Gergely Karácsony: "Representamos o poder das pessoas"

Gergely Karácsony: "Representamos o poder das pessoas"
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Candidato da oposição unida, o cientista político liberal foi recentemente eleito presidente da Câmara de Budapeste. Em entrevista à Euronews, Karácsony manifestou-se depois de o Fidesz perder o controlo de dez das maiores cidades do país

Quase uma década depois, na sequência de várias maiorias de dois terços obtidas pelo partido de Viktor Orbán (Fidesz), as eleições autárquicas de outubro, na Hungria, representaram um ponto de viragem, com o triunfo de uma formação anti-Fidesz.

Em entrevista exclusiva ao programa da Euronews "The Global Conversation", Gergely Karácsony, o novo presidente da Câmara de Budapeste, falou sobre os desafios de hoje e de sempre.

Attila Magyar, Euronews - O que é que aconteceu na Hungria nas últimas semanas? A que é que se deve este triunfo?

Gergely Karácsony, presidente da Câmara de Budapeste - Há muito tempo que sabemos que os cidadãos que não concordam com as políticas do Governo estão em maioria no país. Nos últimos anos, o Fidesz conseguiu vencer as eleições ao aproveitar-se da oposição dividida. Estas foram as primeiras eleições, ao final de cerca de 15 anos, em que houve uma verdadeira batalha política. A oposição venceu a contenda em Budapeste e em várias cidades importantes.

Attila Magyar, Euronews - Por detrás deste resultado está uma coligação mais colorida do que a "Oliveira" de Romano Prodi, em Itália. Considera-se um político do partido Verde, mas é apoiado pelo sucessor do antigo partido Comunista MSZP, pelo partido político do húngaro que mais divide, o antigo primeiro-ministro Ferenc Gyurcsány (DK), e mesmo o partido de extrema-direita Jobbik não apresentou um candidato para medir forças consigo. O Jobbik é o partido que se posiciona como oposição a Gyurcsány.

Gergely Karácsony, presidente da Câmara de Budapeste - O candidato comum da oposição para a autarquia da capital foi encontrado não pelos partidos mas pela população de Budapeste. Um processo de pré-eleição com duas voltas traduziu-se num candidato comum da oposição, que foi diretamente eleito pela população de Budapeste. Uma vez que foi decidido pelo voto popular, durante a campanha sublinhei que não era candidato da oposição. Disse que era o candidato das pessoas de Budapeste que concorria contra as pessoas no poder. Na última década, a política resumiu-se ao Fidesz que, tendo maioria de dois terços, eliminou todas as alternativas de contrabalanço de poder, desde o Tribunal Constitucional à imprensa livre, estreitando a esfera de ação dos municípios. Nos últimos nove anos, a cidade de Budapeste foi uma grande perdedora com estas mudanças. O foco da minha campanha foi representar a vontade das pessoas que vivem em Budapeste contra o Governo. O nosso principal compromisso político é representar o poder das pessoas em vez das pessoas do poder.

Attila Magyar, Euronews - O resultado em Budapeste pode ser comparado com o das eleições locais em Istambul. Encontrou o autarca de Istambul antes do escrutínio. Ouviu alguns conselhos?

Gergely Karácsony, presidente da Câmara de Budapeste - Sim. A principal mensagem que me passou foi a de que a política se deve basear nas pessoas, em vez de se apoiar na lógica dos partidos e na rivalidade de poder. Durante a campanha e também depois de ser eleito presidente de Câmara, ele sublinhou que a força que representa diante do grande poder é invencível porque não é a força dele mas antes a da cidade. Quis representar esta política durante a minha campanha eleitoral e penso que consegui. Este bom resultado, que para muitos foi surpreendente, não se deveu à minha excelente campanha ou à minha personalidade, como não se deveu também aos partidos da oposição. A vitória deve-se a política que tenta envolver mais as pessoas nas tomadas de decisão. Penso que, atualmente, a democracia representativa tem de enfrentar desafios verdadeiramente sérios em todo o mundo. Algumas pessoas referem que se a democracia representativa está em perigo se deveriam escolher líderes com pulso firme que dizem o que é preciso dizer em vez de se limitarem a proteger as pessoas do perigo. Isso pode ver-se na política do Governo húngaro e em muitos outros lugares onde a política começou a afastar-se dos valores europeus fundamentais. Podemos vê-lo no fenómeno do "Brexit" e também na política americana. Penso que é uma má resposta. A resposta certa é fortalecer a democracia representativa. Completá-la com as instituições da democracia participativa e envolver cada vez mais as pessoas nas nossas decisões.

