"A prioridade de Chavez era a luta contra a pobreza mas agora há mais pobres do que antes", Henrique Capriles

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A Venezuela é um país à beira do colapso: a inflação ronda os 700%, a mais alta do planeta, escassez, insegurança e uma violenta luta política entre um governo que não quer deixar o poder e uma oposiç

Henrique Capriles é um dos líderes desta oposição. O ex-candidato presidentecial é hoje um dos organizadores de um referendo revogatório que pede a saída do presidente Nicolas Maduro.

Alberto de Filippis, euronews:
“Henrique Capriles o que é um referendo revogatório, como funciona e porque é tão importante fazê-lo este ano?”

Henrique Capriles, líder oposição Venezuela:
“Todos os funcionários eleitos, foram eleitos por um voto popular. Quando se cumpre metade do mandato, no caso da presidência são seis anos, quando se crumpre o terceiro ano, 20% dos venezuelanos inscritos no registo pode solicitar um referendo para se pronunciar sobre esse funcionário público. O resultado pode ser a revogação do mandato, ou seja, deve terminar ou a manutenção até ao final que seriam os seis anos. Porque apresentámos um revogatório? Primeiro porque já se chegou à metade do mandato e segundo porque a Venezuela vive a pior crise da sua história.

A Venezuela já teve outras crises no passado mas neste momento vive a pior crise económica, social e política da história do nosso país. O que procuramos com o revogatório? Uma solução para a crise política. Porque necessitamos de uma solução para a crise política? Porque é o governo que controla praticamente toda a economia, o governo é responsavel pelo facto de termos a inflação mais alta do mundo, a pior escassez do mundo, na Venezuelas há filas, neste momento, filas enormes para comprar artigos de primeira necessidade, para comprar alimentos, para comprar medicamentos.

O governo é responsável por estarmos nesta situação e o governo não quer que nada mude. O governo quer que tudo fique na mesma. Quando isto ocorre, a crise torna-se mais profunda, a crise política tornar-se mais profunda e nós insistimos no referendo porque acreditamos numa solução democrática, constitucional, pacífica e, na minha opinião, eleitoral. Esta situação como a que estamos a viver na Venezuela só pode ser resolvida pelo povo venezuelano”.

Biografia: Henrique Capriles

  • Político venezuelano e advogado
  • Cargo atual: 36º Governador de Miranda
  • Co-fundador do partido político Primero Justicia e antigo candidato presidencial ---

Alberto de Filippis, euronews:
“Se o referendo não ocorrer este ano, o que fará a oposição?”

Henrique Capriles, líder oposição Venezuela:
“Na minha opinião, se não houver revogatório na Venezuela este ano, podem ocorrer tumultos sociais, uma explosão social ou, fruto desta tensão que todos os dias cresce, pode ocorrer um golpe militar. Nós não queremos nem os tumultos sociais nem o golpe militar. Por isso estamos a promover uma solução que está na constituição, o revogatório”.

Alberto de Filippis, euronews:
“Falando do risco de um golpe militar: o exército, a política”.

Henrique Capriles, líder oposição Venezuela:
“Um polícia na Venezuela, um guarda nacional , tal como lhe dizia antes de começar a entrevista, são os que recebem pior em todo o continente. Um polícia ganha 30 dólares por mês na Venezuela, 30 dólares. Sabe quanto custa manter uma família de cinco pessoas? 185 dólares. Como vive um polícia? Como vive um guarda? Se me pergunta sobre a situação deles, quase todos os funcionários da polícia, da guarda, quase todos vêm dos bairros, dos setores humildes do nosso país. Não são ricos, não são milionários.

Também os polícias são afectados pela crise. Vivemos isso todos os dias. Estes funcionários não querem reprimir, não querem usar da força para evitar o mecanismo constitucional, pelo contrário. Eles gostariam, tenho a certeza disso, que ocorre a votação. Porque sabem que uma eleição vai mudar o governo e vamos começar a recuperar a Venezuela. A Venezuela não tem futuro com Maduro. Vocês que estão fora devem saber disto. Um governo que perde as eleições em dezembro do ano passado, há pouco mais de seis meses, perderem as eleições. Perderam de forma contundente. E continuam com o mesmo discurso.
Sabe qual é o discurso do governo em relação à crise económica? Dizem que aqui há uma guerra económica. Uma guerra económica? De quem? Acredita que o problema que a Venezuela está a viver tem algo relacionado com os Estados Unidos ou tem algo relacionado com outro país do planeta? Não!

