A Bósnia quer mais barragens, há bósnios que não

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De  Hans von der BrelieEuronews
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A Bósnia-Herzgovina está a apostar na energia hidroelétrica para reduzir a dependência do carvão. Mas, para os ambientalistas, esta transiçâo energética pode vir a ditar o fim de uma das mais valiosas reservas naturais da Europa. #UnreportedEurope

Nos Balcãs Ocidentais, enormes barragens e reservatórios fazem parte da paisagem.

A maior barragem da Bósnia-Herzegovina tem torres 123 metros acima de uma central elétrica com meio século. Hoje, neste legado de Josip Tito e da antiga Jugoslávia, pode estar um modelo para a produção de energia verde no futuro.

Apenas metade do sistema hidroelétrico no rio Trebišnjica foi concluído. O empreendimento ficou conhecido como "Lower Horizons". Agora, os planos antigos voltam a estar em cima da mesa: a construção do projeto "Upper Horizons" teve luz verde para avançar.

Ambientalistas temem fim da reserva natural de Hutovo Blato

A notícia deixou os ambientalistas preocupados com o futuro de Hutovo Blato, uma das mais ricas reservas de zonas húmidas da Europa e lar de mais de 240 tipos de aves migratórias; o pântano na reserva foi reconhecido como zona Ramsar, que lhe confere dos mais altos níveis de proteção existentes.

Zoran Mateljak dirige o departamento regional de água doce da organização não-governamentla World Wild Fund (WWF). Leva-nos numa viagem de barco ao coração do Hutovo Blato, para nos apercebermos de quão baixo está o nível da água.

Durante a viagem, conta que "a água é retirada da Hutovo Blato para a produção de eletricidade" e alerta para "a quantidade de água que temos neste momento ser apenas metade da necessária para sustentar este ecossistema sensível".

De acordo com o ambientalista, "esta é uma das últimas reservas de zonas húmidas mediterrânicas e está em risco, devido às obras que estão a decorrer no Projeto “Upper Horizons". A continuar, esta área vai estar morta dentro de 30 anos".

Em busca de energia limpa

Os trabalhos preliminares de construção do "Upper Horizon" avançam em  Dabar, na República Sérvia, uma das duas entidades políticas da Bósnia-Herzegovina.

Um argumento muito importante para o avanço do projeto, afirma o diretor-geral da hidroelétrica, Željko Zubac, "é a produção de energia limpa. A Bósnia-Herzegovina tem muitos recursos hídricos e o principal objetivo com a construção desta central elétrica é a energia verde, limpa".

A complexa rede de canais, túneis, condutas, lagos artificiais e centrais elétricas vai custar cerca de 200 milhões de euros.

O Banco Europeu para a Reconstrução e Desenvolvimento recusou-se a apoiar o projeto.

E empresas da Rússia, Turquia, França e Alemanha retiraram-se. A China ficou.

Depois de a guerra na Jugoslávia ter travado os planos para o Upper Horizons e, mais tarde, o financiamento ter falhado, atualmente as negociações com Pequim ainda estão em curso.

Se os contratos forem assinados, a central de Dabar poder ser concluída em quatro anos.

Para gestor da construção, Nenad Klačar, o projeto vai permitir a revitalização da paisagem.

"No inverno, ao longo de seis meses de chuvas fortes, este campo é inundado por água de diferentes fontes, tais como fontes subterrâneas e não pode ser usado adequadamente pelos proprietários para a agricultura. Mas isso vai mudar quando redirecionarmos a água", afirma.

As rochas calcárias da região funcionam como uma esponja, com numerosos escoadouros e condutas comunicantes naturais responsáveis pela criação de um sistema de rios subterrâneos labiríntico.

O diretor do projeto nega que a água de Hutovo Blato vá ser drenada para as centrais elétricas.

Mas os ambientalistas discordam, alegando que que, entre o vale de Dabar e a reserva, há ligações subterrâneas em que, ao fechar os escoadouros nas rochas cársicas, o abastecimento de água do pântano vai ser interrompido:

"Esta é a última oportunidade de salvar este lugar fantástico. Durante o verão, precisamos de cinco metros cúbicos por segundo. Esses cinco metros cúbicos estão em risco de desaparecer, devido ao projeto Upper Horizons. Qualquer desvio de água pode matar este lugar", alerta o representante da WWF.

Habitantes locais vs. Pequenas centrais hidroelétricas

Em Konjic, uma cidade no rio Neretva, a associação Zeleni Neretva luta contra as pequenas centrais hidroelétricas.

Amir Variščić, presidente da instituição, diz estar contra o desvio de vários riachos afluentes para alimentar as centenas de pequenos projetos hidroelétricos que proliferam na paisagem bósnia.

As consequências da ação humana são já visíveis, o leito do rio Kraljuística está seco.

"O problema são as duas centrais hidroelétricas. Elas bloqueiam a migração dos peixes. Os peixes não conseguem mover-se para montante. O rio não tem corrente, porque a água é canalizada", defende.

Para o representante da associação local, a explicação do fenómeno é simples. "A razão pela qual os peixes, em particular as espécies endémicas de trutas, presentes neste pequeno rio, estão ameaçados, é o leito estar seco. A companhia hidroelétrica liberta apenas dez por cento da quantidade de água do rio e deixa-a fluir livremente, pelo que não é possível aos peixes migrarem até ao local de desova".

Quando a população de Parsovici soube que o rio estava ameaçado, insurgiu-se contra a construção de 15 centrais hidroelétricas ao longo do riacho Neretvica.

Assim que as máquinas chegaram, os habitantes da aldeia bloquearam as estradas de acesso. Como resultado, a assembleia regional proibiu a construção de pequenas centrais elétricas.

Amir Lipovac é agricultor na região e verbaliza a mensagem que a restante população quer que fique presente. 

"Não queremos dar o nosso rio. A água do rio é realmente importante para a nossa comunidade viver da agricultura, entre três mil e cinco mil pessoas estão dependentes do rio e da água. A luta continua e vamos lutar até ao fim, mesmo que tenhamos de morrer pelo nosso rio".

Os decisores vão travando os projetos de pequena dimensão. No entanto, a estratégia de desenvolvimento da Bósnia-Herzegovina continua a passar pelo investimento em grandes centrais hidroelétricas.

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