Fundos europeus para hospitais e escolas palestinianas "para breve"

Livros escolares palestinianos foram apontados por conter figuras de estilo antissemitas e linguagem inflamatória
Livros escolares palestinianos foram apontados por conter figuras de estilo antissemitas e linguagem inflamatória Direitos de autor Majdi Mohammed/Copyright 2018 The Associated Press. All rights reserved.
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De  Jorge Liboreiro
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Bruxelas confirmou que as verbas deverão ser desbloqueadas. Foram "congeladas" por causa de problemas relacionados com os conteúdos dos livros escolares

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Depois de meses de desacordos interinstitucionais, a Comissão Europeia deverá aprovar, em breve, um aguardado pacote de ajuda bilateral destinada aos territórios palestinianos.

O passo coincide com uma visita da presidente do executivo comunitário, Ursula von der Leyen, a Israel e à Cisjordânia, integrada na viagem ao Médio Oriente.

Uma disputa de longa data que envolve a Comissão, o Parlamento Europeu e os Estados-membros bloqueou a libertação do programa de assistência financeira de 2021 destinado à Autoridade Palestiniana.

O envelope, avaliado em mais de 200 milhões de euros, serve para pagar os salários e pensões de alguns funcionários públicos da Cisjordânia, apoiar hospitais e prestar ajuda a famílias vulneráveis.

"O nosso objetivo é finalizar o procedimento em breve e, uma vez finalizado, os fundos serão libertados o mais rápido possível, com hospitais de Jerusalém Leste e subsídios para famílias palestinianas vulneráveis como prioridades", disse um porta-voz da Comissão Europeia na segunda-feira em resposta a uma pergunta da Euronews.

"A União Europeia (UE) continua a ser o maior doador [de fundos] para a Palestina. Desde 2014, mobilizámos mais de 2 mil milhões de euros", acrescentou.

Quais as razões do atraso?

O impasse orçamental centra-se num regime de condicionalidade introduzido pelo húngaro Olivér Várhelyi, o comissário Europeu com a pasta das relações com os países vizinhos da UE.

Para desbloquear os fundos europeus, Várhelyi sugeriu que as autoridades palestinianas deveriam fazer mudanças nos livros escolares com figuras de estilo antissemitas e linguagem inflamatória.

A UE não dá fundos para projetar e imprimir livros didáticos, mas apoia os salários de muitos professores palestinianos que usam esses materiais nas salas de aula.

As objeções do comissário baseiam-se num estudo independente realizado pelo Instituto alemão Georg Eckert que "revelou um quadro complexo": os livros seguem os padrões da UNESCO e têm um "forte foco" nos direitos humanos, mas também apresentam "narrativas antagónicas" e "representações com uma única perspetiva" sobre Israel e os seus cidadãos.

"Os livros didáticos em língua árabe contêm representações emocionalmente carregadas de violência israelita que tendem a desumanizar Israel, ocasionalmente acusando o país de malícia e comportamento enganoso", sublinha o relatório, publicado no verão passado.

Várhelyi, que antes de ocupar o cargo atual como comissário trabalhou como diplomata para o governo do primeiro-ministro húngaro Viktor Orbán, introduziu novas condições para o financiamento após as conclusões do relatório serem divulgadas.

De acordo com o mesmo, a Comissão intensificou o envolvimento com a Autoridade Palestina para abordar o que qualificou como "questões altamente problemáticas" destacadas pelo Instituto Georg Eckert.

"A UE não tolera incitação ao ódio, à violência como meio para atingir objetivos políticos, nem ao antissemitismo em todas as suas formas. Qualquer material desse tipo não tem lugar nos livros escolares ou nas salas de aula", disse o comissário no mês passado em resposta por escrito ao Parlamento Europeu.

A oposição dos colegisladores

Apesar da insistência de Várhelyi, o regime de condicionalidade não teve o apoio necessário dos Estados-membros, com pelo menos 15 a manifestar o desagrado com o atraso numa carta endereçada ao próprio Comissário e obtida pelo POLITICO Europe.

Os representantes nacionais são consultados sobre o programa de ajuda da Comissão Europeia e podem bloqueá-lo através de uma maioria qualificada (55% dos países da União Europeia que representam pelo menos 65% da população europeia).

"Está claro que a atual proposta da Comissão, que procura introduzir a condicionalidade no setor educativo, não tem um amplo apoio", refere a carta.

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"Quando submetida a votação, dezoito Estados-Membros votaram contra ou abstiveram-se. Todos esses Estados-Membros e outros pediram, desde então, à Comissão Europeia para reenviar a proposta original com urgência."

Três grupos do Parlamento Europeu – os Socialistas e Democratas (S&D), os Verdes e a Esquerda – também manifestaram a oposição numa carta dirigida à presidente da Comissão Europeia, Ursula von der Leyen.

"Embora condenemos nos termos mais fortes possíveis todos os atos de antissemitismo, racismo ou incitação à violência ou ódio em todas as suas manifestações, também acreditamos firmemente que qualquer iniciativa e decisão - baseada em alegações injustas - seria contraproducente e criaria tensões desnecessárias entre", sublinhou o trio.

Acrescentaram que o estudo concluiu que os livros escolares aderiram aos padrões da UNESCO e reconheceram mudanças positivas em 2020/2021.

"Esta dinâmica deve ser encorajada, em vez de dificultada, a fim de garantir o progresso em direção ao objetivo de eliminar o discurso de ódio e incitação à violência de ambos os lados do conflito israelo-palestiniano", referiram os três grupos políticos.

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No lado oposto do debate, um grupo multipartidário de 22 eurodeputados pediu, no ano passado, que os fundos fossem retidos até que as autoridades palestinianas substituíssem os "livros terríveis" que entendem promover promovem uma incitação generalizada à violência.

"É impossível imaginar um futuro em que israelitas e palestinianos vivam em paz e segurança lado a lado enquanto as crianças palestinianas continuarem a ser ensinadas a odiar", insistiram os eurodeputados.

Apesar do desacordo ser sobre a questão específica dos livros escolares, impediu a liberação de todo o pacote de ajuda financeira, incluindo os fundos para a saúde.

O Conselho Norueguês dos Refugiados criticou fortemente o atraso, dizendo que a suspensão está a  "incapacitar" serviços críticos com "consequências terríveis" para doentes que precisam de tratamento.

Antes da visita de Ursula von der Leyen ao terreno, as autoridades palestinianas manifestaram esperança de que os fundos sejam aprovados sem condições. Um porta-voz da Comissão recusou comentar se a líder do executivo comunitário fará algum tipo de anúncio durante a sua viagem.

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A Euronews contactou o Ministério dos Negócios Estrangeiros de Israel para obter um comentário, mas sem sucesso.

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