O problema que vivemos na Venezuela é que se esbanjou muito dinheiro, roubou-se, destruiu-se o aparelho produtivo. Foi roubada a maior bonança petrolífera da história da Venezuela. No país, nos últimos anos, foram investidos mais de mil biliões de dólares. Onde está esse dinheiro? Onde estão os recursos? Porque é que hoje se passa fome na Venezuela? Sabe o que comem os venezuelanos? Mangas. É disto que se alimenta uma boa parte dos venezuelanos, manga! Era impensável há uns anos que os venezuelanos fossem chegar a uma situação de fome. A fome chegou e aumenta a cada dia. O que podemos fazer face a isto? Temos de mudar. Temos de procurar a mudança. Porque não acreditamos no tumulto”.

Alberto de Filippis, euronews:
“Se fosse presidente, quais seriam as suas primeiras medidas? Sobretudo no setor económico? Recorreria ao FMI, por exemplo?”

Henrique Capriles, líder oposição Venezuela:
“Há muitas pessoas no exterior que pensam que a Venezuela só tem petróleo. Não. Não é verdade. Se conhecer o meu país vai dar-se conta que a Venezuela tem toda a terra necessária para produzir todos os alimentos. A Venezuela tem reservas de gaz, ouro, existem muitas minhas. A Venezuela tem reservas de coltan, das maiores do mundo. A Venezuela tem a maior reserva de água doce do planeta. A Venezuela tem possibilidades de desenvolver o turismo. A Venezuela é, e não digo isto porque sou venezuelano, você pode constatar, é um país que tem tudo.

A chave para que a economia funcione é que se gere confiança. Os investidores de todo o mundo estão à espera da mudança para vir para a Venezuela. Porque falta fazer tudo. É um país onde há muitas hipóteses de investir, gerar emprego, gerar oportunidades. É um país pequeno em termos de população, somos 30 milhões. Com a reserva de petróleo mais importante do planeta, com este potencial todo. Hoje o problema da Venezuela é político. O problema é político e é necessário resolvê-lo politicamente.

Mas aqui na Venezuela só há uma forma de resolver a crise política, para que o percebam na Europa, aliás já o disse (estive reunido com o ex-presidente Zapatero duas vezes nas últimas horas), é preciso que se perceba: a cultura do diálogo foi destruída!.

Nos últimos anos fomos sujeitos a uma política de confrontação, não de diálogo. Aqui não há cultura de diálogo como existe na Europa: nos parlamentos nacionais dialogam. Qual é o cenário natural do diálogo? O parlamento. Depois é necessário votar mas sempre partindo do princípio que são necessários acordos, fazer política. Aqui nem política se faz. Assim, a única coisa que nos resta é convocar o povo a votar. Que seja o povo a escolher, a decidir. O governo quer sentar-se a uma mesa para quê? Para que não haja revogatório. Para que calar os 2,6 milhões que assinaram o pedido de referendo. Isso não é aceitável. Porque repito, o diálogo não serve para negociar a constituição. O diálogo deve servir para restabelecer a constituição, a maior instituição do país”.

Alberto de Filippis, euronews:
“Se fosse presidente quais seriam as relações com os países irmãos, como Cuba?”

Henrique Capriles, líder oposição Venezuela:
“Castro aproveitou-se de nós e continua a aproveitar-se. Mas quando Cuba se apercebeu que a Venezuela estava a ficar sem dinheiro, sem recursos, o que fez? Negócios com os americanos! É assim em Cuba. Agora o mundo quer investir em Cuba. Por isso, quando me pergunta: relação com Cuba? Se for eu a tomar a decisão, não vou continuar a oferecer petróleo. Porquê? Porque temos de encontrar soluções para um país que tem 80% de pobreza e ainda temos de oferecer petróleo? Num país como o nosso onde há pessoas a passar fome? Onde não há medicamentos, onde não há bens de primeira necessidade? E ainda temos de oferecer petróleo? para quê? Para ficar de bem com alguém? Para ter amigos? Acredita que os amigos se compram? Os amigos estão lá nos bons e maus momentos.

