Comprar no mundo virtual: A revolução do Mercado Único Digital

Comprar no mundo virtual: A revolução do Mercado Único Digital
De  Nuno Prudêncio
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Há quem resista à tecnologia e há quem a veja como uma oportunidade. A realidade é que o mundo não para: a Europa está a conetar-se ao Mercado Único

Há quem resista à tecnologia e há quem a veja como uma oportunidade. A realidade é que o mundo não para: a Europa está a conetar-se ao Mercado Único Digital.

Um dos pilares da Europa assenta na liberdade de circulação de pessoas, bens e serviços. No entanto, o comércio eletrónico além-fronteiras continua a representar uma fatia pouco expressiva perante o recurso aos serviços a nível nacional e à oferta providenciada pelo mercado americano. Calcula-se que o Mercado Único Digital possa conduzir a um crescimento económico na UE de 415 mil milhões de euros por ano. Isto para além da criação de centenas de milhares de empregos.

Um setor prestes a mudar

Os milhões e milhões de internautas que existem são potenciais clientes para as empresas do setor digital. Mas, para que isso aconteça, o Mercado Único Digital pretende remover vários obstáculos no sentido de facilitar a liberdade de prestação de serviços no mundo virtual.

Esse objetivo passa por harmonizar as regras na União Europeia e pela existência de mecanismos que garantam a cibersegurança das operações, sobretudo no que diz respeito à proteção de dados pessoais.

Propõe-se igualmente acabar com bloqueios geográficos que impedem, por exemplo, o acesso noutros países a serviços de entretenimento, como música e filmes, já subscritos. As empresas e consumidores podem também beneficiar do esbatimento das diferenças nacionais em termos de direitos de autor, da disseminação da internet a alta velocidade e ainda da redução dos encargos relativos ao pagamento de IVA.

Ao comprar um produto no espaço europeu, um consumidor pode descobrir que não terá garantias ou que as entregas não são efetuadas no seu país. O Mercado Único Digital tenciona precisamente proteger os consumidores destas eventualidades e harmonizar os contratos comerciais, os impostos aplicados e as despesas inerentes nos países da União Europeia.

Uma barreira chamada “leis nacionais”

Quase metade dos europeus já aderiu ao comércio virtual no seu próprio país. Mas apenas 15% compram além-fronteiras. Para ganhar velocidade, a empresa de Jean-Daniel Guyot, Captain Train, teve de se adaptar a diferentes normas nacionais. Trata-se de um site que promete revolucionar a compra de bilhetes de comboio e que, lá está, teve de estabelecer acordos com diferentes operadores europeus.

“É uma questão muito problemática. A nível nacional, temos reformas a cada seis meses que abrangem áreas novas, seja o comércio eletrónico, seja o direito do trabalho. E nós temos de acompanhá-las em cada país europeu. Ou seja, precisamos de um sistema único, um sistema que seja simples, com as mesmas regras para toda a gente, porque passar o tempo todo a tentar compreender o que se passa significa perder tempo que podia ser utilizado a criar valor”, afirma Jean-Daniel.

Nove mil euros – é a estimativa de quanto custa às PME o processo de adaptação às normas legais de outro país para estabelecer um contrato comercial. E se as legislações europeias são autênticos labirintos para os profissionais do setor virtual, imagine-se para o cidadão comum que pretende simplesmente fazer uma compra online.

Nicolas Godfroy, da associação de defesa dos consumidores UFC Que Choisir, considera que “a confiança tem de ser a prioridade para os profissionais desta área. Só assim é que se torna possível atrair mais consumidores, sobretudo tendo em conta que as pessoas estão perante um sistema novo. Antes, os clientes entravam numa loja, pediam informações, viam se os empregados eram ou não simpáticos, se estavam disponíveis para esclarecer dúvidas… Agora é preciso criar uma outra atmosfera de confiança para que os consumidores se possam decidir a comprar noutro país.”

A Estónia lidera o caminho

A Estónia está na linha da frente no que toca ao desenvolvimento digital de serviços públicos. Há um exemplo bastante elucidativo: os estonianos têm um cartão de cidadão que permite assinar contratos online, votar à distância ou pagar os transportes públicos. Sendo um mercado pequeno no contexto europeu, este país tornou-se num caso de estudo no que toca à evolução do setor digital.

No sistema de saúde estoniano, todos os dados relacionados com um paciente estão em formato eletrónico. Numa situação de emergência, os médicos podem recolher as informações necessárias através do cartão de cidadão. “Temos acesso a tudo: todas as análises feitas, raios X, ecografias, as operações efetuadas. Há muitos médicos da velha guarda que não utilizam o sistema. Mas as novas gerações vão, sem dúvida, aderir”, diz-nos Erast-Henri Noor, do Centro Médico Estónia Norte.

