Kurti: "Queremos relações normais entre o Kosovo e a Sérvia"

Kurti: "Queremos relações normais entre o Kosovo e a Sérvia"
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De  Sergio Cantone
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A Euronews falou com o primeiro-ministro kosovar acerca dos efeitos da guerra na Ucrânia nos Balcãs Ocidentais e do diálogo entre o Kosovo e a Sérvia

A guerra na Ucrânia provocou tensões na totalidade dos Balcãs Ocidentais, com a desconfiança entre sérvios e albano-kosovares a atingir níveis preocupantes. A União Europeia está profundamente preocupada com a situação. 

A Euronews debateu a questão com o primeiro-ministro do Kosovo, Albin Kurti.

Sergio Cantone, Euronews: Quais são as suas expectativas para o dia 18 de Março, quando será retomado o diálogo com a Sérvia?

Albin Kurti, primeiro-ministro do Kosovo:"Devíamos ter assinado o acordo a 27 de Fevereiro. Infelizmente, o Presidente da Sérvia não quis assinar. Este Tratado Básico que foi proposto pela União Europeia, constitui um terreno sólido para avançar, e esperamos finalmente alcançá-lo a 18 de Março."

Euronews: A Sérvia pede, por exemplo, que o Kosovo cumpra as obrigações de criar a comunidade de municípios sérvios no Kosovo. Essa parte do acordo negociado com a UE é aceitável para si?

Kurti:"Estou aqui como primeiro-ministro de todos os cidadãos, apesar da nacionalidade, identidade nacional ou origem étnica ou religiosa. Por isso, quero satisfazer todos os cidadãos de acordo com os seus direitos, necessidades e exigências. Mas não são possíveis soluções monoétnicas, devido à ordem jurídica da nossa república democrática."

Euronews: Sim, mas é por isso que estou a dizer que a autodeterminação está excluída. Estamos a falar de autonomia.

Kurti:"É por isso que estamos a falar de autogestão da comunidade sérvia no artigo sete do Tratado, que subscrevemos. E a autogestão da comunidade sérvia também faz referência ao Conselho da Europa como uma organização, o que significa que temos de nos referir à Convenção-Quadro sobre a Protecção dos Direitos das Minorias Nacionais. Penso que podemos fazer o mesmo no Kosovo, para não mergulharmos num etno-nacionalismo territorial como aconteceu na Bósnia."

Euronews: Teve algum sinal dos membros do Conselho da Europa de que poderá ter luz verde em breve?

Kurti:"Uma grande maioria dos membros do Conselho da Europa mostra-se positiva no que diz respeito à candidatura do Kosovo e espero que agora aceleremos os procedimentos para obter uma votação final e nos tornarmos membros do Conselho da Europa. Para nós, é muito importante, porque seria ainda mais benéfico para os próprios cidadãos do que para o país. No diálogo com o Presidente da Sérvia em Bruxelas, sublinho sempre que a normalização das relações deve ter os cidadãos como principais beneficiários."

Euronews: Após a agressão russa contra a Ucrânia, temos visto as tensões crescer nessa parte da Europa. Qual é, na sua opinião, a relação?

Kurti:"A Ucrânia constitui também uma linha da frente onde a democracia, liberdade e direitos humanos estão a ser defendidos. Houve vários efeitos no nosso país. O efeito imediato foi que os traumas da população sobre o genocídio da Sérvia jugoslava de Milosevic, na Primavera de 1999, voltaram a ressurgir."

Euronews: Não foi reconhecido como genocídio pelo tribunal. Reconheceram crimes de guerra, violência contra a população e limpeza étnica. Mas o genocídio foi sobre a Bósnia.

Kurti:"Houve um genocídio reconhecido em Srebrenica. Mas penso que não foi apenas em Srebrenica... [...] O__que nós sofremos foi um genocídio. Mulheres, crianças, mulheres grávidas foram mortas e queimadas, indiscriminadamente. E ainda não houve um [processo]."

Euronews: Os responsáveis já foram julgados...

Kurti:"Ainda não foi realizado um processo em que o Kosovo processasse a Sérvia por genocídio. Mas o que sofremos foi um genocídio."

Euronews: Mas esse não é o ponto de vista do tribunal internacional....

Kurti:"Chegará o dia em que também os tribunais internacionais falarão sobre isso. Infelizmente, Milosevic morreu em Haia na prisão, sem viver o dia em que teria sido condenado."

Euronews: Mas porque é que está a ligar este episódio à guerra na Ucrânia? É do mesmo ponto de vista ético e moral ou existe uma continuidade política?

Kurti:"Há aqui dois elementos importantes: em 2022, todas as semanas, o Kremlin mencionava o Kosovo. Se não Putin, então Medvedev ou Zakharova, ou Lavrov..."

Euronews: Não se sente protegido pela presença da KFOR? As tropas da NATO estão presentes no Kosovo.

Kurti:"O maior vizinho [a Sérvia], que não reconhece o país, que não se distancia de Milosevic, que não se distancia de Putin, que afecta 3% do nosso PIB para equipamento militar e apresenta um elevado nível de prontidão de combate das suas tropas junto à fronteira, não pode ser negligenciado. É claro que o Kosovo não está na NATO, é a NATO que está no Kosovo. Sentimo-nos seguros. Não temos medo, mas estamos muito vigilantes."

Euronews: Espera algum resultado positivo em termos de concessões mútuas por ambas as partes?

Kurti:"Queremos relações normais. Compreendemos que a normalização total das relações deve ter como peça central o reconhecimento mútuo. Não estou a dizer que o reconhecimento mútuo deve ser a única coisa em cima da mesa, estou pronto para discutir todas as questões, de forma paciente. Não quero qualquer tipo de pressa, qualquer tipo de solução rápida em detrimento da nossa segurança, paz e estabilidade a longo prazo. E mais uma vez, de boa fé, com boa vontade e intenções, estou pronto a fazer este acordo, que não tem apenas dois factores, Kosovo e Sérvia, mas também a União Europeia, que é o quadro dentro do qual negociamos e ao qual queremos aderir."

Euronews: Sim, mas a UE precisa de uma grande vitória política. Percebe que poderia dar-lhes isso?

Kurti:"Bom, não posso fazer um acordo comigo mesmo. Tenho de concluir um acordo com a Sérvia, com a UE. E, a 27 de Fevereiro, estava pronto para assinar."

Nome do jornalista • Sergio Cantone

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