Eu sei que as histórias do povo cubano e do povo venezuelano estão unidas, estamos no mesmo continente. Somos latinos. Mas não me peça, na atual situação em que vive a Venezuela, para continuar a oferecer recursos. Não posso. Primeiro. “luz em casa”: não posso ter escuridão em casa e luz fora. Para quê? Para ter um voto na Organização dos Estados Americanos? Por uma questão de cumplicidade nas instâncias internacionais? Isso acabou. Se me diz: a chave é a confiança, a Venezuela pode recuperar e começar a sentir a mudança dentro de um ano. Como é que isto se consegue? Trabalhando com o setor privado. E como? Utilizando o petróleo, não o roubando, não oferecendo, mas para diversificar a nossa economia. Num ano seremos capazes de libertar recursos para importar alimentos, para relançar outros setores da economia, para recuperar a nossa economia”.

Alberto de Filippis, euronews:
“Há alguma coisa que se possa guardar do chavismo?”

Henrique Capriles, líder oposição Venezuela:
“O chavismo era Chavez, esta é a minha opinião. Não quer dizer que os defensores deste projeto não continuem a ter força política. Sim, vão tê-la. Mas hoje como se pode defender o que erradamente foi chamado de revolução? Chavez conseguiu colocar a luta contra a pobreza na linha da frente. Agora a grande questão é: 17 anos depois qual é a situação da pobreza na Venezuela? Quer que lhe diga? Há mais pobres do que antes”.

Alberto de Filippis, euronews:
“A Venezuela é considerada como um dos países mais perigosos do mundo. O que se pode fazer? Outro grande problema neste país é a impunidade dos criminosos”.

Henrique Capriles, líder oposição Venezuela:
“Na lista das 10 cidades mais violentas do mundo, três são na Venezuela e a primeira é Caracas. É uma situação dramática que os venezuelanos também estão a viver. Mas a crise económica e social, apesar da situação de violência que existe no país, 27 mil homicídios no ano passado, se pergunta a um venezuelano qual é o seu problema principal , a primeira resposta será a economia. Ou seja, apesar da situação de violência que vivemos, o principal problema que tem o venezuelano é económico. Para responder à sua pergunta: como se resolve a impunidade? Com um sistema de administração de justiça que funcione. O que se passa na Venezuela? A justiça não serve.

Como se muda a situção…é necessário fazer várias coisas: mudar o sistema de administração da justiça, da Procuradoria que tem o monopólio da acusação, o reforço da polícia, o reforço da educação. Existem três milhões, cerca de três milhões de jovens fora do sistema escolar. É um país onde não há oportunidades para os jovens. Ou seja, é necessário resolver estes temas, é necessário ter vontade política e fazer um esforço com todo o Estado, mas também vontade da própria população. Agora sou dos que pensa que a este tipo de governo não interessa que haja segurança. Porque este tipo de governo mantém-se pela anarquia da sociedade. Porque no final o cidadão é débil, não reclama, vive na própria casa como se fosse na própria prisão e o salvador, sempre forte, é o governo, que é quem tem a força. Este tipo de governo também se mantém com este clima de violência e insegurança. Porque no final debilita o cidadão. Se o povo for débil e não exigir o respeito pela constituição, então existirá o governo arbitrário e autoritário. É contra isso que lutamos hoje na Venezuela”.

Alberto de Filippis, euronews:
“Em nome da ideologia, a Venezueal fechou os olhos à presença de grupos insurgentes como as FARC no seu território. Qual é a sua posição sobre o assunto?”

