János Bóka diz à Euronews que a Europa precisa de manter "algum tipo de relação" com Moscovo para se salvaguardar.
A União Europeia deve envolver a Rússia se quiser construir uma "arquitetura de segurança sustentável", afirmou o ministro húngaro dos Assuntos Europeus, János Bóka, numa entrevista à Euronews.
"Se queremos construir uma arquitetura de segurança sustentável para as próximas décadas, a relação entre a Europa e a Rússia tem de ser concebida de alguma forma", afirmou Bóka.
"Nós, tal como todos os Estados-membros da União Europeia, acreditamos que temos de apoiar totalmente a soberania e a integridade territorial da Ucrânia", acrescentou. "Penso que isto é inquestionável, mas também acredito que uma arquitetura de segurança sustentável não é possível sem o envolvimento da Rússia através dos canais diplomáticos".
Na sexta-feira passada, o primeiro-ministro Viktor Orbán provocou reações dos líderes da UE quando fez uma visita surpresa ao presidente russo Vladimir Putin, em Moscovo, no âmbito do que o primeiro-ministro húngaro descreve como "Missão de Paz 3.0".
O encontro com Putin seguiu-se a uma deslocação à Ucrânia para conversações semelhantes com o presidente Volodymyr Zelenskyy.
O momento da viagem a Moscovo, dias depois de Budapeste ter assumido a presidência rotativa do Conselho da UE, e a utilização da marca da presidência da UE nas comunicações relacionadas com a chamada missão de paz, alimentaram a ira em Bruxelas.
O presidente do Conselho Europeu, Charles Michel, afirmou numa resposta mordaz que "a presidência rotativa da UE não tem mandato para dialogar com a Rússia em nome da UE".
A resposta foi dada dias antes de o maior hospital pediátrico de Kiev ter sido atingido num ataque que, segundo uma análise da ONU, foi causado diretamente por um míssil russo.** Pelo menos duas pessoas morreram no hospital e cerca de 50 ficaram feridas, incluindo sete crianças.
Pressionado sobre se as aberturas da Hungria a Putin eram apropriadas, tendo em conta as atrocidades do Kremlin na Ucrânia, Bóka respondeu: "O bombardeamento é horrível, é terrível", acrescentando: "Penso que a perda de vidas humanas e os danos causados por esta guerra (...) sublinham a importância da missão de paz do primeiro-ministro húngaro", explicou.
Orbán estava "em busca de vontade de cessar-fogo
Numa carta dirigida a Michel e aos líderes da UE, a que a agência noticiosa alemã DPA teve acesso, Orbán justificou a viagem a Moscovo devido ao seu efeito económico no bloco de 27 países.
Orbán terá afirmado na carta que Putin espera um rápido colapso do lado ucraniano nos próximos meses.
Bóka disse à Euronews que a viagem do primeiro-ministro húngaro tinha como objetivo "descobrir se existe vontade" de ambos os lados para um cessar-fogo e avaliar de que forma as instituições da UE podem ser "úteis" na mediação de uma saída para o conflito.
"Muitos Estados-membros acreditam que os nossos objetivos estratégicos podem ser alcançados por meios militares no campo de batalha. A intenção do primeiro-ministro era fornecer informações e esclarecimentos adicionais que pudessem contribuir para estas discussões", disse Bóka, acrescentando que Orbán informou confidencialmente Michel e os chefes de Estado e de Governo da UE sobre os resultados da sua viagem.
Zelenskyy tem afirmado sistematicamente que a Ucrânia não irá contemplar conversações com Moscovo até que as forças russas abandonem todo o território ucraniano, incluindo a Crimeia.
O ministro explicou também que a Hungria vê a China como um ator-chave nas futuras conversações de paz, apesar do papel de Pequim ao permitir a Moscovo contornar as sanções ocidentais, fornecendo componentes proibidos ao sector militar russo.
A UE já sancionou as empresas chinesas por ajudarem o Kremlin a obter artigos proibidos e letais.
Parlamento Europeu adia sessão "apenas uma questão de agenda
Orbán está pronto para se dirigir ao recém-eleito Parlamento Europeu para definir as suas prioridades para a presidência da UE, marcada pelo governo húngaro sob o lema "Tornar a Europa grande de novo", disse ainda o ministro dos Assuntos Europeus da Hungria.
É habitual que o líder do país que assume a presidência fale durante a primeira sessão plenária da sua rotação, mas Orbán não foi convidado para a sessão inaugural em Estrasburgo, marcada para a próxima semana.
Duas fontes familiarizadas com o assunto disseram à Euronews que o discurso de Orbán perante o hemiciclo foi intencionalmente bloqueado pelo Parlamento, devido ao desconforto causado pela sua viagem à Rússia e aos esforços contínuos para fazer descarrilar a ajuda da UE a Kiev.
Mas Bóka rejeitou qualquer sugestão de que Orbán tenha sido excluído por motivos políticos, afirmando que o facto de apenas se realizar uma sessão plenária em julho torna possível adiar o discurso do primeiro-ministro.
"Não estou a ver aqui nenhumas complexidades políticas", explicou. "Penso que é perfeitamente compreensível que, na primeira sessão do Parlamento Europeu, quando elegem os seus próprios funcionários e quando elegem ou não elegem o presidente designado da Comissão, seja perfeitamente claro que não têm tempo para isto".
"Penso que se trata apenas de uma questão de calendário. Não acredito que o Parlamento Europeu não esteja interessado numa cooperação sincera entre as instituições durante a presidência húngara".
A entrevista completa será transmitida em breve no programa Global Conversation da Euronews.