França quer acabar com passagens aéreas muito baratas

Um Airbus A380 a voar ao longo da "Promenade des Anglais", na cidade francesa de Nice, durante um dia de testes no aeroporto, a 29 de março de 2022.
Um Airbus A380 a voar ao longo da "Promenade des Anglais", na cidade francesa de Nice, durante um dia de testes no aeroporto, a 29 de março de 2022. Direitos de autor VALERY HACHE / AFP
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De  Gael Camba
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Artigo publicado originalmente em inglês

O ministro francês dos Transportes afirma que vai propor à União Europeia (UE) uma política de preços mínimos para os voos.

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O ministro francês dos Transportes afirmou que vai propor à UE a introdução de um preço mínimo para os voos, a fim de reduzir as emissões de carbono.

Clément Beaune afirma que pretende "lutar contra o dumping social e ambiental" e que "os bilhetes de avião de 10 euros já não são possíveis", referindo-se às tarifas das companhias aéreas de baixo custo. Para o governante, o preço extremamente baixo de um bilhete "não reflete o preço para o planeta".

Mas serão os voos mais caros a solução para reduzir a pegada de carbono da aviação?

Passageiros frequentes são desproporcionalmente responsáveis pelas emissões

"Tudo o que faça com que as companhias aéreas paguem uma parte justa do custo ambiental que criam é positivo", afirma Jon Worth, especialista em viagens e fundador da campanha Trains for Europe.

"Mas devíamos estar a lidar com os passageiros frequentes e isto não os abrange. Pode reduzir os fins de semana agradáveis na cidade para algumas pessoas, mas não vai fazer parar ou reduzir a elite que voa regularmente".

Em França, 2% das pessoas fazem metade de todos os voos, de acordo com um estudo publicado pelo grupo de campanha climática Possible. 15% dos britânicos fazem 70% dos voos e 8% dos holandeses fazem 42%.

Globalmente, 37% dos europeus nunca viajaram para fora do seu país, de acordo com um inquérito europeu de 2014. Esta estatística não está diretamente relacionada com as viagens aéreas, mas dá uma ideia de quantos europeus viajam de avião.

Bilhetes de comboio europeus são duas vezes mais caros do que os voos

Em média, os bilhetes de comboio europeus são duas vezes mais caros do que os voos, de acordo com um relatório da Greenpeace de julho.

Apenas 12 linhas de comboio foram consideradas rápidas, fiáveis e mais baratas do que os voos, nas 112 rotas mais importantes analisadas pela Greenpeace.

Em maio deste ano, a França proibiu algumas rotas aéreas domésticas. Foram afetados os voos que podiam ser substituídos por viagens de comboio com uma duração inferior a 2,5 horas. No entanto, devido a algumas limitações, como o facto de os comboios não funcionarem suficientemente tarde à noite, a proibição só se aplica a três rotas aéreas: Paris Orly para Bordéus, Lyon e Nantes.

As organizações e os ativistas do clima criticaram o Governo francês, afirmando que a proibição não é suficiente para reduzir as emissões de carbono da aviação.

O facto de os comboios não darem uma resposta adequada leva os viajantes a optarem por voos.

"Se quisermos voar de Paris para Barcelona ou de Paris para Frankfurt, a capacidade dos comboios nessas rotas é demasiado reduzida", afirma Jon Worth.

"Este tipo de medidas são 'paus', mas faltam as cenouras, incentivos para que as pessoas mudem o seu comportamento", lamenta.

Worth salienta ainda que Beaune está errado quando diz que se pode apanhar um voo de 10 euros. As tarifas mínimas para um bilhete simples de ida, incluindo todas as taxas, rondam normalmente os 40 e os 50 euros.

Soluções: Criar uma taxa de passageiro frequente, eliminar os voos de ligação curtos

No Reino Unido, há anos que se discute a criação de uma "taxa de voo frequente". As taxas de imposto aumentariam em função do número de voos efetuados durante um ano: "A taxa do primeiro voo é muito baixa e aumenta com cada voo", explica Jon Worth.

Na Alemanha, têm sido estudadas formas de encurtar as rotas domésticas: "Se viajarmos de Estugarda para Singapura, mas o único voo direto sair de Frankfurt, a Alemanha colocará esse viajante num comboio que ligue Estugarda a Frankfurt", diz Worth.

O problema é que alguns países, como a França, ainda não dispõem de um sistema de ligação. Em França, só é possível ligar os comboios de alta velocidade TGV INOUI aos voos da Air France. "Na Alemanha, é possível apanhar um comboio da Deutsche Bahn para um voo da EasyJet", diz Worth.

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Será que os países da UE vão apoiar a proposta de Beaune?

"É uma medida tipicamente francesa, uma medida muito Macron. Em termos táticos, não é a melhor forma", diz Worth. "A Alemanha não vai estar muito interessada por causa do seu ministro dos Transportes liberal, a Espanha talvez esteja mais interessada, os Países Baixos também, mas além destes, é difícil dizer".

O diretor executivo da Ryanair tem sido muito hostil em relação a medidas semelhantes, comparando-as a um "controlo de tarifas semelhante ao da Coreia do Norte", quando a Áustria anunciou, em junho de 2020, que queria proibir que as tarifas aéreas fossem inferiores às taxas e encargos reais, ou seja, uma média de 40 euros por voo neste país.

“Acho que os controlos de preços [das passagens aéreas] são dignos da economia da Coreia do Norte”
Edward Wilson
CEO da Ryanair

Jon Worth receia que o ministro dos Transportes francês esteja a procurar publicidade em vez de uma verdadeira mudança.

"A publicidade internacional da proibição dos voos curtos em França foi enorme. Foi inútil! Mas deu a Macron uma boa publicidade internacional. Tenho medo que Beaune esteja a fazer o mesmo. Que a aplicação efetiva tenha o mesmo impacto".

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