A invasão em grande escala da Ucrânia pela Rússia teve lugar há mais de um ano e meio. Durante todo este tempo, os países ocidentais têm prestado ajuda financeira e militar a Kiev, prometendo apoiar os ucranianos durante o tempo que for necessário. Haverá fadiga de guerra no Ocidente, como diz o Kremlin?
De acordo com uma sondagem realizada em outubro pelo Instituto Internacional de Sociologia de Kiev, a percentagem de ucranianos que acredita que o Ocidente está cansado da guerra e quer que Kiev negoceie com Moscovo duplicou no último ano.
Na nova sondagem, os sociólogos ucranianos descobriram o que a população do país pensa sobre uma das principais narrativas de propaganda do Kremlin: "o Ocidente está cansado da guerra."
A percentagem de ucranianos que acredita que o apoio dos aliados está a diminuir e que gostaria que Kiev iniciasse negociações com Moscovo aumentou de 15% para 30%, em comparação com setembro e dezembro do ano passado.
A tese do "cansaço ocidental" foi reiterada pelo porta-voz da presidência russa, Dmitry Peskov, no início de outubro:
"Dissemosrepetidamente que, de acordo com as nossas previsões, o cansaço deste conflito, o cansaço do patrocínio completamente absurdo ao regime de Kiev irá aumentar em vários países, incluindo os Estados Unidos ."
A maioria da população ucraniana (mais de 60%) continua convencida de que o apoio ocidental é forte e, segundo os especialistas, é pouco provável que enfraqueça nos próximos meses.
"O Presidente Biden tem mais sete meses para continuar a apoiar a Ucrânia, e já o afirmou. Os Estados Unidos estão a fornecer à Ucrânia um sistema importante de armas. Não haverá qualquer alteração", afirmou Judy Dempsey, do Centro Carnegie Europe e editora-chefe do blogue Strategic Europe.
De acordo com Dempsey, o apoio de Bruxelas a Kiev tem-se mantido inabalável desde fevereiro de 2022, o início da invasão russa em grande escala. A UE está pronta para continuar a prestar assistência financeira, política e militar a Kiev:
"O sentimento de que a guerra já dura há algum tempo está, certamente, presente entre os Estados-Membros. Mas não me parece que este cansaço esteja, suficientemente, enraizado e generalizado para que os europeus digam: 'Basta, vamos negociar'!"
A derrota da Ucrânia na guerra contra a Rússia pode afetar, seriamente, a estrutura de segurança na Europa no futuro mas não só, diz Maximilian Hess, investigador do American Foreign Policy Research Institute e autor do livro "Guerra Económica - A Ucrânia e o Conflito Global entre a Rússia e o Ocidente".
"É importante compreender o que está em jogo neste conflito: não é apenas o sistema de segurança europeu e a probabilidade de uma nova agressão russa, mas também os sistemas económicos e políticos que os ucranianos estão a lutar para reformar. Estão a lutar pelo direito de se unirem aos seus vizinhos europeus.
Este é um conflito em que vale a pena apoiar a Ucrânia, porque a alternativa, em que Putin vence e destrói este país, levará não só à destruição do paradigma de segurança europeu, mas também do paradigma político e económico da Europa no seu todo", está convicto Hess.
De acordo com o especialista, nos próximos meses, os ucranianos não devem preocupar-se com o facto de a assistência da Europa e dos Estados Unidos ser, significativamente, reduzida ou desaparecer por completo.
"A UE distribuiu o apoio de forma bastante sensata. Será prestado durante muito tempo, dada a forma como está estruturado. Nos Estados Unidos, a ajuda à Ucrânia vai continuar a ser objeto de lutas políticas internas. Mas, pelo menos até às eleições presidenciais, até novembro de 2024, a ajuda continuará a ser forte ", acredita Hess.
"Não há possibilidade de acabar com a guerra tão cedo"
A guerra dura há mais de um ano e meio. Nem Kiev nem Moscovo estão agora dispostos a sentar-se à mesa das negociações, insistindo nas suas próprias condições.
O Kremlin afirma que "a operação especial vai continuar até que os seus objectivos sejam alcançados".
A liderança ucraniana não considera o diálogo possível "enquanto as tropas de ocupação estiverem no território do país".
"Nem sequer estamos a pensar em compromissos territoriais. Para a Ucrânia, não há qualquer diferença entre a região de Donetsk e a região de Lviv, a região de Chernihiv e a Crimeia, Kiev e Sevastopol", recordou Ruslan Stefanchuk, presidente do Verkhovna Rada, falando na conferência internacional "Crimeia Global - Compreender a Ucrânia através do Sul".
"Nesta altura, não vejo a possibilidade de acabar com esta guerra", afirmava Judy Dempsey, "Os ucranianos não estão dispostos a negociar qualquer acordo de paz que não tenha em conta a preservação da integridade territorial do país e ouvimos relatos do Kremlin de que também não querem diálogo. A questão que se coloca é a seguinte: se nenhuma das partes está disposta a negociar, se a guerra se arrasta e cada vez mais pessoas morrem, deveria haver um mediador que conseguisse, realmente, aproximar os dois lados. Mas, neste momento, não há mediador".
A paz só pode ser alcançada quando as pessoas no poder na Rússia não puderem continuar a guerra, é a convicção de Maximilian Hess.
"Na minha opinião, não há qualquer possibilidade de acabar com a guerra num futuro próximo, porque Vladimir Putin não mostra qualquer interesse em fazê-lo. Foi o Kremlin, em 2014, que iniciou este conflito que se transformou numa guerra, em grande escala, em 2022. A paz só é possível quando o Kremlin já não for capaz ou não estiver disposto a lutar".