Ucrânia recolhe provas dos crimes de guerra e Kremlin tenta desmentir responsabilidades

Serviços ucranianos junto a parte de um dos mísseis que atingiu a estação de Kramatorsk
Serviços ucranianos junto a parte de um dos mísseis que atingiu a estação de Kramatorsk Direitos de autor AP Photo/Andriy Andriyenko
Direitos de autor AP Photo/Andriy Andriyenko
De  Francisco Marques
Partilhe esta notíciaComentários
Partilhe esta notíciaClose Button
Copiar/colar o link embed do vídeo:Copy to clipboardCopied

Equipas forenses que receberam orientação em Portugal recolhem vestígios em Bucha no dia de um novo ataque contra civis ucranianos em Kramatorsk. Movimento inter-religioso vai visitar a Ucrânia

PUBLICIDADE

A invasão russa da Ucrânia teve esta sexta-feira mais um trágico episódio em Kramatorsk, cidade na região de Donetsk controlada pelo exército ucraniano.

Dois mísseis atingiram a estação ferroviária, de onde nos últimos dias milhares de pessoas têm tentado fugir perante uma iminente ofensiva do Kremlin naquela zona.

Pelo menos 50 pessoas morreram, incluindo cinco crianças, e centenas ficaram feridas. O ataque aconteceu horas antes de a Presidente da Comissão Europeia e do chefe da diplomacia dos "27" visitarem Bucha, a cidade a noroeste de Kiev onde foi revelada no início da semana o resultado da ocupação russa.

Equipas forenses da Ucrânia, que tiveram orientação portuguesa na técnica de proteção de vestígios, estão a recolher provas dos alegados crimes de guerra russos e esta sexta-feira estiveram em Bucha, onde foram descobertas valas comuns e cadáveres de civis ucranianos com sinais de tortura e fuzilamento à queima-roupa.

A invasão russa iniciada na madrugada de 24 de fevereiro pareceu ter por objetivo a tomada da capital da Ucrânia, mas durante vários dias no centro de Kiev apenas se ouviam explosões nas proximidades da cidade.

Com a retirada russa da região na última semana, começou a ser revelado o que significavam aquelas explosões em torno de Kiev e a extensão da tragédia já anunciada pelo Presidente Volodymyr Zelenskyy, que tem informação privilegiada sobre as ações no terreno da invasão ordenada por Putin.

Na já habitual declaração à nação emitida no final de cada dia, o Presidente ucraniano pediu uma "resposta firme e global a este crime de guerra" cometido contra civis na estação de comboios depois de já "todos os principais países do mundo" terem condenado este "ataque da Rússia em Kramatorsk".

Tal como nos massacres em Bucha e em muitos outros crimes de guerra, o ataque com mísseis em Kramatrorsk tem de ser uma das acusações no tribunal, destinado a acontecer.
Volodymyr Zelenskyy
Presidente da Ucrânia

Um enorme fragmento de um dos mísseis que atingiu a estação de Karamatorsk tinha inscrito em cirílico russo a mensagem "Pelas crianças".

Kremlin acusa Ucrânia

Do lado do Kremlin, o chefe do Centro de Controle de Defesa da Federação Russa acusou a Ucrânia de ser a responsável pelo ataque em Kramatorsk e ainda de estar a instalar "posições de tiro e armas pesadas" em "edifícios de escolas e de jardins de infância" daquela cidade, na região de Donetsk.

"Além disso, as autoridades ucranianas realizaram um ato implacável de extermínio do seu próprio povo na estação ferroviária de Kramatorsk, com um míssil Tochka-U, contendo uma ogiva de fragmentação", afirmou ainda o coronel-general Mikhail Mizintsev, denunciando o suposto "cinismo dessa atrocidade" pelas forças ucranianas que, "sob o pretexto da evacuação", teriam reunido as vítimas "com antecedência na zona da estação".

O Ministério russo da Defesa, citado pela TASS, considerou "uma provocação e completamente alheia da realidade" a acusação "do regime nacionalista ucraniana" de que tinha sido a Rússia a realizar o "ataque com míssil" contra a estação ferroviária de Kramatorsk.

