Reintegração de ex-presos da ETA é um desafio para Espanha

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Os etarras têm-se escondido dos media, enquanto tentam readaptar-se a um mundo que sofreu alterações, durante as dezenas de anos que passaram na prisão.

Em Bilbau, antigos presos bascos criaram uma associação para ajudar os ex-reclusos a “aterrar” na sociedade. A Harrera Elkartea fornece apoio em questões burocráticas e de saúde. Presta ajuda financeira e tenta abrir-lhes as portas do mercado de trabalho.

Fernando Etxegarai, membro da Harrera Elkartea, explica: “Tentamos reciclar as pessoas, fornecendo-lhes a formação que não puderam ter enquanto estavam na prisão. Por outro lado, tentamos conseguir-lhes empregos adequados à formação que têm nesse momento e que são empregos que exigem poucas qualificações”.

Mas o maior desafio dos etarras parece ser a convivência com as vítimas. O pai de Rubén Múgica, um histórico do Partido Socialista Espanhol, foi assassinado pela ETA.

“Não lhes perdoo. Não tenho qualquer intenção de fazê-lo e não vou fazê-lo. Nunca!”, atira Múgica. E à pergunta, se não consegue perdoar pelo menos os etarras que mostraram arrependimento, responde, sem hesitações: “Não há nada que possa ser perdoado!”

Vítimas e terroristas parecem viver em dois mundos separados, no interior do País Basco. “Isto é pequeno, no País Basco somos dois milhões de habitantes, mas é suficientemente grande para cada um viver nos seus círculos, sem ter uma relação com os outros”, afirma Fernando Etxegarai.

“O que é impossível é a convivência entre pessoas normais e criminosos. Se os assassinos merecem toda a atenção por deixarem de matar, mais atenção merecem aqueles que nunca mataram”, realça Múgica.

Filipa Soares, enviada especial da euronews, conclui que “no País Basco até existe uma Secretaria para a Paz e Convivência, mas ainda há um longo caminho a percorrer para que etarras e vítimas do terrorismo deixem de viver apartados”.

A ETA também dividiu a família de José Ramón Goñi Tirapu, que lutou contra a ETA como governador civil de Gipuzkoa, entre 1987 e 1990. A organização terrorista tentou matá-lo três vezes. A história seria normal, no País Basco se, uns anos mais tarde, Jose Ramón não tivesse descoberto que o próprio filho era um etarra. No livro “Mi hijo era de ETA” conta a história.

euronews – Pode descrever o que sentiu quando descobriu que o seu filho pertencia à ETA, a organização que o tentou matar mais do que uma vez?

José Ramón Goñi Tirapu – Primeiro sente-se a necessidade de ajudar o filho, que está, provavelmente, numa situação dramática, difícil. Esse é o primeiro sentimento. Mas, instintiva e quase simultaneamente, sabe-se que essa organização mata, apesar de ele nunca o ter feito e tentou matar-me em várias ocasiões. Este facto emocionou-me muito. Nos primeiros momentos não se sabe como reagir, é como se estivesse fora deste mundo, sem compreender. Não se pode, é impossível compreender como é que um filho que criámos, com quem vivemos, por quem sentimos amor e continuamos a amar, pode chegar tão longe, a uma situação tão cruel em relação a um pai.

euronews – O seu filho fugiu à justiça. No livro diz que ele vive em França e que não o vê há 20 anos. Porque não pode vê-lo?

José Ramón Goñi Tirapu – Não é um mundo em que eu possa entrar. Ele vive noutro mundo, onde as portas estão fechadas, não há comunicação possível. Se eu o pudesse ver, esse mundo não lhe perdoaria. É uma máfia e eu sou, ou de algum modo representei como governador, o oposto: era inimigo da máfia e de tudo o que ela significava. Ele teria problemas. Acima de tudo, o afastamento é gigantesco. É um mundo de onde não se pode sair. Na verdade, não o dizem, não o mostram ostensivamente, mas a situação de receio entre eles é muito importante. Não esqueçamos que a ETA matou militantes importantes que considerou traidores.

euronews – Mas fala com ele?

José Ramón Goñi Tirapu – Não, não. Não falo com ele há muitos anos. Há quase 20 anos que não comunico com ele.

euronews – Acredita que o verá em breve?

José Ramón Goñi Tirapu – Acredito que sim. A situação vai ser muito difícil, mas estou convicto de que o verei.

euronews – Nesta entrevista pode ser a primeira vez que o seu filho o vê em 20 anos… Que gostava de lhe dizer?

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José Ramón Goñi Tirapu – Que terminou, que a ETA acabou. A organização afirmou-o. A ETA morreu. Não tem sentido. Se tem uma ideia política pode expô-la publicamente, de outro modo, sem coações à população. Claro que me custa falar diretamente com o meu filho.

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