Projeto europeu na Serra Leoa testa vacina promissora contra o Ébola

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A Serra Leoa foi selecionada pelos cientistas de um projeto europeu para participar nos testes de uma vacina contra o Ébola.

A Serra Leoa foi o epicentro da maior epidemia de Ébola. Em três países da África Ocidental, a Serra Leoa, a Guiné Conacri e a Libéria, pelo menos 11 mil pessoas morreram e mais de 28 mil foram diagnosticadas com a doença entre dezembro de 2013 e maio de 2016. Uma crise sanitária sem precedentes que originou um esforço de investigação que começa a dar os primeiros frutos.

A euronews entrevistou uma das sobreviventes da doença, em Kambia, na Serra Leoa. Emma Bangura tinha 23 anos quando contraiu o vírus Ébola, sofrendo sintomas como febre forte, diarreia e vómitos violentos.

"A minha amiga perdeu o pai, eu fui visitá-la, estive lá três dias. O pai morreu e foi enterrado, no período em que eu estava com eles. Depois comecei a ter febre. Senti-me desesperada. A doença estava a atacar-me. Senti medo porque as pessoas diziam que quem vai para o centro de tratamento nunca mais regressa. Decidi fechar-me no quarto", contou Emma Bangura.

Emma ficou em casa seis dias e depois foi tratada numa clínica. Venceu a batalha contra o Ébola mas a sobrevivência teve um preço. Foi obrigada a parar os estudos e agora está em casa sem perspetivas de encontrar um emprego.

A região de Kambia foi uma das mais afetadas pela epidemia. Aldeias inteiras foram isoladas. As famílias deixaram de conviver devido ao medo de serem contaminadas. A economia local desmoronou-se. Por todas essas razões, a região da Serra Leoa foi selecionada pelos cientistas de um projeto europeu para participar nos testes de uma vacina contra o Ébola.

Os ensaios clínicos, na Serra Leoa, envolvem mais de mil voluntários, incluindo crianças e jovens. A euronews assistiu a um dos ensaios com uma criança de dois anos.

"Se o meu filho levar a vacina, será que vai ficar protegido contra o Ébola? Os pais colocam-me essa questão. Nós explicamos que se trata de um ensaio e que ainda não sabemos se vai prevenir ou não o Ébola", contou a enfermeira Isha Kanawah.

Todos os voluntários são seguidos de perto pelas equipas médicas, antes e depois da injeção e são informados regularmente sobre a doença, os sintomas e as formas de prevenção.

"O Ébola é uma das várias febres hemorrágicas virais. É uma doença multissistémica, o que significa que pode afetar quase todos os órgãos do corpo, os olhos, os ouvidos, os vasos sanguíneos, a pele, incluindo o sistema reprodutivo", detalhou o médico Michael Morlai Kamara.

Segundo a Organização Mundial de Saúde, a taxa de mortalidade do Ébola varia entre 50 e 90%. Mas, agora, há esperança. Segundo os cientistas envolvidos no projeto europeu, dos ensaios clínicos da nova vacina são promissores.

"Constatámos que a vacina é segura. Os participantes estão a produzir anticorpos contra o vírus. É muito promissor", afirma a médica Agnes Bangura.

As amostras de sangue dos voluntários são analisadas nos novos laboratórios da região que foram construídos a partir do zero, no âmbito do projeto de investigação europeu. A região não está ligada à rede elétrica nacional. Foi preciso instalar geradores de eletricidade para alimentar os equipamentos sofisticados usados pelos investigadores.

"Estamos a estudar a vacina para saber se é seguro dá-la aos voluntários. Em segundo lugar, analisamos a eficácia da vacina, para saber se ela pode prevenir a doença. Em terceiro lugar, estudamos a imunogenética para saber se a vacina pode ajudar o sistema imunitário a combater os vírus, especialmente o Ébola", explicou Ken Awuondo, cientista especializado em medicina tropical.

O protocolo dos ensaios clínicos que estão em curso na Serra Leoa foi desenvolvido na Holanda. Os investigadores holandeses estão em contacto com as equipas no terreno.

O protocolo requer a administração de duas vacinas diferentes, uma estratégia que visa reforçar a imunidade dos pacientes face a um vírus extremamente perigoso.

"Quando a pessoa é infetada, o vírus reproduz-se rapidamente. Os pacientes ficam com milhões e milhões de vírus no sangue, o que provoca uma mortalidade elevada. Isso implica também que a proteção imunitária da vacina tem de ser extremamente forte para combater essa quantidade de vírus. O Ébola não desapareceu, não vai desaparecer e vai continuar a atacar", declarou Johan Van Hoof, diretor da Janssen Vaccines & Prevention BV, uma das instituições envolvidas no projeto.

Em paralelo à investigação, o envolvimento das comunidades locais é um elemento chave para o sucesso dos ensaios clínicos.

"Temos dados promissores nos nossos ensaios clínicos. A vacina induz uma resposta imunitária forte e duradoura. Estamos muito felizes por constatá-lo. Com este dados, vamos iniciar o processo de autorização de comercialização. É um dos nossos objetivos", acrescentou kerstin Luhn, uma das especialistas da Janssen Vaccines.

Comissão Europeia e Farmacêuticas investem 3,2 mil milhões de euros

O projeto de investigação em torno do vírus Ébola faz parte de uma iniciativa intitulada Medicinas Inovadoras, a maior parceria público-privado na área da saúde a nível mundial. Com um orçamento de 3,2 mil milhões de euros, a iniciativa é financiada pela Comissão Europeia e pela indústria farmacêutica.

O objetivo é partilhar conhecimento sobre o desenvolvimento da próxima geração de vacinas, medicamentos e tratamentos contra várias doenças, incluindo o vírus Ébola.

O mundo ficou muito preocupado quando ocorreu o surto de Ébola. Ninguém conseguia prever o que iria acontecer. Fomos capazes de mobilizar a indústria e o setor público. Construímos rapidamente o programa Ébola que inclui não apenas vacinas mas também diagnósticos, entre outras coisas", explicou Pierre Meulien, diretor executivo da Iniciativa Medicinas Inovadoras.

A professora Kadiatu L. Bangura sobreviveu ao vírus, no início da epidemia. Durante as aulas, faz questão de partilhar com os alunos tudo o que sabe sobre a doença.

"Conheço os sinais e sei que há comportamentos a evitar. Não se deve brincar com pessoas doentes nem comer carne. Não se deve partilhar objetos com uma pessoa doente ou usar o mesmo copo, por exemplo. Agora sei todas essas coisas", resumiu a sobrevivente.

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