O Parlamento Europeu prepara-se para processar a Comissão Europeia por ter descongelado 10,2 mil milhões de euros de fundos de coesão para a Hungria, que está sob procedimento por infração.
A Comissão dos Assuntos Jurídicos e do Mercado Interno do Parlamento Europeu, aprovou, segunda-feira, a proposta de avançar com uma ação judicial contra a Comissão Europeia, pela decisão que tomou em dezembro passado.
Esta decisão terá, ainda, de ser aprovada pela presidente do Parlamento Europeu, Roberta Metsola, e apresentada ao Tribunal de Justiça Europeu até 25 de março, o mais tardar.
A Comissão Europeia argumentou que o desbloqueio se justificava porque o governo de Budapeste tinha aprovado, em maio do ano passado, uma reforma para reforçar a independência judicial e atenuar a interferência política nos tribunais, em conformidade com quatro "super objetivos" que o executivo tinha imposto.
Os legisladores, fazendo eco das preocupações expressas pela sociedade civil, contestaram o raciocínio e disseram que a reforma não estava à altura do exigido.
Os eurodeputados queixaram-se, também, de que o dinheiro foi descongelado um dia antes de uma cimeira crucial dos líderes da UE, na qual o primeiro-ministro húngaro, Viktor Orbán, ameaçou vetar acordos de apoio à Ucrânia.
Numa resolução aprovada em janeiro, os eurodeputados levantaram a perspetiva de uma ação judicial e sublinharam que "a UE não pode, de forma alguma, ceder à chantagem e negociar os interesses estratégicos da UE e dos seus aliados renunciando aos seus valores".
"A Hungria não cumpre o padrão de independência judicial estabelecido nos Tratados da UE, uma vez que as medidas adoptadas não garantem salvaguardas suficientes contra a influência política e podem ser contornadas ou aplicadas de forma inadequada", dizia a proposta.
Comissão Europeia não recuou
Dias mais tarde, os eurodeputados criticaram os comissários europeus Didier Reynders (Justiça), Nicolas Schmit (Emprego) e Johannes Hahn (Orçamento) por terem feito aquilo a que chamaram um "acordo político" com Orbán para garantir o levantamento do seu veto em troca dos 10,2 mil milhões de euros.
Os três comissários europeus mantiveram-se firmes e insistiram que a Hungria tinha apresentado provas suficientes para demonstrar o cumprimento dos quatro "super objetivos", que incluíam medidas para reforçar o Conselho Nacional da Magistratura, um conselho de supervisão autónomo, e para acabar com a ingerência política no Supremo Tribunal.
"A Comissão tinha a obrigação legal de tomar uma decisão", disse Reynders.
O executivo comunitário ainda retém cerca de 12 mil milhões de euros dos fundos de coesão para a Hungria e a maior parte do seu plano de recuperação e resiliência de 10,4 mil milhões de euros, uma situação que Orbán tem denunciado repetidamente como "chantagem financeira".
Cada envelope está sujeito a diferentes conjuntos de condições que exigem alterações legislativas em domínios como os direitos LGBTQ+, a política de asilo, os contratos públicos e a luta contra a corrupção.
Um único pacote
No entanto, na resolução de janeiro, os eurodeputados afirmam que os fundos que permanecem bloqueados "devem ser tratados como um pacote único e integral e que nenhum pagamento deve ser efetuado, mesmo que sejam feitos progressos numa ou mais áreas, mas persistam deficiências noutra".
Valérie Hayer, eurodeputada francesa que é presidente da bancada liberal Renovar a Europa, apelou à Comissão Europeia para que mantenha uma "transparência total" e forneça ao Parlamento Europeu todas as informações relativas à libertação de fundos.
"É muito importante que analisemos os aspectos legais das decisões tomadas pela Comissão", disse Hayer, aos jornalistas.
Esta não é a primeira vez que o Parlamento Europeu apresenta uma queixa judicial para forçar a Comissão a agir, já que em 2021, recorreu a essa medida por o executivo "não aplicar" um novo mecanismo que ligava os pagamentos de fundos da UE ao respeito pelos direitos fundamentais do bloco.