A oração perturba a paz na escola? Em Berlim, um aluno foi impedido pelo diretor da escola de rezar durante a hora de almoço. Agora, uma associação está a processá-lo e o aluno está a quebrar o silêncio.
Um aluno muçulmano reza sozinho no sótão de uma escola secundária de Berlim, durante a sua hora de almoço. De facto, não incomoda ninguém. Mas o diretor da escola reparou nele e exigiu-lhe, em voz alta, que deixasse de rezar imediatamente.
"A cada passo que dava na minha direção, tornava-se mais alto e mais agressivo", recorda o aluno, que deseja manter o anonimato. "Naquele momento, fiquei com medo que ele me pudesse empurrar. Depois comecei a chorar".
O aluno já não está naquela escola. Mas, mesmo passados cinco anos, o caso continua a ser relevante: a Sociedade para os Direitos da Liberdade (GFF, na sigla em Alemão) interpôs uma ação coletiva contra a proibição da oração na escola secundária de Berlim. A regra proíbe os alunos de rezar de forma visível — "no interesse da paz escolar", como diz o regulamento interno da escola.
A Euronews contactou a escola, que se recusou a comentar pessoalmente e remeteu o caso às autoridades educativas.
A oração põe em causa a paz escolar?
O Departamento de Educação, Juventude e Família do Senado referiu-se ao requisito de neutralidade, que obriga as escolas a atuar de forma neutra em relação a questões ideológicas e religiosas. Poderá ser considerada uma proibição se as orações públicas perturbarem a paz escolar ou prejudicarem o bom funcionamento da escola.
A Euronews falou com a advogada do GFF, Soraia da Costa Batista, sobre o assunto. A referência abstrata à paz escolar não é suficiente para proibir a prática religiosa de forma generalizada.
Todos os alunos têm o direito fundamental à liberdade religiosa, nos termos da Constituição. É seu direito exercê-lo na escola, sublinha a advogada.
"Então, que rezem também"
Na altura, este direito fundamental foi negado ao antigo aluno. O jovem de 24 anos ainda se lembra da argumentação do diretor: os outros alunos não devem ser prejudicados. "Olhando para trás, penso para mim próprio: 'Huh? Então deixa-os rezar também'."
Hoje pode falar abertamente sobre o assunto. Na altura, ficou em choque. Antigos confidentes tornaram-se supervisores. Com o tempo, os professores foram incumbidos de patrulhar as escadas para que nenhum aluno pudesse rezar ali, recorda o antigo aluno.
A liberdade religiosa individual põe em causa a neutralidade da escola?
A advogada sublinha que não cabe à escola julgar ou mesmo restringir injustificadamente a prática religiosa dos alunos, que está protegida pelos direitos fundamentais.
Soraia Costa Batista esclarece que a neutralidade religiosa nas escolas diz respeito, de facto, às escolas enquanto instituições do Estado, mas não aos direitos fundamentais dos alunos.
Qual é a diferença?
A liberdade religiosa individual dos alunos não é imputável ao Estado. "Se os alunos praticam [a sua religião], então o Estado não se identifica com a prática religiosa dos alunos", afirma Costa Batista.
A situação é diferente se a escola decidir pendurar um símbolo cristão na parede, por exemplo. Enquanto instituição estatal, a escola estaria, por sua vez, a identificar-se com uma religião — "e é aí que reside a diferença", explica o advogado.
"Porque é que se há de ter medo e esconder-se?"
O antigo aluno está convencido de que a escola deve ser um local onde as crianças possam desenvolver-se livremente. "Se uma criança quer apenas relaxar, isso faz parte do seu desenvolvimento", diz. Desde que ninguém seja incomodado ou propagandeado, rezar não é um problema, diz ele. "Porque é que há de ter medo e esconder-se?"
A escola justifica a proibição com base em experiências negativas do passado.Há cerca de vinte anos, houve alegados conflitos relacionados à prática religiosa, disse a advogada à Euronews, quando questionada. No entanto, esses conflitos não estavam diretamente relacionados com a oração islâmica obrigatória, diz Soraia Costa Batista.
O aluno com quem a Euronews falou não pode confirmar esta experiência: "Na minha turma havia muçulmanos, cristãos e judeus", recorda.
No seu caso, o facto de estarem juntos teria tido o efeito exatamente oposto: "Não uma divisão, mas uma ligação comum ainda mais forte", diz.
"Rezar nas escadas é contra a dignidade humana"
Costa Batista refere-se aos deveres educativos das escolas: "Se surgirem conflitos devido à prática da religião, a escola dispõe, em primeiro lugar, de muitos instrumentos pedagógicos e legais, como medidas educativas e disciplinares, com os quais pode reagir a esses conflitos."
A proibição da liberdade religiosa seria a última opção quando tudo o resto estiver esgotado, diz a advogada. No entanto, mesmo neste caso, a prática da religião não pode ser proibida de forma permanente, mas apenas enquanto a capacidade de funcionamento da escola for restabelecida, diz Costa Batista.
"Como se os alunos estivessem a cometer um crime"
"Não consigo perceber por que foi tomada uma atitude tão agressiva contra [a oração]", diz o antigo aluno. "Como se os alunos estivessem a cometer um crime." Era uma reminiscência de uma ditadura. Estas condições não deveriam existir nos dias de hoje, sublinha. "Rezar nas escadas é contra a dignidade humana".
Na sua opinião, o problema seria fácil de resolver: com salas de oração nas escolas. Toda a gente deveria ter a oportunidade de rezar durante as horas não lectivas, diz ele. "Sejam cristãos, judeus ou muçulmanos — não importa. "