Wolfgang Schäuble: "Se todos se portassem como a Espanha, não havia problemas na zona euro"

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A retoma económica está aí, mas a Europa enfrenta ainda inúmeros riscos. A euronews falou com o ministro das Finanças alemão, Wolfgang Schäuble.

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Os sinais de recuperação económica estão aí, mas a Europa enfrenta ainda inúmeros riscos. A euronews esteve na Cimeira Europeia de Negócios, em Bruxelas, onde falou com o ministro das Finanças alemão, Wolfgang Schäuble, sobre os desafios da consolidação do crescimento no bloco europeu.

Maithreyi Seetharaman, euronews: Comecemos por uma premissa básica: onde é que situa o contexto global atualmente e qual é o caminho a seguir?

Wolfgang Schäuble: Nós encontramo-nos numa encruzilhada. Por um lado, as expetativas do resto do mundo em relação à Europa são cada vez maiores. E isso por várias razões, por questões de geopolítica e por aí fora… Por outro lado, nos últimos anos, as dúvidas no seio da Europa também aumentaram. Talvez o Brexit tenha mudado um pouco as coisas. Mas até essa altura, muitos Estados-membros viram os movimentos eurocéticos crescer. Temos de pensar em formas de reforçar o apoio da população europeia ao projeto de integração.

Political agreement possible, but no cash for #Greece at today’s #Eurogroup#Schaeuble said no debt restructering before 2018 dw_europe</a> <a href="https://t.co/lJ0vFQ1dHu">pic.twitter.com/lJ0vFQ1dHu</a></p>— Bernd Thomas Riegert (RiegertBernd) 22 de maio de 2017

euronews: Não são questões propriamente novas… Numa altura em que o FMI fala sobre protecionismo, sobre eventuais guerras comerciais, o senhor, tal como Mario Draghi, não parece estar muito preocupado com isso…

WS: A Europa – a União Europeia, especificamente – foi muito bem-sucedida, ao longo de vários anos, na criação de um mercado comum integrado. É um feito que ninguém questiona, a não ser os britânicos, que são muito peculiares no que toca a esta questão. Mas o resto da Europa concorda com o mercado comum. O que não conseguimos fazer foi criar simultaneamente as bases de um mercado comum sustentável no futuro. O debate centrou-se em: “podemos construir uma união monetária sem uma união política?” E tomou-se uma decisão… porque para haver uma verdadeira união política, ainda teríamos de esperar provavelmente mais um século. O problema é que é preciso fazer alterações ao Tratado de Lisboa. E conseguir introduzir uma mudança no Tratado de Lisboa… boa sorte!

O novo eixo franco-alemão

euronews:A eleição de Emmanuel Macron trouxe muitas expetativas sobre uma nova aliança franco-germânica sólida. Em que bases é que esta “nova relação”: se pode desenvolver? E mais importante ainda: será positiva para as populações e as empresas do sul da Europa?

WS: Será positiva para todos os países da Europa. Defendo profundamente uma integração europeia na qual se trabalhe para colmatar o fosso entre os países que vão bem e os que têm problemas. Temos de partilhar os riscos. Mas não podemos só partilhar os riscos. Temos de aprender a reduzi-los, incentivar os que cumprem, tudo isto através de uma instituição central – a Europa – que consiga implementar as decisões. Se todos se portassem tão bem como a Espanha se portou nos últimos anos, não havia problemas na zona euro. Mas a Espanha é uma exceção.

W #Schäuble: ‘We All Wish #Macron Success but his #Euro reform proposals are currently unrealistic’ / SPIEGEL ONLINE https://t.co/jUBuAVJci0

— Jörg Polakiewicz (@jowicz) 15 de maio de 2017

euronews: Ao contrário da Grécia…

WS: A Grécia tem mais problemas, não pode ser comparada com os outros países, é um caso único. Sabemo-lo desde o início. A Europa não se está a dar assim tão mal se compararmos com os Estados Unidos. Não devemos subestimar as economias europeias, as sociedades europeias. Elas gastam o dobro, em relação ao PIB, do que as outras economias desenvolvidas, como o Canadá, a Austrália, os Estados Unidos. E temos muitas outras vantagens. É claro que também há pontos fracos. Mas eu prefiro o modelo europeu. Aliás, a crise do euro começou com um banco chamado Lehman Brothers. E, se não estou em erro, esse banco não ficava na Alemanha. Nem na Bélgica. Ficava nos Estados Unidos.

