O microcrédito europeu está a tornar-se enorme

O microcrédito europeu está a tornar-se enorme
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Esta edição é dedicada às microfinanças na Europa num contexto ainda muito dominado pelos sistemas tradicionais de financiamento. Estará o paradigma

Esta edição é dedicada às microfinanças na Europa num contexto ainda muito dominado pelos sistemas tradicionais de financiamento. Estará o paradigma na Europa a mudar? Como é que as tecnologias têm acompanhado a evolução do microcrédito?

Os conceitos do microcrédito e microfinanças estiveram inicialmente associados à implementação de alternativas nos países subdesenvolvidos. No entanto, trata-se de uma valência cada vez mais comum nos serviços financeiros europeus. Concebemos uma pequena estória para explicar como este sistema funciona.

O percurso de Vítor

Em tempos, Vítor tinha rendimentos e bens que lhe permitiam aceder aos serviços financeiros tradicionais. Mas tudo mudou quando perdeu o emprego. Sem garantias para apresentar no momento de pedir um empréstimo, Vítor virou-se para os organismos de microfinanças, que disponibilizam serviços como o microcrédito até um determinado limite a pessoas com problemas de liquidez.

Foi assim que Vítor conseguiu obter dinheiro para continuar a pagar a renda, para voltar a estudar e para eventuais imprevistos.

Mas as possibilidades não ficaram por aqui: ele teve também acesso a outros serviços como uma conta-poupança, seguros e o envio de remessas. Ou seja, Vítor voltou a dispor de um leque de ofertas que não encontrava na banca tradicional.

A expansão do microcrédito na Roménia

Em 2013, os serviços de microfinanças europeus providenciaram 1,5 mil milhões de euros. O valor médio dos empréstimos foi de 8500 euros. 79% dos créditos foi aplicado no setor empresarial, o resto para fins pessoais. Nos países da Europa de Leste, como a Roménia, esta alternativa foi-se consolidando face às dificuldades na obtenção de um crédito bancário até se tornar num sistema essencial.

A arte de Rudolf Florea é o violoncelo. Este artesão especializou-se na elaboração destes instrumentos, o que exige naturalmente algum investimento nas ferramentas e na madeira utilizadas. Para lançar a sua atividade, Rudolf recorreu ao microcrédito. Obteve dois empréstimos num total de 13700 euros.

“Os outros bancos pediam-nos uma tonelada de papéis. Eu tinha acabado de abrir o ateliê, ainda não tinha efetuado vendas suficientes para comprovar a minha capacidade de reembolsar o empréstimo. Mesmo assim, encontrámos um organismo de microfinanças que nos deu uma oportunidade”, conta-nos.

Wood for cellos is expensive, but Rudolph was able to buy some thanks to his #microcredit#Romania#RealEconomypic.twitter.com/FL3R8nnhxj

— Guillaume Desjardins (@GuilDesjardins) 25 mars 2016

Em 2013, foram atribuídos microcréditos a cerca de 9 mil empresários romenos, num valor médio de 7 mil euros. Os montantes dos microcréditos na Europa Ocidental costumam ser mais elevados. Mas aqui há mais pessoas a beneficiarem deste sistema. E, no mundo da economia real, isso pode fazer toda a diferença.

Ioan Vlasa, da Fundação FAER, afirma que o impacto “é enorme para as pessoas que beneficiam do sistema, porque isso permite-lhes sobreviver. Esse é o primeiro aspeto: as pessoas têm a oportunidade de ganhar a vida de uma forma correta, podem evoluir tendo à partida muito pouco, podem desenvolver-se profissional e economicamente. E, um dia, podem gerar rentabilidade.”

Mas o conceito de microfinanças não se resume ao crédito. Reza o ditado que em vez de dar o peixe, o melhor é ensinar a pescar. É mais ou menos o princípio de alguns organismos financeiros que proporcionam formações e acompanhamento dos projetos.

Dumitru é produtor de laticínios. Recebeu cinco empréstimos para modernizar a sua quinta. “Fiz formações. Algumas foram mesmo organizadas aqui na aldeia. A instituição financeira a que recorri juntou vários agricultores para receberem formação sobre os mesmos assuntos. Foi uma grande ajuda”, diz-nos.

O fenómeno do crowdlending

Os obstáculos no acesso ao crédito fazem com que cada vez mais particulares e empresas procurem soluções como o financiamento participativo. É um fenómeno que está a mudar a forma como perspetivamos a angariação de verbas e que abre novos caminhos às microfinanças. Basta abrir o computador e fazer uma pesquisa rápida para encontrar uma série de novos modelos de financiamento, como o crowdlending.

