Pela segunda vez na história, um Sumo Pontífice vai discursar no coração político da União Europeia.
O Papa Francisco visita, por algumas horas, a sede do Parlamento Europeu, na cidade francesa de Estrasburgo, esta terça-feira, para uma mensagem aos eurodeputados reunidos em sessão plenária.
A visita é classificada como claramente política porque o Papa não visita a Catedral de Estrasburgo, que celebra 100 anos em 2015; mas visitará o Conselho da Europa, dedicado aos Direitos Humanos.
João Paulo II foi o primeiro Papa a visitar o Parlamento Europeu, em 1988, e a União tinha apenas 12 Estados-membros, incluindo Portugal.
Mas ainda não tinha caído o muro de Berlim, e o Papa polaco deixou um apelo para que se olhasse mais para o Leste, o que acabaria por acontecer a partir de 2004.
Francisco é o primeiro Papa sul-americano da história, mas tem uma posição muito clara sobre os desafios do continente europeu.
A primeira viagem oficial que fez foi à ilha italiana de Lampedusa, para recordar os milhares de imigrantes que perdem a vida em nome do sonho europeu.
Para antecipar alguns dos temas mais importantes desta visita, a correspondente da euronews em Bruxelas, Margherita Sforza, entrevistou, em ligação via satélite com Roma, Franca Giansoldati, correspondente no Vaticano do jornal Il Messaggero, que já teve a oportunidade de entrevistar o Papa em exclusivo.
Margherita Sforza/euronews (MS/euronews): “Francisco é o primeiro Papa não-europeu. Como encara esta visita à sede do Parlamento, em Estrasburgo, depois das eleições e da renovação da liderança europeia?”
Franca Giansoldati/jornalista Il Messaggero (FG/Il Messaggero): “Em primeiro lugar, é um Papa não europeu que nunca falou sobre a União Europeia. Ele próprio já o admitiu várias vezes. Fez alguns comentários quando esteve na ilha italiana de Lampedusa ou quando foi visitado por alguns eurodeputados, mas nunca abordou a questão da chamada “casa comum”, que é o que pretende fazer agora”.
MS/euronews: “A primeira viagem do Papa foi a Lampedusa, em 2013. Que impacto teve sobre ele?”
FG/Il Messaggero: “A viagem ao Mediterrâneo, num barco da Guarda Costeira, permitiu-lhe aperceber-se de que esse mar se tornou um cemitério, o que o tocou profundamente…”
MS/euronews: “Nessa altura ele fez comentários muito fortes…”
FG/Il Messaggero: “Sim, palavras dirigidas ao coração das instituições. Não é admissível que morram tantas pessoas às portas das fronteiras europeias mas que, no coração das instituições europeias, se fique indiferente”.
MS/euronews: “Além da imigração, o Papa também se interessa pelo mundo do trabalho. Qual será a sua mensagem a este respeito?”
FG/Il Messaggero: “O segundo tema que ele vai abordar no discurso é a economia, o impacto social da economia. Não há esperança se não houver trabalho e se as políticas económicas não tiverem em atenção as necessidades das pessoas, das famílias. Mas acho que o Papa não vai abordar questões sobre bioética.”
MS/euronews: “Outra questão polémica na Europa é o casamento dos homossexuais. Qual é a posição deste Papa?”
FG/Il Messaggero: “É uma posição de não julgamento. Claro que o casamento homossexual não se enquadra na teoria da criação divina e o Papa é um defensor dos preceitos morais católicos. No entanto, Francisco convida os católicos a perceberem as mudanças na sociedade e que, face a pessoas que vivem de forma menos comum, não devemos julgar mas aceitar. A preocupação do Papa vai sobretudo para com os filhos dos casais homossexuais.”
MS/euronews: “Francisco é considerado como um Papa do povo, quase um esquerdista. De que forma está a reformar a Igreja Católica?”
FG/Il Messaggero: “A Igreja Católica apercebe-se de que se está a tornar minoritária na Europa, de que as igrejas estão vazias. É por isso que o Papa insiste em ir para as periferias, não apenas as periferias geográficas, mas também culturais, existenciais.”
MS/euronews: “Estamos diante de um Papa político, tal como foi João Paulo II?”
FG/Il Messaggero: “O que é interessa ao Papa é a política social. Mas não no sentido de fazer política. João Paulo II tinha um objetivo muito preciso, já que o mundo estava dividido pela “cortina de ferro” e a Igreja assumiu-se como um ator político. Ao contrário dele, Francisco prefere ficar nas margens da política e cuidar antes das pessoas.”