O regresso do lobo à Europa é um "perigo real" para o gado e para a vida humana, alertou a Comissão Europeia na segunda-feira, ao anunciar planos para rever o estatuto de proteção da espécie.
O executivo comunitário anunicou que vai entrar numa "nova fase" do processo de decisão sobre a eventual redução do estatuto de conservação do lobo, recolhendo dados relevantes das comunidades locais e dos cientistas, na sequência dos apelos crescentes dos agricultores europeus para os riscos de ataques.
"Precisamos de ter um conjunto atualizado de informações e dados sobre o estatuto do lobo para podermos tomar novas medidas", afirmou, segunda-feira, um porta-voz da Comissão Europeia.
Atualmente, esta espécie está estritamente protegida pela Diretiva Habitats, adoptada em 1992, que proíbe a captura ou o abate deliberado de lobos na natureza.
Mas as alcateias de lobos regressaram recentemente a regiões da UE onde estiveram ausentes durante décadas, atacando gado e alimentando tensões nas comunidades agrícolas e cinegéticas.
A presidente da Comissão Europeia, Ursula von der Leyen, foi pessoalmente afetada, no ano passado, quando o seu pónei de 30 anos, Dolly, foi morto por um lobo no nordeste da Alemanha.
"A concentração de matilhas de lobos nalgumas regiões europeias tornou-se um perigo real para o gado e, potencialmente, para os seres humanos", afirmou von der Leyen, numa declaração por escrito.
As derrogações à Diretiva Habitats permitem que os agricultores tomem medidas específicas para proteger as suas culturas e os seus meios de subsistência, como a utilização de armadilhas de "captura suave" para os lobos.
Von der Leyen instou as autoridades locais e nacionais a "tomarem medidas sempre que necessário", aplicando essas derrogações.
Agricultores contra ambientalistas
As comunidades agrícolas de toda a Europa apelaram à redução do estatuto de conservação dos lobos, em resposta à ameaça crescente que as alcateias representam.
Em novembro do ano passado, uma resolução do Parlamento Europeu apelou à Comissão para que apoiasse o setor agrícola, garantindo maior flexibilidade na proteção do gado contra ataques.
O Partido Popular Europeu, o maior grupo do Parlamento, tem liderado estes apelos, posicionando-se como defensor dos direitos dos agricultores nas principais reformas ambientais da UE.
A Áustria, a Bélgica, a Chéquia, a França, a Alemanha e a Itália estão entre os Estados-membros da UE que registaram um aumento dramático do número de unidades de gado mortas. Na Áustria, onde o número de animais mortos por matilhas de lobos terá aumentado 230% (680 casos), em 2021, várias regiões autorizaram, de forma controversa, o abate de lobos para contrariar o impacto negativo nos agricultores.
Os ambientalistas e as organizações não-governamentaisi (ONG) afirmam que estes abates violam a legislação da UE.
No início deste ano, 12 ministros do Ambiente da UE escreveram a Virginijus Sinkevičius, o comissário europeu para o Ambiente, instando o executivo a não "enfraquecer a proteção legal do lobo".
A carta, iniciada pela Eslováquia, foi assinada pelos ministros da Bulgária, Alemanha, Grécia, Espanha, Irlanda, Chipre, Luxemburgo, Áustria, Portugal, Roménia e Eslovénia.
"A lenta recuperação das populações de lobo na UE deve ser celebrada e não temida", afirmou Reineke Hameleers, diretora-executiva do Eurogrupo para os Animais, em resposta ao anúncio da Comissão Europeia.
"Este sucesso continua a ser frágil, uma vez que a maioria das populações transfronteiriças de lobo na UE ainda não atingiu um estado de conservação favorável. Após o investimento de todos estes esforços e fundos, a redução do estatuto de proteção dos lobos não só afectaria o seu bem-estar, como também poria em risco a sua sobrevivência e os condenaria antes mesmo de poderem ser salvos", acrescentou Hameleers.
De acordo com a União Internacional para a Conservação da Natureza (UICN), o lobo encontra-se entre as espécies "menos preocupantes", tendo a sua população na Europa "aumentado em número e alargado a sua área de distribuição" desde a década de 1970.