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Administração Trump enviou questionário ideológico a universidades portuguesas e cortou apoios

Reitores repudiam ingerência da administração Trump nas faculdades portuguesas
Reitores repudiam ingerência da administração Trump nas faculdades portuguesas Direitos de autor  Paulo Duarte/AP2011
Direitos de autor Paulo Duarte/AP2011
De Joana Mourão Carvalho
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Instituições com programas financiados pelo Governo dos EUA foram questionadas sobre ideologia de género, ligações a terrorismo e influências “malignas da China”.

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Várias universidades públicas portuguesas que têm protocolos assinados com os Estados Unidos receberam uma carta da Embaixada norte-americana com um questionário que inclui 36 perguntas sobre ideologia de género, ligações a partidos comunistas, influências malignas da China, eventuais ligações a grupos terroristas e financiamentos recebidos de vários países como Rússia, Cuba ou Irão.

No início desta semana, as universidades receberam uma comunicação inesperada da Embaixada dos Estados Unidos, anunciando o corte do financiamento, se não respondessem a este questionário. E algumas instituições já perderam mesmo esses apoios.

É o caso do Instituto Superior Técnico (IST) de Lisboa que viu cancelado o financiamento a um programa que mantinha nas suas instalações um espaço de divulgação da cultura norte-americana.

Em causa está a continuação do programa "American Corner", que funciona em várias universidades portuguesas há mais de uma década. Além do IST, as universidades dos Açores, Aveiro, Porto (Faculdade de Letras), Lisboa (Faculdade de Letras) e Nova de Lisboa (Faculdade de Ciências e Tecnologia) têm estes espaços.

O objetivo é promover a comunicação da ciência e aproximar as culturas americana e portuguesa. A Embaixada dos Estados Unidos em Lisboa descreve-os como "centros de informação e cultura".

Por exemplo, na Faculdade de Letras da Universidade do Porto, este programa concede uma verba anual para eventos e atividades académicas e ainda para a compra de equipamentos tecnológicos de última geração.

O programa financiou ainda dois estúdios, um de televisão e outro de rádio, preparados para a produção de conteúdos e ainda uma sala de conferências para palestras e workshops.

No IST, o "American Corner" funcionava há mais de dez anos, promovendo palestras, encontros e atividades de "divulgação e de cariz científico". O financiamento anual rondava os 20 mil euros.

Reitores repudiam "intromissão intolerável" na autonomia das instituições

Em declarações à agência Lusa, o presidente do IST, Rogério Colaço, confirmou a receção de uma comunicação do cancelamento, com "efeito imediato", do programa "American Corner", a par de um inquérito com "questões bastante desadequadas" sobre se o IST colaborava ou não, ou era citado ou não em acusações ou investigações envolvendo associações terroristas, cartéis, tráfico de pessoas e droga, organizações ou grupos que promovem a imigração em massa.

"O Técnico respondeu que não iria responder ao questionário porque não se adequava a uma instituição de ensino superior pública sujeita a escrutínio público e legal de um país democrático membro da União Europeia", justificou Rogério Colaço.

O presidente do IST indicou também que a comunicação cita uma determinação emanada do Departamento de Estado norte-americano.

O diretor da Faculdade de Letras da Universidade de Lisboa (FLUL), Hermenegildo Fernandes, também confirmou à Lusa ter recebido o mesmo questionário, que o deixou estupefacto pela "dimensão do descaramento" das perguntas.

De acordo com o diretor da FLUL, continha questões sobre "agendas climáticas", se a instituição tinha "contactos com partidos comunistas e socialistas" ou "relações com as Nações Unidas, República Popular da China, Irão e Rússia" e o "que fazia para preservar as mulheres das ideologias de género".

A faculdade optou igualmente por não responder ao questionário, sublinhando que "a sua dependência é com as políticas científicas de Portugal e da União Europeia".

Hermenegildo Fernandes não adiantou, contudo, se o "American Corner" foi cancelado ou não à faculdade, cujo espaço partilha instalações próximas com o Instituto Confúcio, entidade oficial da China que promove a cultura e a língua do país.

A direção da Faculdade de Ciências e Tecnologia da Universidade Nova de Lisboa, apenas indicou que o "American Corner" é "um projeto anual que terminará em setembro".

"Estamos a avaliar a hipótese de nos candidatarmos à continuação do projeto ou não", acrescentou a faculdade numa breve declaração à Lusa.

O reitor da Universidade de Aveiro, que é também presidente do Conselho de Reitores, lamentou igualmente os termos da comunicação feita pela Embaixada dos Estados Unidos, condicionando a continuidade de financiamento à resposta a perguntas “intoleráveis”.

"O conselho de reitores discutiu o assunto e as perguntas, pela sua natureza, configuram uma intromissão intolerável na autonomia das instituições e na sua liberdade de investigação e da ação académica", considerou em declarações à Lusa.

Paulo Jorge Ferreira reconheceu o direito dos financiadores decidirem se querem continuar ou não com este apoio, mas disse ser incorreto condicionar as instituições a responder a questões "que são ofensivas para a sua independência e para a sua liberdade académica".

Embaixada não responde diretamente sobre cancelamento do financiamento

"Temos excelentes relações com todos os seis 'American Corners' e continuaremos a colaborar numa série de programas e iniciativas que promovam os nossos objetivos comuns", reagiu a porta-voz da embaixada norte-americana em Lisboa, Marie Blanchard, a uma questão da Lusa sobre os cortes anunciados ao programa e como este iria ser afetado, e em que moldes.

Segundo a embaixada, mais de 600 destes espaços estão localizados em universidades, centros comerciais, bibliotecas e outros locais públicos, bem como em instalações de embaixadas, em mais de 140 países.

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