Em Dalvik, no norte da Islândia, descarrega-se bacalhau, capturado três dias antes, bem acima do Círculo Polar Ártico.
“O tempo estava horrível lá em cima: tempestuoso! E o vento era de sudoeste, o pior para a pesca do bacalhau. Mas conseguimos capturar 40 toneladas de bacalhau”, conta o pescador I. Gudmundsson.
Neste porto, há homens do mar, mas também cientistas que efectuam uma experiência para um projecto da União Europeia. Querem avaliar, em tempo real, a frescura dos bacalhaus durante a viagem de 2 700 quilómetros que os vai levar até aos consumidores.
“Qualquer subida abusiva de temperatura vai reduzir o tempo que o peixe vai estar no mercado. O peixe fresco deve proporcionar um máximo de frescura e qualidade ao consumidor. E para o alcançar, há que controlar cada etapa da cadeia de transporte. Se há uma fase sobre a qual não se sabe nada e em que houve um abuso de temperatura, isso pode afectar a qualidade do peixe e, possivelmente, a segurança do produto”, explica Sigurdur Bogason, cientista da Universidade da Islândia.
Antes de serem transportados, os bacalhaus são cortados em filetes e refrigerados. Cerca de três toneladas por dia.
O investigador italiano Luca Zanella instala sensores de temperatura no interior e exterior das caixas, que estão ligados a redes móveis.
“Este biosensor envia informação acerca da temperatura dentro e fora da caixa de peixe e a hora em que foi medida. Pode medir a temperatura minuto a minuto, a cada dez minutos ou a cada hora. Depois, envia os dados para um sistema central através de uma rede móvel”, diz Luca Zanella.
O bacalhau é transportado em camiões e ferries, mais lentos, mas também mais baratos do que os aviões.
A temperatura do peixe não deve exceder os 4°C ou começa a deteriorar-se. Com antenas e GPS instalados, a medição da temperatura, em tempo real, pode começar.
“A temperatura é baixa dentro do camião. O peixe também está a uma temperatura baixa. Portanto, o sistema está a dizer-nos que até agora está tudo bem”, assegura o engenheiro Tomas Haflidason da Universidade da Islândia.
Entretanto, amostras dos bacalhaus foram enviadas para um laboratório em Reiquiavique. O bacalhau é cozinhado e, depois, provado por voluntários. Em conjunto com análises microbiológicas, estes testes de degustação ajudam a perceber como é que o peixe se deteriora com o passar do tempo.
A engenheira química Emilía Martinsdóttir diz que “logo após a morte do peixe, o número de micróbios começa a aumentar. Estes micróbios formam compostos deteriorados de nitrogénio e enxofre. A maioria das pessoas não gosta do sabor destes compostos químicos. É por isso que no fim, quando o peixe já não é fresco, se torna desagradável”.
Entretanto, o bacalhau já atravessou a Islândia e embarcou num ferry. Depois de uma paragem nas Ilhas Faroé, chegou à Dinamarca e foi carregado para outro camião. Nove dias depois de ter sido capturado, o bacalhau está, finalmente, em França.
“A viagem foi bastante longa. Viajámos da Islândia para as Ilhas Faroé e, depois, para a Dinamarca. Depois, ontem, viajámos entre a Dinamarca e a Bélgica e, agora, acabámos de chegar a Boulogne-sur-Mer”, afirma Tomas Haflidason.
A temperatura do peixe é de cerca de 1°C e permaneceu estável durante quase toda a viagem. “No Este da Islândia, durante cerca de meia hora, a temperatura do peixe subiu para 5°C. Mas na Islândia estava bastante fresco, portanto, esse pequeno aumento não afectou o bacalhau”, assegura o engenheiro.
Amostras de peixe vão ser enviadas para um laboratório próximo do porto francês, para mais estudos microbiológicos.
Este software também se revelou útil para avaliar a qualidade do bacalhau em condições difíceis, como humidade extrema.
“Há um claro interesse em obter resultados que possam ser explorados comercialmente com este equipamento. Isto vai desde a tecnologia de informação e comunicação, como providenciar software para a gestão da cadeia de fornecimento, para determinar a carga bacteriana, para prever a durabilidade do produto alimentar; até ao registo do histórico, usando os indicadores de temperatura”, revela o coordenador do Projecto Chill-On, Matthias Kück.
Por último, os cientistas levam o bacalhau para uma peixaria local, onde os clientes se mostram ávidos de peixe fresco…
“Gosto de todos: o linguado, a raia, o bacalhau. De facto, gosto de todos os peixes”, sublinha Evelyne Corteyn, enquanto o marido se mostra preocupado com as condições em que o peixe é transportado.
Philippe Legrand, dono do estabelecimento, garante que “se o peixe não é fresco, os clientes não vêm. Quando o peixe brilha e é de qualidade, as pessoas voltam”.
De volta à Islândia, os cientistas esperam que a monitorização das temperaturas em tempo real também possa ajudar a promover a pesca sustentável, ao contribuir para que seja desperdiçado menos peixe.
“Se perder qualidade, perde-se valor de mercado. E, eventualmente, se perder toda a qualidade, perde-se todo o valor de mercado. E o peixe é desperdiçado no mercado. Basicamente, pode ser o contentor do lixo, nas traseiras do supermercado, a comer este peixe e não o consumidor”, lembra Sigurdur Bogason.
“Não tenho a certeza que este projecto seja o final da história. A tecnologia está a evoluir. As soluções de tecnologia de informação e comunicação também. A era da informática é esta. Podemos conjugar diferentes coisas que fizemos há cinco anos. Daqui a 5 anos, podemos ter uma nova ideia, uma nova barreira para quebrar. É uma história interminável. Mas isto é a ciência: quebrar barreiras”, conclui Bogason.