A Europa perante o protecionismo

euronews: A Alemanha assume agora a presidência do G20. A administração de Trump e o secretário do Tesouro americano gostariam muito de restabelecer as coisas como eram dantes. Como é que vê isso?

WS: Até ao momento, não constatei que os Estados Unidos pretendam destruir todas as regulações que alcançámos em matéria de mercados financeiros. Tem-se falado muito nesse caminho, mas também no caminho oposto. Nós vamos prosseguir. Não creio que o protecionismo seja um perigo para a Europa.

euronews: E para o resto do mundo?

WS: Para o resto do mundo, é. Mas a Europa está a lutar contra o protecionismo e creio que há fortes possibilidades de permanecermos na lógica dos mercados livres e da competição. É claro que a China, a Índia e outras economias emergentes estão a avançar nessa direção. No entanto, não podemos subestimar o poder de atração dos valores e princípios da União Europeia, mesmo perante todos os problemas que enfrentamos na Europa. Combater os nacionalismos, por exemplo, é um desafio para cada um de nós. Talvez o Brexit tenha servido para acordar algumas pessoas. Agora há quem diga: “afinal, a integração europeia não é assim tão má”. Foi curioso ver como, entre a primeira e a segunda voltas das eleições presidenciais francesas, a senhora Le Pen passou a declarar que afinal não pretendia sair da união monetária, uma vez que as sondagens diziam que 75% da população francesa pretende ficar na zona euro.

O reforço do euro e o sul da Europa

euronews: Ou seja, o grande risco agora é o fortalecimento da moeda europeia? Porque a libra esterlina não se consegue impor neste momento…

WS: Toda a gente tem os seus próprios desafios a enfrentar. Creio que os britânicos vão aperceber-se do erro que foi o Brexit.

euronews: O que é que um euro mais forte implica para as empresas europeias? O sul da Europa tem capacidade para suportar isso?

WS: Claro que tem. A Espanha faz parte do sul da Europa e tem capacidade. A Itália tem graves problemas políticos. A maior parte dos problemas em Itália tem uma origem política. Há muitos italianos que dizem não confiar em nenhum líder político ou partido. E o resultado é que acabam por dar confiança a uma personagem que é uma caricatura. O Movimento 5 Estrelas, Beppe Grillo… São a prova que a Itália tem um problema de confiança em relação aos líderes políticos. Mas acredito que vão conseguir ultrapassar esta fase, tal como outros Estados-membros conseguiram. Portugal está a ir muito melhor do que o previsto.

euronews: Mas conseguem aguentar um euro mais forte?

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WS: Acredito que o crescimento seja maior do que o esperado. Na Alemanha, prevíamos 1,6% para este ano. No primeiro trimestre, já tínhamos alcançado 0,6%. Ou seja, há uma dinâmica de recuperação económica. É o que está a acontecer em Espanha, em Portugal e, espero, venha a acontecer em Itália e na Grécia, claro. Para mim, o debate global deve fazer-se em torno do que significa “crescimento sustentável”. Os riscos geopolíticos assentam no fosso crescente entre ricos e pobres. Se não conseguirmos reduzir esse fosso, se não conseguirmos ajudar o mundo islâmico, se não se conseguir integrar a religião muçulmana no mundo moderno, vamos enfrentar perigos em larga escala, novas formas de guerra, terrorismo… Se a Europa tiver a força suficiente para alcançar um crescimento sustentável e criar sociedades realmente livres, de forma a haver união entre toda a gente, estabelecendo o equilíbrio certo entre liberdade e igualdade, então sim poderemos dar um exemplo ao resto do mundo. Os valores ocidentais ou europeus desestabilizam qualquer ditador do mundo.

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