Ucrânia: um cessar-fogo inexistente

Ucrânia: um cessar-fogo inexistente
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Sergio Cantone, jornalista da euronews, esteve na Ucrânia a acompanhar o exército na linha da frente, onde confrontos intermitentes com combatentes pró-russos ameaçam um cessar fogo demasiado frágil

A cimeira da NATO, dias 8 e 9 de julho, em Varsóvia, vai debruçar-se sobre o posicionamento a adoptar face a Moscovo. Com foco na Ucrânia, a euronews faz um ponto de situação na linha da frente, onde um conflito opõe o exército ucraniano aos rebeldes pro-russos que controlam Donetsk e a região de Donbas. O acordo de Minsk estabeleceu um acordo, mas os confrontos não pararam e as vítimas crescem. Desde há dois anos, já morreram mais 9000 pessoas.

Sergio Cantone, repórter da euronews, esteve com o exército ucraniano e com voluntários do regimento de Azov na luta de ambos contra os separatistas.

De cima do telhado de um edifício inabitado e semi destruído, um contingente de paraquedistas ucranianos observa a linha da frente de Donetsk, controlada por pro-russos.
Estamos em Avdiivka, uma cidade industrial no meio da zona neutra. Os disparos entre as forças de Kiev e os separatistas pro-russos têm sido ininterruptos nos últimos dois anos apesar de um cessar-fogo estabelecido pelo acordo de Minsk.

Adviivka é um ponto de distribuição de vias pelo território.
O comandante, de nome de guerra Sergey, conta à euronews a importância estratégica da cidade :“A estrada alternativa de Donetsk e Yasinovataya vai para Gorlovka. Naturalmente, é uma via de comunicação importante. Do outro lado, o inimigo diz que a queremos ocupar. Apesar de, na verdade, apenas termos avançado para assegurar a segurança dos cidadãos.”

De visita a um edifício próximo, ainda habitado por pessoas, encontramos Alexey. Desafiou os perigos da guerra ao começar a renovar o seu apartamento, apesar do facto de poder ser atingido ou mesmo destruído a qualquer momento. O que diz ecoa na falta de normalidade de uma guerra que não pára, mas que faz parar o tempo verdadeiramente útil: “Agora queremos mudar o papel de parede e o linóleo. Antes da guerra, não tinhamos tempo para isto. Quando Poroshenko chegou ao poder, disse que a guerra ia acabar num mês. Deu a sua palavra. Chegou a presidente já vai para três anos e a guerra ainda não acabou.”

De novo com os paraquedistas, a euronews é guiada para o posto de vigia principal. Daqui os soldados podem controlar os movimentos das forças pro-russas e limitar a movimentação ao longo da estrada principal. Ambos os lados trocam tiros constantemente, muitas vezes morteiros e, às vezes, artilharia pesada.

Mas a área que tentamos alcançar está a ser bombardeada agora. O nosso grupo é forçado a parar a meio caminho de um posto avançado ucraniano. Staryi, um combatente ucraniano, conta: “Agora na região de Donetsk os terroristas disparam depois das sete da tarde. Usam armas pequenas e atiram morteiros para todas as posições das forças armadas ucranianas.”

O posto avançado, uma antiga oficina mecânica de tractores, é bombardeada ocasionalmente pela artilharia pró-Moscovo.
Recebemos palavra de que o bombardeamento parou e retomamos viagem até um sítio chamado “Cratera”, perto da estrada entre Horlovka e Donetsk. Os buracos nas paredes são inúmeros e demasiado vísiveis, que nomearam o local. Ouvem-se explosões e sons de tiros, o perigo está próximo.

Antes da guerra Adviivka era a casa de 35 milhares de pessoas. Pelo menos metade foi embora desde então, especialmente os mais novos. Muitos aqui não percebem a razão para esta guerra. Para obter depoimentos, a euronews foi até ao mercado, onde não há uma aparente falta de comida. Valentina, uma residente, explica: “Morreram civis, os pobres soldados estão a ser mortos. é assim que devemos juntar-nos à Europa? Sobre sangue? Nós queremos estar na Ucrânia, numa Ucrânia pacífica, como antes. Não precisamos da Rússia. Mas deixem os políticos vir cá e verem como vivemos.”

A maior parte dos residentes de Adviivka trabalha na Metinvest Coke, uma fábrica de importância primária na produção metalúrgica ucraniana.
Há dois anos a produção foi suspensa pela guerra e o preço do minério subiu 20%. A fábrica também é um alvo de guerra.

No ano passado, Viktor Kruglenko viu o filho, de 25 anos, morrer debaixo dos seus olhos. Foi atingido por um morteiro. Pai e filho trabalhavam aqui lado a lado. Viktor conta como tudo aconteceu. Ele apanhou apenas um fragmento, na cabeça. Um amigo do filho, Sasha, ficou gravemente ferido. O filho morreu imediatamente. Mostra ainda o local atingido pelos estilhaços.

A empresa colocou uma placa comemorativa onde Sergey morreu. Outros trabalhadores dizem-nos que a fábrica ainda é ocasionalmente atingida por artilharia leve.

Mais para sul, perto do mar Azov, na rectaguarda da linha da frente de Mariupol, encontramos voluntários do regimento Azov.
Iaromir é um russo de Stavropol que, como outros dos seus compatriotas, pegou em armas pelo lado da Ucrânia contra a insurgência pro-moscovita. Estes nacionais da Rússia dizem que a guerra não tem que ver com etnias, mas sim com defender os valores democráticos contra aquilo que denunciam como uma Rússia autocrática.: “O mundo russo, apresentado pela administração de Putin, não tem nada que ver com os russos, penso eu. Não estamos a lutar contra os russos, mas contra coisas que eles fizeram no território da Rússia moderna”, diz Iaromir.

Pelo menos 20 cidadãos russos estão a combater nas fileiras do regimento Azov.
O regimento Azov é composto por voluntários, incluindo combatentes estrangeiros, e é controlado pelo ministro do interior da Ucrânia.
O irmão de armas de Iaromir, Dennis, é um croata que lutou contra os sérvios nos balcãs há mais de 20 anos. Não tem dúvidas sobre o que se está a passar: “Isto é o início da Guerra fria. Putin quer ficar numa posição vantajosa nessa guerra. Eu penso que toda a Europa e todo o mundo livre precisa de apoiar este lado, o meu lado, quer dizer, a Ucrânia”.

O regimento Azov é bastante controverso na Ucrânia e no estrangeiro. Os seus detractores dizem que é um paraíso mercenário com algumas orientações de cariz nazi, enquanto outros argumentam que os combatentes Azov estão apenas a tomar posição contra o expansionismo do presidente russo Vladimir Putin.
É com risos que Iaromiv responde a algumas acusações do ocidente de que o regimento Azov é feito de mercenários: “Não tenho motivo para esconder o que seja. Ontem recebi o meu salário de fevereiro. E o meu salário de Fevereiro foi exactamente de 6 mil hryvnias, ou seja, 220 euros. Se por isso sou um mercenário, está bem. Antigamente, na Croácia, gastava 2000 euros numa noite, em poucas horas, em comida ou num bar.”

“Antigamente” é uma palavra atingida mortalmente aqui, na Ucrânia. Quanto ao futuro, a geopolítica joga cartas no terreno e fora dele.

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