O impacto das eleições nos EUA no diferendo comercial com a Europa

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Direitos de autor Evan Vucci/Copyright 2020 The Associated Press. All rights reserved
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De  Valérie Gauriat
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A política “América primeiro” foi um rude golpe para as exportações europeias.

Descrita por Donald Trump como o primeiro inimigo comercial dos Estados Unidos, a União Europeia pagou caro a doutrina “América Primeiro”. A euronews visitou uma empresa de vinhos francesa afetada pelas mudanças da política comercial dos Estados Unidos.

Situada entre a região da Borgonha e as vinhas do Beaujolais, a Maison Loron exporta um quarto da produção para o mercado norte-americano. Mas o negócio abrandou desde que os exportadores de vinhos franceses, alemães e espanhóis foram confrontados, há um ano, com um novo imposto de 25% sobre as exportações para os Estados Unidos. Para fazer face à concorrência a empresa francesa teve de tomar medidas drásticas.

"Tomámos uma decisão difícil financeiramente: baixámos os preços para compensar o imposto dos Estados Unidos. O que representa várias centenas de milhares de euros. É um valor importante para nós, é o nosso lucro anual. Vendemos o nosso vinho por tuta e meia nos Estados Unidos. Esperamos que a solução se resolva, mas não temos a certeza. É óbvio que a mudança de presidente pode ser um bom indicador. Mas aconteça o que acontecer, a situação não se vai resolver a curto prazo”, disse à euronews Philippe Bardet, presidente da Maison Loron.

O impacto do "imposto Trump"

Há vários produtos europeus afetados pelo chamado imposto "Trump". Os exportadores são as vítimas colaterais de uma longa batalha entre o gigante aeronáutico europeu Airbus e o concorrente americano Boeing.

Ao considerar que os subsídios europeus à Airbus eram ilegais, a Organização Mundial do Comércio deu luz verde a Donald Trump para aplicar tarifas no valor de 7,5 mil milhões de dólares.

A resposta não se fez esperar. Em outubro, a a OMC autorizou a União Europeia a impor tarifas sobre produtos americanos no valor de quatro mil milhões devido aos subsídios ilegais atribuídos à Boeing.

Numa entrevista televisiva, há dois anos, Donald Trump resumiu a sua visão das relações comerciais entre os Estados Unidos e a União Europeia. “Eu acho que temos muitos inimigos. Acho que a União Europeia é um inimigo. O que eles nos fizeram a nível comercial. Eles aproveitaram-se de nós”, disse Donald Trump, numa entrevista à estação de televisão CBS.

Uma declaração proferida depois de a União Europeia ter instaurado novos impostos às exportações americanas de aço e alumínio e a uma série de produtos americanos icónicos.

A decisão da União Europeia foi tomada depois de os Estados Unidos terem decidido impor tarifas às exportações europeias de aço e alumínio.

União Europeia promete retaliações

Se as negociações não permitirem encontrar uma solução, a União Europeia prometeu retaliações.

“As nossas relações comerciais e de investimento continuam a ser as mais importante a nível mundial. Devemos continuar empenhados no desenvolvimento das nossas relações transatlânticas, porque, quando a Europa e os EUA trabalham juntos, podemos ser também uma força do bem, no mundo. Mas quisemos deixar claro que, se os Estados Unidos agirem unilateralmente, a Europa responderá de maneira proporcional. Não queremos agravar a situação, mas devemos defende-nos. ", disse à euronews Valdis Dombrovskis, vice-presidente executivo da Comissão Europeia.

Apesar das medidas tomadas por Donald Trump, o superávite comercial de bens da União Europeia em relação aos Estados Unidos tem crescido de forma contínua desde janeiro de 2017. Por seu turno, o défice comercial de bens dos EUA com a União Europeia, atingiu um pico no final do ano passado.

A instauração de um imposto de 25% sobre as importações de automóveis europeus não é de excluir, depois de os líderes europeus ter anunciado a intenção de tributar os serviços digitais dos gigantes tecnológicos norte-americanos. Um projeto suspenso até o final do ano, o prazo definido para a conclusão de um acordo.

Braço-de-ferro fiscal

A questão da política fiscal é apenas um dos conflitos que veio para ficar, seja qual for o resultado das eleições.

“Acho que o tom geral das relações melhoraria radicalmente com um governo Biden. Mas há outras questões que vão ser muito, muito difíceis. A questão da tributação das empresas digitais, por exemplo. Os Democratas são ainda mais afeiçoados que os Republicanos aos gigantes de Silicon Valey, como a Google e a Facebook", disse Edward Alden, especialista em política comercial americana.

O conflito em torno da Boeing e da Airbus não vai desaparecer. A mensagem da campanha de Joe Biden é “compre produtos americanos”, é a mensagem mais agressiva que já vimos da parte de um presidente. Penso que os Estados Unidos vão virar-se mais para dentro".

O candidato democrata deixou claro que as preocupações nacionais serão prioritárias em relação aos novos acordos comerciais. Mas os analistas esperam uma redução dos conflitos em torno das guerras tarifárias e da cooperação internacional.

“Estou convencido que Joe Biden tentará trabalhar com os europeus para salvar, tanto quanto possível, a Organização Mundial do Comércio. E existem relações bilaterais com a Europa. Biden tem uma visão favorável ao comércio livre. É possível que haja um progresso nessa área e certamente em relação às questões climáticas e do mecanismo de ajustamento das emissões de carbono nas fronteiras, que também é um tema de negociação comercial e aí encontraremos um acordo com Joe Biden", sublinhou Guntram Wolff, diretor do Bruegel Economic Think Thank.

Resta saber se haverá mudanças em relação às sanções norte-americanas contra as empresas europeias que fazem negócios com o Irão, a China ou a Rússia. Joe Biden promete retomar as negociações com o Irão, desde que Teerão cumpra os acordos sobre o nuclear.

O candidato democrata partilha as preocupações de Donald Trump sobre as relações europeias com empresas de tecnologia chinesas, ou em relação ao projeto do gasoduto entre a Rússia e a Alemanha.

Incertezas estimulam união dos europeus

As incertezas na relação com a potência norte-americana têm levado a União Europeia a mostrar-se mais unida no capítulo do comércio internacional.

“Continuamos abertos aos negócios, ao comércio livre e justo. Mas, por outro lado, devemos afirmar-nos mais, na defesa dos nossos interesses e valores. Temos de fortalecer os nossos instrumentos de defesa comercial. E é exatamente o que estamos a fazer neste momento”, afirmou Valdis Dombrovskis, vice-presidente executivo da Comissão Europeia.

“A lição que devemos aprender é a necessidade de a União Europeia defender firmemente os seus próprios interesses comerciais. Ela fê-lo muito bem nos últimos quatro anos. Foi por isso que a administração Trump não obteve tanto sucesso com as queixas contra a Europa como esperava. Essa tendência deverá continuar nos próximos quatro anos, independentemente de quem for o próximo presidente dos Estados Unidos", concluiu Edward Alden, especialista em política comercial dos Estados Unidos.

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