O porta-voz do exército russo deu força a essa acusação, sublinhando o uso do referido sistema de mísseis Toshka-U, de fabrico soviético.

Igor Konashenko tentou garantir que este sistema de mísseis apenas está a ser utilizado pelas forças ucranianas, mas imagens entretanto divulgadas das colunas militares russas na invasão da Ucrânia mostram veículos equipados com este mesmo sistema de mísseis Toshka-U.

Entretanto, as forças afetas ao Kremlin continuam sem dar mostras da alegada "boa vontade" manifestada esta semana pelo porta-voz Dmitry Peskov para justificar a retirada dos arredores de Kiev e mantêm sob a pressão dos bombardeamentos diversas cidades da Ucrânia.

Há registo do lançamento de mísseis cruzeiro a partir de navios russos estacionados no Mar Negro contra alvos em Mykolaiv, perto de Odessa, em Zaporizhia, no centro do país, em Chuhuiv, a sudeste de Kiev, e em Karkhiv, no nordeste do país, onde o pânico se voltou a instalar entre os residentes devido às várias explosões durante a noite.

União religiosa pela Paz na Ucrânia

Depois da deslocação desta sexta-feira de Ursula von der Leyen e Josep Borrell a Kiev e Bucha, ficou a saber-se estar a ser preparada mais uma visita especial à Ucrânia. Desta feita, de uma delegação de altos responsáveis de diversas religiões a vários campos de deslocados em Chernivtsi, no ocidente da Ucrânia.

A visita está a ser preparada pelo Departamento da Paz e pelo Instituto Inter-religioso Elijah para ocorrer esta terça-feira, dia 12, e surge na sequência do apelo à paz do Papa Francisco após o que o próprio líder da igreja católica apelidou de "o massacre de Bucha".

A viagem de cariz inter-religioso vai incluir membros das igrejas anglicana, judaica, islâmica, ortodoxa, hindu, budista e católica.

Invasão russa da Ucrânia

A Ucrânia foi invadida pelas forças militares afetas ao Kremlin na madrugada de 24 de fevereiro. Foi a concretização de uma estratégia iniciada três dias antes (21 de abril) com o decreto assinado por Vladimir Putin reconhecendo unilateralmente a independência dos territórios separatistas ucranianos nas regiões de Donetsk e Luhansk.

A ofensiva avançou por três frentes de batalha perante a incredulidade do resto do mundo, a assistir em direto pela televisão à invasão de um país soberano por uma das maiores potências nucleares do planeta. Kiev pareceu ser o alvo principal, mas os ataques aconteceram a partir dos territórios separatistas, a leste, e pelo sul, a partir da Crimeia, a península autónoma ucraniana anexada unilateralmente em 2014 pela Rússia.

As forças russas revelaram muita dificuldade perante a forte resistência ucraniana, que teve as forças armadas apoiadas pelas chamadas unidades de defesa territorial, compostas por civis armados, e pela Legião Internacional, um grupo formado por combatentes estrangeiros que se alistaram para ajudar a Ucrânia contra a invasão ordenada por Putin.

A ofensiva do Kremlin tem-se feito sobretudo com recursos a mísseis, canhões, raides aéreos e tanques, mas também com algumas operações terrestres, incluindo por mercenários chechenos.

A destruição de cidades tem chocado o mundo, em especial o arraso de Mariupol, na costa do Mar de Azov, entre a Crimeia e Donetsk.

Com o aparente recuo recente das forças terrestres russas em torno de Kiev, foram reveladas imagens chocantes de Bucha e Borodyanka, onde centenas de civis terão sido torturados e fuzilados à queima-roupa há semanas pelas forças afetas ao Kremlin.

A invasão russa cumpre, este sábado (8 de abril) o dia 45.

Outras fontes • AFP, AP, Tass, Kyiv Post

Partilhe esta notíciaComentários

Notícias relacionadas

Chernihiv tenta retomar a vida e começa pelos funerais das vítimas da invasão russa

Ataque em Kramatorsk faz mais de 50 mortos

Ataques russos na Ucrânia fazem pelo menos oito mortos