Bruxelas quer aumentar tarifas sobre os cereais russos e bielorrussos

A Comissão Europeia receia que a Rússia possa explorar a sua capacidade de produção para inundar o mercado da UE com cereais de baixo custo.
A Comissão Europeia receia que a Rússia possa explorar a sua capacidade de produção para inundar o mercado da UE com cereais de baixo custo. Direitos de autor Alexei Nikolsky/AP2011
Direitos de autor Alexei Nikolsky/AP2011
De  Jorge Liboreiro
Partilhe esta notíciaComentários
Partilhe esta notíciaClose Button
Copiar/colar o link embed do vídeo:Copy to clipboardCopied
Artigo publicado originalmente em inglês

A Comissão Europeia propôs, sexta-feira, um aumento acentuado das tarifas aduaneiras sobre os cereais russos e bielorrussos que entram no mercado comum do bloco. A medida é essencialmente preventiva, uma vez que, por enquanto, não foram detetadas perturbações importantes.

PUBLICIDADE

A medida aplicar-se-ia a cereais, oleaginosas e produtos derivados, tais como o óleo vegetal, originários da Rússia e destinados a serem vendidos em qualquer um dos 27 Estados-Membros. Os mesmos produtos provenientes da Bielorrússia, um dos aliados mais próximos do Kremlin, estariam igualmente sujeitos a este regime.

De acordo com a proposta, a UE aplicaria um direito aduaneiro de 95 euros por tonelada ao milho e ao trigo russos, um aumento abruto em comparação com os direitos nulos atualmente em vigor. Os outros produtos seriam sujeitos a um "direito ad valorem" de 50% para corresponder ao aumento previsto.

Os valores tão elevados devem desencorajar a compra de cereais russos, que no ano passado ascenderam a 4,2 milhões de toneladas no valor de 1,3 mil milhões de euros. Por seu lado, a Bielorrússia vendeu 610 mil toneladas no valor de 246 milhões de euros.

Há várias boas razões para apresentar esta proposta. Evitará que os cereais russos desestabilizem o mercado comunitário destes produtos. Impedirá a Rússia de utilizar as receitas da exportação destes produtos para a União Europeia.
Ursula von der Leyen
Presidente da Comissão Europeia

Embora esta quantidade represente uma pequena parte das importações da UE, a Comissão considera que a Rússia, um dos maiores produtores agrícolas do mundo, tem capacidade suficiente para despejar cereais de baixo custo na Europa e desencadear uma turbulência no mercado, se Putin assim o desejar.

Em rigor, não se trata de uma sanção, mas tem objetivos muito semelhantes: privar o governo de Moscovo de mais uma fonte de receitas e garantir que os cereais que as suas tropas roubaram dos territórios ucranianos ocupados não cheguem aos clientes europeus.

Na prática, as empresas europeias continuariam a poder comprar, vender e armazenar os cereais russos e bielorrussos, mesmo que isso deixasse de ser economicamente sustentável devido às tarifas elevadas. Os cereais que transitam pelo território do bloco para chegar a outros países, como os do Norte de África, ficariam isentos das medidas.

O aval dos líderes da UE

A proposta tem ainda de ser aprovada pelos Estados-membros por maioria qualificada. A Comissão tinha os planos prontos, mas só avançou com eles depois de uma reunião dos líderes da UE em Bruxelas, na quinta-feira.

"Há várias boas razões para apresentar esta proposta. Evitará que os cereais russos desestabilizem o mercado comunitário destes produtos. Impedirá a Rússia de utilizar as receitas da exportação destes produtos para a União Europeia. E garantirá que as exportações ilegais russas de cereais ucranianos roubados não entrem no mercado da UE", disse a presidente da Comissão Europeia, Ursula von der Leyen.

Durante a cimeira, a primeira-ministra da Letónia, Evika Siliņa, e o presidente da Lituânia, Gitanas Nausėda, apelaram a uma proibição total de compra dos cereais russos, o que teria exigido o recurso a sanções. O presidente ucraniano, Volodymyr Zelenskyy, também levantou a questão no seu discurso aos líderes da UE por videoconferência.

"Infelizmente, o acesso da Rússia ao mercado agrícola europeu continua a ser livre. Enquanto que os cereais ucranianos são atirados para as estradas ou vias férreas, os produtos russos continuam a ser transportados para a Europa, bem como os produtos da Bielorrússia, controlada por Putin. Isto não é justo",disse Zelenskyy.

Bloqueios no leste da UE

Desde o início da guerra, a questão da agricultura tornou-se um tema polémico e com repercussões políticas. As primeiras ondas de choque surgiram quando as tropas russas bloquearam os portos do Mar Negro e impediram a Ucrânia, um poderoso exportador de produtos agrícolas, de utilizar a sua rota comercial tradicional para os países de baixos rendimentos.

Esta situação levou a UE a criar as chamadas "rotas de solidariedade", isentando todos os produtos ucranianos de direitos aduaneiros e quotas e proporcionando vias alternativas por terra. 

Mas a iniciativa foi recebida com reações negativas pelos países vizinhos, nomeadamente a Polónia, a Hungria, a Eslováquia, a Bulgária e a Roménia, que se queixaram da abundância de cereais ucranianos de baixo custo e isentos de direitos, porque baixaram os preços para os agricultores locais.

A Polónia, a Hungria e a Eslováquia impuseram proibições unilaterais e descoordenadas a uma série de produtos alimentares ucranianos, que se mantêm até hoje.

Apesar das múltiplas tentativas de Bruxelas para resolver o longo litígio, o bloco não conseguiu encontrar uma solução duradoura. No início desta semana, foi obtido um acordo para prolongar o regime de comércio livre até 2025, com salvaguardas reforçadas para controlar os fluxos de aves de capoeira, ovos, açúcar, aveia, milho, cereais e mel.

Mas pouco depois de o acordo ter sido anunciado, os Estados-membros pediram mais tempo para analisar o texto, lançando dúvidas sobre o processo.

PUBLICIDADE

(Este artigo foi atualizado com mais informações sobre os direitos aduaneiros)

Partilhe esta notíciaComentários

Notícias relacionadas

Zelenskyy pede mais sistemas de defesa aérea após nova vaga de ataques russos

Ucrânia vai receber lucros de ativos russos congelados na UE

Comissão Europeia pondera autorizar restrições aos cereais ucranianos