Relatório da HRW critica UE por desvalorizar direitos humanos

Migrantes são resgatados por um barco da equipa de resgate dos Médicos Sem Fronteiras (MSF), depois de deixarem a Líbia para tentar chegar a solo europeu, no Mar Mediterrâneo, sexta-feira, 6 de outubro de 2023\.
Migrantes são resgatados por um barco da equipa de resgate dos Médicos Sem Fronteiras (MSF), depois de deixarem a Líbia para tentar chegar a solo europeu, no Mar Mediterrâneo, sexta-feira, 6 de outubro de 2023\. Direitos de autor Paolo Santalucia/Copyright 2023 The AP. All rights reserved
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De  Mared Gwyn Jones
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Artigo publicado originalmente em inglês

Há um "desfasamento preocupante" entre as promessas e as ações da União Europeia (UE) em matéria de direitos humanos, afirma a organização não-governamental Human Rights Watch (HRW), no relatório de 2024.

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As políticas de asilo e migração "repressivas", a discriminação contra as comunidades marginalizadas e o retrocesso democrático de alguns Estados-membros são algumas das deficiências da UE em matéria de direitos humanos em 2023, segundo o relatório.

O bloco é também criticado pela sua "duplicidade de critérios" em matéria de política externa, uma vez que apoia a ideia de julgamento de crimes de guerra cometidos na Ucrânia pela Rússia, mas tem-se esquivado a esforços semelhantes em relação aos cometidos em Gaza por Israel. Estas contradições prejudicam a "posição da UE como um ator global com princípios", afirma o relatório.

A publicação constitui um barómetro do respeito pelos direitos humanos em todo o mundo. Phillippe Dam, diretor de Advocacia para a UE, atribuiu a responsabilidade pessoal pelo fraco desempenho da UE em matéria de direitos humanos à presidente da Comissão, Ursula von der Leyen.

"A UE está cada vez mais a remeter os direitos humanos para um nível inferior de compromisso, ou está, de facto, a retirar-lhes a prioridade", disse Dam, à Euronews.

"Usrula von der Leyen tem responsabilidade. A sua contribuição para o acordo entre a UE e a Tunísia põe, realmente, de lado os direitos humanos, mas também houve outros compromissos internacionais, seja com os Emirados Árabes Unidos, com as Filipinas ou com o conflito em Israel e Gaza", enumerou o ativista.

"Esperamos que, nos meses que restam a esta Comissão, haja esforços para voltar a colocar os direitos humanos no centro das atenções", disse, ainda,

A Euronews contactou a Comissão Europeia para comentar o assunto, mas ainda não obteve resposta.

Depois de três meses de derramamento de sangue em Gaza, é realmente chocante para nós não ouvirmos a União Europeia apelar à responsabilização pela investigação do Tribunal Penal Internacional.
Phillippe Dam
Ativista, Human Rights Watch

Reputação da UE afetada por "dois pesos e duas medidas"

O respeito pelos direitos humanos é um dos valores fundadores da UE. Mas o relatório denuncia o atual executivo da UE por dar prioridade aos laços comerciais, económicos e políticos em detrimento dos direitos humanos, e por não exercer pressão diplomática suficiente sobre os Estados do Golfo Pérsico, a China e a Índia, para combater os abusos.

"O resto do mundo vê esta discrepância e isso faz com que a UE não seja vista como um ator internacional principal", explicou Dam, "mas também faz com que a UE seja menos eficaz e tenha menos impacto no mundo, porque os violadores dos direitos humanos vêem essa realidade e sentem que também podem chantagear a UE", expliocu Dam.

O relatório enumera outros casos de política externa do bloco, tais como as suas tentativas falhadas de mediar a disputa de longa data entre a Arménia e o Azerbaijão sobre a região de Nagorno-Karabah. A tomada militar da região por Baku, em setembro, levou à deslocação forçada da população de etnia arménia.

O Sudão, onde eclodiu uma guerra civil sangrenta, em abril passado, também foi negligenciado pela UE em 2023. 

A HRW, sediada em Nova Iorque (EUA), também criticou a inação da UE relativamente às hostilidades em Israel e Gaza, que expôs "preconceitos e divisões" entre os países europeus.

"A UE teve razão em condenar, veementemente, os ataques hediondos e as mortes de centenas de civis em Israel, perpetrados pelo Hamas e outros grupos armados em outubro", afirmou Dam.

"Mas depois de três meses de derramamento de sangue em Gaza, é realmente chocante para nós não ouvirmos a União Europeia apelar à responsabilização pela investigação do Tribunal Penal Internacional", acrescentou.

O processo judicial movido pela África do Sul começou, hoje, no Tribunal Internacional de Justiça, com sede em Haia, onde Israel contestará as alegações de genocídio. Até à data, os países da UE têm-se abstido de manifestar o seu apoio ao processo.

Política de migração sob fogo

A Human Rights Watch afirma que as políticas de migração da UE contribuíram para "mortes, torturas e abusos" em 2023, uma vez que o número de mortos entre os que tentaram chegar ao território da UE por mar atingiu mais de 2500.

O controverso acordo do bloco com a Tunísia para reduzir o número de migrantes que embarcam na perigosa rota para a Europa através do Mediterrâneo é criticado como uma "abordagem fracassada".

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 O acordo foi assinado, em julho passado, com o presidente da Tunísia, apesar das provas do tratamento abusivo das autoridades tunisinas para com os migrantes subsaarianos, incluindo expulsões ilegais, ódio racial e violações dos direitos humanos.

Dam disse à Euronews que receia que a retórica divisiva dos principais partidos políticos sobre a migração possa alimentar a polarização antes das próximas eleições europeias.

"Os principais partidos políticos não têm a coragem de dizer aos seus eleitores que há formas de ter políticas de migração que respeitem os direitos humanos dos migrantes (...) para recuperar o controlo e as fronteiras e, ao mesmo tempo, proteger os direitos de asilo e garantir a responsabilização quando os direitos dos migrantes são atacados", explicou.

A migração vai ser uma questão determinante na campanha eleitoral que antecede a ida dos europeus às urnas em junho.

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