é proveniente de fundos europeus.

A política energética da União Europeia tem como objetivo a liberalização do mercado do gás e a separação entre a rede de distribuição e o fornecedor, ou seja, os gasodutos não devem ser propriedade da companhia que vende o gás. Uma regra que desagrada à Gazprom.

Esta nova infraestrutura vai permitir a distribuição do GNL fornecido pela Noruega.

Darius Dudutis, operário:

“Estamos a construir um novo gasoduto entre Klaipeda e Kursenai capaz de transportar o gás natural liquefeito que chega à Lituânia pelo novo terminal. A capacidade instalada não era suficiente. O velho gasoduto era muito pequeno.”

A Comissão Europeia lançou um inquérito às políticas de preços da Gazprom a pedido da Lituânia. As conclusões motivaram uma ação legal. A Euronews tentou obter uma reação da companhia russa mas a resposta foi negativa. A Gazprom poderá estar interessada em alcançar um acordo, caso contrário a multa poderá atingir um montante máximo a rondar os nove mil milhões de euros.

A Lituânia apressa-se a terminar esta obra. Se a Rússia fechar a torneira, as três ex-repúblicas soviéticas terão em breve uma alternativa.

Andrius Dagys, diretor técnico da Amber Grid:

“Este gasoduto é muito importante porque vai permitir fornecer aos três Estados Bálticos cerca de 80 por cento das suas necessidades de gás.”

Moscovo considera a ação legal movida pela Comissão Europeia contra a Gazprom “inaceitável” e acusa Bruxelas de tentar aplicar a lei europeia de forma retroativa. Já o governo lituano denuncia o que considera uma chantagem do Kremlin. O ministro da Energia, Rokas Masiulis, explica porquê:

“Nós decidimos ter uma segunda fonte de fornecimento para a eletricidade, para o gás, e deixarmos de estar 100 por cento dependentes da Rússia. Depois de tomarmos a nossa decisão fomos castigados. O preço do gás subiu 20 por cento quando comparado com o dos nossos vizinhos. É por isso claro que a subida do preço foi motivada politicamente e tivemos que ripostar. Estamos a falar de milhares de milhões de euros. Na Europa temos de mostrar que temos regras e que as regras têm de ser respeitadas não só pelos europeus mas também por países terceiros, incluindo a Gazprom.”

Entretanto, os incidentes com a Rússia multiplicam-se. Vílnius acusou Moscovo de perturbar a instalação de um cabo elétrico submarino entre a Lituânia e a Suécia. O Kremlin afirmou ter protegido exercícios militares no mar Báltico.

As obras aceleram para concluir a instalação do cabo de 700 Megawatts até ao final do ano. Um segundo cabo de 500 Megawatts está a ser instalado para ligar a rede lituana à polaca. Vílnius pretende ligar a sua rede elétrica à Europa e integrar o seu mercado no conjunto europeu. Algo que Moscovo não vê com bons olhos.

O diretor-executivo da Litgrid, Daivis Virbickas, explica-nos qual é o objetivo da companhia que gere a rede elétrica nacional:

“Os países Bálticos têm como estratégia de longo prazo a sincronização das nossas redes com a rede europeia. Atualmente estamos sincronizados com a rede do tempo da União Soviética que foi edificada há 50, 60, 70 anos. Pretendemos criar uma interdependência económica e técnica com os nossos parceiros da União Europeia.”

Outra forma de assegurar a independência energética passa pela redução do consumo. A União Europeia financia programas de renovação urbana em todos os estados-membros. Em Vílnius, por exemplo, o dinheiro dos contribuintes europeus está a ser utilizado para isolar velhos apartamentos de construção soviética e assim evitar o desperdício de energia.

Gediminas Purvelis, associação de residentes:

“Antes dos trabalhos de renovação o sistema de aquecimento central estava completamente desajustado. Os apartamentos mais afastados permaneciam gelados enquanto os mais centrais pareciam autênticas saunas. Agora é possível ajustar a temperatura, individualmente, em cada apartamento. O governo lituano subsidia os custos de renovação em 40 por cento, na generalidade dos casos. O Estado suporta o custo total às famílias que recebem apoios sociais.”

Até ao final do ano deverão ser concluídos um milhar de projetos. Na Lituânia há cerca de 34 mil apartamentos a necessitar de um plano de renovação energética.

Esta família de quatro pessoas vive num apartamento de 44 metros quadrados. A renovação custou 9 mil euros, 5 mil a cargo da família. Um montante elevado para os rendimentos familiares, mas trata-se um bom investimento.

Ruta, residente:

“Nos meses frios costumávamos pagar cerca de 90 euros por mês de aquecimento, o que é imenso para nós. Depois da renovação esperamos reduzir a fatura em 30 euros. Além disso vamos viver num ambiente melhor, mais saudável para as crianças. Enfim, mais eficiente em termos de consumo e mais quente.”

Muitos lituanos receiam a dependência da energia russa. Mas se Moscovo decidir cortar os fornecimentos agora há uma alternativa. Com a diversificação do aprovisionamento a luz vai continuar a brilhar.

‘‘A Gazprom deve respeitar as regras europeias da concorrência’‘

Clique neste link para aceder à entrevista com Marius Juonys, perito em direito europeu da concorrência. Juony trabalha para a Lawin, com sede em Vílnius mas que abarca os três Estados Bálticos.

‘‘Os russos tentaram castigar-nos’‘

O ministro lituano da Energia, Rokas Masiulis, explica a razão pela qual o país investiu fortemente na diversificação das fontes de energia. A Euronews entrevistou-o em Vílnius. Masiulis denuncia a posição dominante da companhia estatal russa Gazprom.

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