Attila Magyar, Euronews - Então, nesse quadro, como é que poderá trabalhar com um primeiro-ministro? Que tipo de oportunidades existem na capital de um Estado iliberal?

Gergely Karácsony, presidente da Câmara de Budapeste - Posso negociar com o Governo de forma mais eficiente do que qualquer outro porque quando negoceio estou a representar as pessoas de Budapeste. Sento-me a uma mesa conhecendo a opinião da população de Budapeste. Esta força é muito mais considerável do que alguns políticos possam pensar.

Attila Magyar, Euronews - É o primeiro alto-representante na Hungria de um Partido Verde. Qual a agenda verde que pretende implementar?

Gergely Karácsony, presidente da Câmara de Budapeste - Budapeste é ou pode ser uma grande perdedora em matéria climática. É por isso que precisamos de começar um processo para que a cidade possa participar de uma batalha para combater as alterações climáticas. Gostaríamos de alcançar a neutralidade carbónica até 2030.

Attila Magyar, Euronews - As medidas verdes também têm um grande impacto económico. Como é que espera conseguir avançar sem a existência de um partido Verde, sem um político verde na retaguarda?

Gergely Karácsony, presidente da Câmara de Budapeste - Não acredito que os partidos da oposição não estejam igualmente determinados em implementar estas políticas. Também é bastante importante perceber que esta conversão verde, esta viragem verde na vida da cidade não significa necessariamente problemas económicos. Claro que os investimentos têm de ser financiados, mas não devemos esquecer que a ideia de um "New Deal verde" é a de tornar sustentável todo o sistema económico e social europeu. Isto permite criar muitos empregos e abre a porta da oportunidade para o crescimento económico, especialmente numa era em que temos de nos preparar para a recessão económica na Europa. Fico muito satisfeito por ver que a nova Comissão Europeia quer representar a política da adaptação climática. Também fico muito satisfeito por poder haver uma possibilidade de as grandes cidades europeias terem recursos diretos de Bruxelas para tomar medidas que são importantes em matéria climática.

Attila Magyar, Euronews - Prometeu parar investimentos colossais em Budapeste como, por exemplo, a construção de estádios. Como é que espera consegui-lo contra um primeiro-ministro que ainda tem muito apoio e contra uma força política robusta como o Fidesz por trás?

Gergely Karácsony, presidente da Câmara de Budapeste - Não sou contra o investimento. Apenas quero restabelecer as prioridades pedindo ao Governo para desenvolver também os cuidados de saúde. Quando as prioridades estiverem completas poderemos então falar de outras coisas. Não quero agir contra estes investimentos, mas gostaria de chamar a atenção para o facto de que não são os mais importantes. As prioridades não são as melhores neste momento. O desenvolvimento dos cuidados de saúde, transportes públicos e áreas verdes deve estar em primeiro lugar. Os investimentos desportivos podem vir depois.

Attila Magyar, Euronews - É o político com maior sucesso na oposição. Vai candidatar-se a primeiro-ministro, desafiando Viktor Orbán em 2022?

Gergely Karácsony, presidente da Câmara de Budapeste - Na minha posição, a minha tarefa é ter uma relação de parceria normal com o Governo. No entanto, não quero negar de todo as minhas raízes na política húngara. Cruzo os dedos para que a oposição encontre um excelente candidato. Penso que neste momento tenho outro trabalho para fazer.

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