120 eurodeputados exigem que a Hungria perca direito de voto na UE

Na carta conjunta, os eurodeputados acusam o primeiro-ministro Viktor Orbán de perturbar as decisões colectivas da UE.
Na carta conjunta, os eurodeputados acusam o primeiro-ministro Viktor Orbán de perturbar as decisões colectivas da UE. Direitos de autor Denes Erdos/Copyright 2023 The AP. All rights reserved
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De  Jorge Liboreiro
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Artigo publicado originalmente em inglês

Uma coligação interpartidária de 120 membros do Parlamento Europeu exige que a Hungria seja destituída dos seus direitos de voto devido ao retrocesso democrático do país e ao uso "inaceitável" do poder de veto por parte do primeiro-ministro, Viktor Orbán.

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"Acreditamos que esta ação é necessária para proteger os valores da União Europeia", afirmam os legisladores numa carta enviada, na sexta-feira, à presidente do Parlamento Europeu, Roberta Metsola.

O texto cita duas razões principais para defender a medida sem precedentes: o contínuo retrocesso democrático da Hungria, motivo de preocupação recorrente em Bruxelas, e o papel controverso de Orbán na cimeira da UE de dezembro.

O primeiro-ministro húngaro enfureceu os seus homólogos quando cumpriu a ameaça de vetar um fundo de 50 mil milhões de euros destinado a prestar assistência macrofinanceira à Ucrânia, entre 2024 e 2027.

A aprovação do fundo especial, conhecido como Mecanismo para a Ucrânia, tornou-se uma questão de extrema urgência, uma vez que Bruxelas já ficou sem dinheiro para enviar ao governo de Kiev e o governo dos EUA está num impasse legislativo sobre a sua ajuda.

Os líderes da UE deverão voltar a reunir-se, a 1 de fevereiro, para dar luz verde ao mecanismo ou apresentar um plano alternativo. Antes desta data decisiva, os responsáveis húngaros apresentaram vários pedidos em troca do levantamento do veto.

Mas enquanto o Conselho Europeu continua esperançado em encontrar uma solução, a paciência do Parlamento Europeu está a esgotar-se.

Avançar no processo com base na violação do Tratado da UE

Na sua carta conjunta, os legisladores instam as outras instituições da UE a avançar com o artigo 7º do Tratado da UE, a "opção nuclear" para abordar e corrigir as violações dos valores fundamentais do bloco.

A Hungria está sob um processo ao abirgo da primeiro capítulo do Artigo 7 do Tratado, desde 2018. Esta fase identifica um "risco claro de uma violação grave" dos princípios fundamentais e obriga o país acusado a explicar a situação em audições regulares. 

Graças à proteção concedida pelo anterior governo de extrema-direita na Polónia, que também foi colocado ao abrigo do artigo 7.º, o governo de Budapeste conseguiu permanecer nesta primeira fase sem enfrentar grandes repercussões.

Agora, o grupo de 120 eurodeputados - de um total de 705 - quer acionar a segunda fase do artigo 7º, em que os líderes da UE, agindo por unanimidade, podem determinar a "existência de uma violação grave e persistente" dos valores fundamentais.

Esta decisão requer uma proposta apresentada por um terço dos Estados-membros ou pela Comissão Europeia, bem como a aprovação do Parlamento Europeu.

Os deputados defendem que esta medida pode levar a Hungria à terceira fase do artigo 7.º, em que o Conselho pode votar a suspensão de "certos" direitos de que goza o país acusado, incluindo o direito de voto para aprovar legislação e chegar a acordo sobre posições comuns.

A votação no Conselho Europeu requer apenas uma maioria qualificada. No entanto, as etapas dois e três nunca foram activadas devido à natureza radical da suspensão.

Ao avançar para o nível seguinte, "a União Europeia estaria a enviar uma mensagem clara à Hungria de que as suas ações são inaceitáveis", afirmam os eurodeputados.

"Estaria também a enviar uma mensagem a todos os Estados-membros de que a União Europeia não vai tolerar qualquer retrocesso no Estado de direito ou perturbação do princípio da cooperação leal, tal como consagrado nos Tratados".

Esta "é a única forma de proteger o valor da União Europeia e de garantir o funcionamento dos processos de decisão", acrescentam.

Resolução não vinculativa

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A carta foi iniciada por Petri Sarvamaa, um eurodeputado finlandês que pertence ao Partido Popular Europeu (PPE), de centro-direita, a maior formação do hemiciclo. O prazo para a recolha de assinaturas terminou na sexta-feira, às 15h00 (hora da Europa Central), e 120 deputados juntaram os seus nomes.

A lista final de apoiantes inclui representantes dos quatro principais grupos: o PPE, os Socialistas e Democratas (S&D), os liberais do Renovar a Europa e os Verdes, bem como alguns membros da Esquerda.

"O sucesso da carta demonstra uma vontade clara do Parlamento de lançar o artigo 7.2, mas, acima de tudo, sublinha a urgência de abordar as ações de Viktor Orbán", afirmou Sarvamaa, num comunicado.

O Parlamento Europeu está a trabalhar numa resolução não vinculativa sobre a Hungria, que será votada durante a sessão plenária da próxima semana. 

Sarvamaa acredita que é "muito possível" que a ideia de desencadear os próximos passos do artigo 7º seja "incluída de alguma forma".

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"Este nível de apoio ao lançamento de um procedimento específico raramente, ou nunca, foi visto no Parlamento", disse o político finlandês.

No entanto, o apelo do hemiciclo é simbólico e expõe uma lacuna fundamental na missão partilhada: a ativação da segunda fase do artigo 7º não pode partir do próprio Parlamento, o que significa que os legisladores não podem fazer mais do que exercer pressão política sobre a Comissão e os Estados-membros.

Após a recente vitória de Donald Tusk, na Polónia, a Hungria viu-se privada do apoio do governo ultraconservador polaco, com que contou durante os últimos oito anos. 

Isto deixou Orbán mais isolado politicamente do que nunca, como ficou patente na cimeira de dezembro. Mas é pouco provável que líderes como a italiana Giorgia Meloni e o eslovaco Robert Fico apoiem uma medida tão radical como a suspensão do direito de voto, que transformaria a Hungria num Estado-membro impotente e de segunda classe.

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