O "contributo" das organizações humanitárias para o Fórum de Davos

O "contributo" das organizações humanitárias para o Fórum de Davos
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O mundo está a entrar num período crítico de risco de acordo com peritos presentes no Fórum Económico Mundial de Davos.

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O mundo está a entrar num período crítico de risco de acordo com peritos presentes no Fórum Económico Mundial de Davos.

O Relatório de Riscos Globais 2018 foi publicado mesmo a tempo do encontro na estância suíça e tal como no ano passado os receios sobre desastres ambientais são fonte de preocupação. Mas as ameaças geopolíticas – com os novos conflitos e os desastres humanitários que possam surgir – continuam a encabeçar os motivos principais de alarme.

As explicações de Daniel Shapiro, fundador e diretor do Programa de Negociação Internacional de Harvard: “A paz e o conflito são contagiosos. A divisão tende a gerar mais divisão tal como a paz gera mais paz. Neste momento, penso que a energia mundial está muito focada em estimular mais divisão. Penso que houve uma reação à globalização que fez com que nos associássemos a grupos com os quais nos sentimos seguros. Chamo-lhes tribos. Julgo que caminhámos para um mundo mais tribal. De nacionalismo a nativismo. Penso que é como um pêndulo que se move para a frente e para trás. Esse é o desafio que temos pela frente.”

O tema da edição deste ano do Fórum de Davos – “Criar um Futuro Partilhado num Mundo Fraturado” – procura agregar os líderes mundiais para desenvolver uma narrativa comum de forma a melhorar o estado do mundo.

Para discutir as ameaças de segurança no mundo com maior profundidade estivemos à conversa com Peter Maurer, Presidente do Comité Internacional da Cruz Vermelha.

Isabelle Kumar, Euronews – O ano de 2018 acaba de começar mas quais são os domínios que o preocupam mais a nível mundial?

Peter Maurer, Presidente do Comité Internacional da Cruz Vermelha – Para nós 2018 será, provavelmente, a continuação de 2017, o que significa que as grandes áreas de conflito e violência a afetar várias sociedades estarão à cabeça das nossas preocupações bem como os deslocamentos de populações civis. 42% do nosso trabalho acontece em África. 33% no Médio Oriente e depois existe uma grande fratura do sul das Filipinas a Myanmar, ao Afeganistão e à África Ocidental. Essas são as nossas principais preocupações.

Euronews – Ao analisarmos as novas ameaças percebemos, naturalmente, uma escalada de tensão com a Coreia do Norte e os Estados Unidos. Como é que vê essa situação e qual a principal preocupação que isso lhe coloca?

Peter Maurer – O Comité Internacional da Cruz Vermelha foi a única organização humanitária presente em Hiroshima. Por isso, desde o início do uso de armas nucleares que estamos a chamar à atenção da comunidade internacional sobre o quão importante é encontrar políticas que difundam o perigo das armas nucleares porque não podemos lidar com o impacto humanitário do medo da guerra nuclear. Os últimos desenvolvimentos na península coreana, o diálogo entre as duas Coreias, têm-nos dado algum alento.

Euronews – É uma questão que vai levantar quando encontrar os líderes mundiais em Davos? Até que ponto estão preocupados com a ameaça de uma guerra nuclear em 2018 ou mais tarde?

Peter Maurer – Penso que o trabalho de uma organização humanitária importante é o de levantar este tipo de questões e também o de chamar à atenção dos líderes políticos sobre o custo da violência e da guerra – seja nuclear ou não – sobre as populações civis, sobre as sociedades e as economias. Também têm o papel de encorajar os líderes mundiais a encontrar uma solução política para esses problemas porque, numa base humanitária, não se conseguem resolver os grandes problemas.

Euronews – Como avalia a resposta dos EUA a isto? Naturalmente – como alguém pode dizer – são, em parte, responsáveis por esta escalada de tensão no que diz respeito à ameaça nuclear.

Peter Maurer – Isso entra no domínio da tática política e na consideração do que é exatamente a política dos EUA. A verdade é que depois de um agravamento das dificuldades e da tensão vimos também o diálogo. O que conta é o resultado e de momento é positivo.

Euronews – Falemos agora da Rússia. Vimos uma Rússia mais assertiva no palco mundial. Como analisa, do ponto de vista humanitário, o conflito na Ucrânia e o envolvimento da Rússia em países como a Síria?

Peter Maurer – Se contemplar a nossa relação com a Rússia nos últimos anos quer na Síria que na Ucrânia posso dizer, em termos humanitários, que foi uma relação positiva porque a Rússia apoiou o trabalho neutro e imparcial do Comité Internacional da Cruz Vermelha na Síria. Foram importantes em termos da ajuda e de facilitar as situações. Contámos muito com eles.

Euronews – Nem toda a gente entende que tenham facilitado as situações.

Peter Maurer – Claro. Penso que também depende da postura e do estatuto que as agências humanitárias têm e da capacidade de não se imiscuírem em assuntos políticos. Isso geraria, naturalmente, mais relações conflituosas com a Rússia, mas como ator humanitário importante no terreno é um facto que o Comité Internacional da Cruz Vermelha é a única grande organização internacional a trabalhar no leste da Ucrânia e a trabalhar com algum apoio russo importante para ter acesso a muitas partes da Síria.

Euronews – No início desta entrevista falou-se de África, onde estão concentrados muitos dos seus esforços. Pode falar-me brevemente sobre algumas situações de conflito no continente africano e sobre o que mais o preocupa em termos do receio de escalada em 2018?

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Peter Maurer – O que me preocupa é quando olho para o Sahel. Do Sahel ao Corno de África existem muitas linhas de fratura em vários países. O que é preocupante é o impulso a longo prazo destes conflitos. As alterações climáticas afastam as pessoas das oportunidades económicas e de atividades. O conflito entre os pastores e os agricultores, em muitas partes da região, é um problema de longo prazo que tem consequências a curto prazo na espiral de violência e de guerra que afeta as sociedades e obriga à deslocação das pessoas. Penso para lá da divisão ideológica que é, obviamente, imensa. Os impulsos e as dificuldades para gerir algumas destas consequências de longo prazo são um grande problema para quem faz trabalho humanitário porque os vemos com cada vez mais frequência. Somos uma organização humanitária de curto prazo enquanto os efeitos da violência em estado de guerra são de longo prazo. Temos de enfrentar alguns destes problemas de longo prazo.

Euronews – Há muitas notícias más. Ainda existem boas notícias?

Peter Maurer – Existem muitas notícias boas. Quando visito regiões em conflito fico surpreso com a energia, com a ingenuidade das pessoas que sofreram por causa da guerra e da violência e com a capacidade que revelam de encontrar uma saída. Acabo de visitar a República Centro-Africana. Vejo negócios em campos de refugiados. Mulheres a assumir a liderança de sociedades, a reunir outras mulheres e a ajudarem-se. É encorajador para uma organização humanitária.

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