Henrique Capriles, líder oposição Venezuela:
“Isso continua a acontecer, os grupos paramilitares, é assim que devemos classificá-los, estão em Caracas e noutras zonas. Chamaram-lhes “coletivos”, mas há “coletivos” que não têm nada a ver com esta conduta, por isso eu chamo-lhes de grupos paramilitares. São grupos armados que atuam competamente à margem da lei, não são forças de segurança, não têm uniforme, paramilitares, protegidos pelo Estado. Isto também faz parte da situação de violência que vivemos”.

Alberto de Filippis, euronews:
“O chavismo foi muito generoso com grande parte da população. Para muitos, estas regalias detruiram o espírito dos venezuelanos. Muitas pessoas já não estão acustumadas a trabalhar. Porque existe, por exemplo, um sistema de proteção laboral muito forte. Que vai fazer para convencer os venezuelanos que estes tempos já acabaram?”

Henrique Capriles, líder oposição Venezuela:
“Destruíram o sistema de saúde, destruíram a missão educativa, o programa que dizia que existia uma casa ou apartamento para todos é falso. Não construiram mais de um milhão de casas, isso é uma grande mentira. Por isso não quiseram aprovar uma lei que iria revelar o número de habitações construidas nos últimos anos na Venezuela. Como se recupera o país? Com trabalho, com esforço. Acredito que a maioria dos venezuelanos está consciente disto. Durante vários anos as pessoas habituaram-se a um sistema que destruiu o valor do trabalho. É fácil recuperá-lo.

O venezuelano é uma pessoa trabalhadora, não somos preguiçosos. Por isso é que lhe digo que não guarde a imagem que o governo quer passar. Não veja a Venezuela, e peço isso às pessoas de todo o mundo, que não se veja a Venezuela em função do governo porque os venezuelanos não são todos como o governo”.

Alberto de Filippis, euronews:
“Que mensagem deixa às pessoas de esquerda na Europa e no resto do mundo que apoiam este governo?”

Henrique Capriles, líder oposição Venezuela:
“Convido-os a vir à Venezuela. Eu recebo-os. Quero esclarecer uma coisa: eu não sou de direita nem acredito que a Venezuela tenha tido um problema nem de esquerda nem de direita. Esta desculpa não é uma desculpa. Esconde-se atrás disso. A Venezuela nunca foi governada pela direita. Nunca. A Venezuela não tem um coração de direita, se quisermos fazer um debate ideológico. Não me pergunte a mim, pergunte ao povo se é de esquerda ou conservador e verá a resposta. O problema venezuelano não é ideológico. Este governo que se diz de esquerda, quando olhamos para como atua parece para lá de extrema direita.

Escutemos a linguagem que usam, é do mais retrogrado conservador, todos os ataques que fazem. Este é um governo que se diz de esquerda? É falso. Há outras coisas que gostaria de explicar. Convido todas as pessoas de esquerda que apoiam este governo a vir cá, eu recebo-as. Não para que o governo as leve para uma bolha, eu levo-as para ver a verdade. Levo-as aos bairros, não as levo para o palácio Miraflores, para onde o governo as leva. Tudo é fantasia, uma bolha muito típica destes governos, que vivem fora da realidade, desligados e querem convencer o mundo disso. Venham cá, não tenham medo. Eu convido. Não defendam o governo de longe, a partir de qualquer cidade ou gabinete cómodo com ar condicionado. Falam de reivindicações, mas quais reivindicações? Venham à Venezuela. Venham que estamos à vossa espera! Além disso, é preciso esclarecer: não há uma conspiração internacional dirigida pelo império contra os governos de esquerda da América Latina. Isso é falso.

O que vejo é este governo a esconder-se atrás desse debate porque todos são acusados de corrupção. Os corruptos são maus, sejam de esquerda ou de direita. A corrupção não é má à esquerda ou à direita. A corrupção é um cancro venha de onde vier.
Não a podemos aceitar ou tolerar. Na Venezuela hoje enfrenta uma crise de alimentos, medicamentos, somos a economia menos competitiva do mundo e o país com maior corrupção do mundo. Estamos nos últimos lugares na transparência. Temos corrupção, não transparência.”

Alberto de Filippis, euronews:
“Acredita no futuro?”

Henrique Capriles, líder oposição Venezuela:
“Sou um otimista!”

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