O desenvolvimento dos serviços digitais está a tornar incontornável a aquisição de novas competências e a reformulação de funções. “Os médicos têm de se libertar das tarefas administrativas mais simples que executam hoje em dia, e que estamos a delegar aos enfermeiros. Estes, por sua vez, atribuem outras tarefas ao pessoal administrativo. E por aí fora…”, afirma Marko Kilk, diretor de IT neste centro.

Hospital IT departments worked with doctors to make mobile app to access all Estonians' medical records in seconds pic.twitter.com/QgJHIN9qK9

— Denis Loctier (@loctier) 29 Janvier 2016

Os especialistas aplaudem a organização dos programas nacionais de inclusão digital que têm formado dezenas de milhares de pessoas em tecnologias de informação nos últimos anos. Segundo Ain Aaviksoo, do Ministério dos Assuntos Sociais, “o Mercado Único Digital gera emprego. Pode vir a esvaziar algumas áreas onde a intervenção humana é mais premente, como na área da saúde, nos hospitais, mas vai criar postos de trabalho noutros setores, incluindo nas empresas que desenvolvem produtos e serviços que podem ser vendidos fora da Europa.”

O futuro deste pequeno Estado báltico com apenas 1 milhão e 300 mil habitantes parece ter começado mais cedo.

A visão de Andrus Ansip, vice-presidente da Comissão Europeia e responsável pela pasta do Mercado Único Digital

Maithreyi Seetharaman, euronews: Que ações concretas vão ser tomadas em 2016?

Andrus Ansip: A estratégia do Mercado Único Digital foi lançada no passado mês de maio. E as coisas estão a avançar muito rapidamente. Propusemos a portabilidade transfronteiriça de conteúdos digitais na União Europeia. Fizemos uma outra proposta que diz respeito aos contratos digitais. Hoje em dia, existem mais de 50 regulações diferentes relativamente às compras online e aos contratos digitais. Nós avançamos com a ideia de ter apenas duas regulações. Vamos tentar alcançar um acordo o mais cedo possivel. O objetivo é conseguir o consenso em torno disto durante o primeiro semestre deste ano e autorizar a portabilidade assim que extinguirmos os custos de roaming.

euronews: As empresas estão preocupadas com o impacto que tudo isto pode provocar…

AA: Se alguém lhe disser que pode comprar uma caixa de chocolates aqui mas que não os pode comer na Bélgica por exemplo, vai certamente pensar que se trata de um disparate. Esse é o argumento do modelo económico que é a base do comércio digital. Em pleno século 21, não podemos aceitar a discriminação motivada pela nacionalidade ou pelo país onde o cartão de crédito foi emitido. Este ano vamos fazer ainda outra proposta para melhorar o acesso transfronteiriço aos conteúdos digitais.

euronews: Até que ponto é exequível implementar mudanças em 28 países?

AA: É exequível. Espero que consigamos obter o consenso relativamente às regras contratuais das vendas online. As mudanças nas regras sobre o IVA foram pensadas para facilitar as transações. Mas creio que vai continuar a haver taxas diferentes ainda durante um longo período de tempo.

euronews: O Mercado Único Digital interessa naturalmente às empresas do setor. Mas o que tem a dizer às empresas tradicionais e às pessoas que têm receio de perder o emprego?

AA: Lamento ter de dizer isto, mas é verdade que, em alguns setores, há pessoas que vão perder o emprego. Mas tomemos o exemplo da economia em torno do desenvolvimento de aplicações. Em 2014, só na União Europeia, esta indústria empregava 1,8 milhões de pessoas. Os prognósticos apontam para 4,8 milhões em 2018. O progresso vai criar mais emprego do que destruí-lo.

euronews: Os investidores internacionais vão ter mais dificuldades na Europa?

AA: Não aplicamos regras diferentes para os estrangeiros. Mas, mais uma vez, temos de nos perguntar: porque é que as startup, porque é que a Spotify, que foi criada na Suécia, teve de sair da União Europeia para os Estados Unidos para conseguir ganhar dimensão? Temos de criar um mercado único digital na União Europeia de forma a manter os nossos cérebros aqui.

some sectors will lose jobs But progress creates more jobs than destroys them Ansip_EU</a> <a href="https://twitter.com/hashtag/DSM?src=hash">#DSM</a> <a href="https://twitter.com/hashtag/realeconomy?src=hash">#realeconomy</a> <a href="https://twitter.com/euronews">euronewspic.twitter.com/p9ZZIBo4kA

— Maithreyi (@maithreyi_s) February 3, 2016

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