Nic tentou pedir um crédito para aumentar a sua peixaria em Londres. Mas o seu banco recusou. Foi então que decidiu embarcar no Funding Circle, uma plataforma virtual de investimento em Pequenas e Médias Empresas. “Eles apresentaram-me uma solução e, no espaço de uma semana ou duas, tinha o dinheiro na minha conta. Os juros são ligeiramente mais altos do que no banco. Mas nem sequer vale a pena estar a falar no banco, porque não nos quis ajudar”, declara.

O sistema estabelece um ponto de encontro onde os potenciais investidores podem identificar empresas que pretendam expandir-se. Segundo Robert Wardrop, do Cambridge Centre for Alternative Finance, “os canais alternativos dão a oportunidade às empresas de encontrar capital. A operabilidade destas novas formas de financiamento é menos dispendiosa do que nos bancos, onde as infraestruturas são as tradicionais.”

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Não deixa de haver riscos. A Funding Circle é regulada pelas entidades britânicas e os clientes têm de responder a determinados critérios para pedir verbas que podem ir de 5 mil libras a um milhão. David De Koning, diretor de comunicações, salienta que “as empresas têm de ter, pelo menos, dois anos. Há uma equipa que estuda o processo de crédito e atribui uma nota de risco ao investimento de A a E. Depois afixamos as taxas de juro e colocamos a proposta no mercado. Qualquer investidor – seja um particular, uma instituição ou até o governo britânico – pode decidir emprestar o dinheiro diretamente à empresa.”

A indústria financeira alternativa do Reino Unido é, neste momento, a maior da Europa.

A visão de Pier Luigi Gilibert, diretor executivo do Fundo Europeu de Investimento (EIF)

Maithreyi Seetharaman, euronews: Foram criados dois instrumentos para canalizar montantes para desenvolver as microfinanças: o Instrumento Europeu de Microfinanciamento Progress e o Programa para o Emprego e Inovação Social (EaSI). Ambos geridos pelo Fundo Europeu de Investimento, cujo diretor executivo é Pier Luigi Gilibert. Qual é a situação atual das microfinanças na Europa?

Pier Luigi Gilibert: A crise de 2007/2008 mudou a natureza do mercado. Há muita gente que não conseguia encontrar trabalho nos setores tradicionais e que acabou por criar o seu próprio emprego. Estamos a falar de pessoas que tinham poucas hipóteses de aceder aos canais tradicionais dos financiamentos bancários. A necessidade de uma alternativa surgiu também por uma questão de inclusão social e económica para ajudar desempregados, mulheres empreendedoras ou, hoje em dia, os migrantes, por exemplo. Trata-se, portanto, de uma ferramenta destinada a várias frentes. Nós estimamos que sejam necessários de 5 a 6 mil milhões de euros para responder às necessidades das microfinanças nos 28 Estados-membros.

#tech & #Microfinance future chat w/ European Investment Fund CEO Pier Luigi Gilibert EIB</a> <a href="https://twitter.com/hashtag/realeconomy?src=hash">#realeconomy</a> <a href="https://twitter.com/euronews">euronewspic.twitter.com/EbtMYMwbN5

— Maithreyi (@maithreyi_s) 29 mars 2016

euronews: É necessária legislação e subsídios para incentivar os Estados-membros a desenvolverem as microfinanças?

PLG: O Fundo Europeu de Investimento e o Banco Europeu de Investimento marcam presença nas áreas onde o setor privado não tem alcance. O que fazemos normalmente é providenciar o capital inicial para desenvolver um determinado setor e depois deixar que o setor privado assuma as rédeas. O processo para atribuir pequenos empréstimos abaixo dos 25 mil euros é dispendioso. Há custos fixos, independentemente da dimensão do empréstimo. Faz sentido para um banco processar um pedido de crédito de um milhão de euros, cujos custos ascendem a 1%. Mas os microcréditos tornam-se muito onerosos. Daí que os bancos tenham reticiências em fazê-los. Por isso é que o apoio do setor público é tão relevante na Europa Ocidental ou na Europa de Leste.

euronews: Qual será o impacto do financiamento participativo no futuro das microfinanças?

PLG: É verdade que existem vários sinais que indicam que estas plataformas de crowdlending – de empréstimos participativos – se vão tornar cada vez mais importantes. São ferramentas que permitem reduzir os custos dos processos, que são um dos grandes obstáculos à autossustentabilidade desta indústria.

euronews: Há o risco de falharmos a integração social se estes serviços só forem virtuais?

PLG: Tem toda a razão! É difícil criar uma indústria de microfinanças autossustentável se não houver o lado do acompanhamento e formação. E isso não é contemplado nestas novas plataformas tecnológicas.

euronews: A experiência neste setor já permite evitar situações de crédito malparado ou outros riscos que os bancos não querem assumir?

PLG: Pessoalmente, não vejo que os incumprimentos sejam um problema agudo nas microfinanças. O grande problema prende-se com os custos dos processos, das diligências a efetuar e da monitorização. Qualquer inovação que surja para reduzir os custos nesta área será bem-vinda.

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