Um antigo cirurgião francês está a ser julgado, acusado de ter violado ou abusado sexualmente de quase 300 pessoas, na sua maioria crianças, ao longo de 25 anos.
O antigo cirurgião francês Joël Le Scouarnec começou a ser julgado em França, na segunda-feira, acusado de violar ou abusar sexualmente de centenas de vítimas.
O processo revela que Le Scouarnec agrediu sexualmente 299 pessoas que eram suas pacientes, a maioria das quais crianças, naquilo que os investigadores e os seus próprios cadernos de notas descrevem como um padrão de violência que se estende por mais de três décadas.
"Cometi actos odiosos", admitiu Le Scouarnec perante um tribunal de Vannes, "eram apenas crianças".
O homem de 74 anos pode ser condenado a até 20 anos de prisão, para além dos 15 anos que já está a cumprir desde que foi considerado culpado de violação e agressão sexual de crianças num outro julgamento em 2020.
O ex-cirurgião disse ao tribunal que reconhece ter cometido violações e agressões sexuais, mas nega a culpa total de todos os casos, dizendo que não se lembra de tudo.
"Tenho consciência de que estas lesões são irreparáveis", afirmou. "Não posso voltar atrás no tempo, mas devo a todas estas pessoas e aos seus entes queridos a responsabilidade pelos meus atos".
Alguns sobreviventes não se recordam das agressões, pois estavam inconscientes na altura. Um homem, atualmente na casa dos trinta anos, testemunhou que foi agredido durante uma consulta em 1995, quando ainda era uma criança.
"Lembro-me de certas coisas na sala de recobro. Estava em pânico total. Telefonei ao meu pai", disse ao tribunal.
O julgamento de Le Scouarnec ocorre num momento em que os ativistas se esforçam por acabar com os tabus que há muito rodeiam os abusos sexuais em França, após o ímpeto gerado pelo caso de violação de Gisèle Pélicot, que foi muito publicitado.
Pélicot foi drogada e violada pelo marido e dezenas de outros homens, que foram condenados a penas que variam entre três e 20 anos de prisão.
O julgamento de quatro meses em Vannes, no oeste de França, vai examinar alegadas violações e outros abusos cometidos num período de 25 anos, entre 1989 e 2014. Os abusos foram cometidos contra 158 rapazes e 141 raparigas que tinham, em média, 11 anos de idade na altura.
O médico abusava sexualmente dos doentes quando estes se encontravam sozinhos nos quartos de hospital.
Le Scouarnec tinha sido condenado em 2005 por posse e importação de material de abuso sexual de crianças e condenado a quatro meses de prisão com pena suspensa. Apesar dessa condenação, foi contratado como médico no hospital no ano seguinte.
Algumas associações de proteção da infância intervieram no processo como partes civis, afirmando que esperam que o quadro jurídico seja reforçado para evitar este tipo de abusos.