As conclusões constam de um relatório divulgado, na segunda-feira, pelo GPIAAF (Gabinete de Prevenção e Investigação de Acidentes com Aeronaves e Acidentes Ferroviários).
O relatório preliminar sobre o descarrilamento do Elevador da Glória, em Lisboa, aponta que o cabo de tração/equilíbrio entre as duas cabinas "não estava certificado para utilização em instalações para o transporte de pessoas", nem para "utilização no Ascensor da Glória".
Foi esse o cabo que sofreu uma rutura, "após 337 dias de uso", sendo ainda necessário determinar o "exato mecanismo de cedência do material e fatores causais" que estiveram na base dessa ocorrência e do consequente descarrilamento.
As conclusões constam de um relatório divulgado, na segunda-feira, pelo GPIAAF (Gabinete de Prevenção e Investigação de Acidentes com Aeronaves e Acidentes Ferroviários).
Sobre a inadequação do cabo que cedeu no Elevador da Glória, o relatório preliminar indica que esse "não era indicado para ser instalado com destorcedores nas suas extremidades, como é o sistema no Ascensor da Glória", mas também no Ascensor do Lavra.
Com o gabinete de investigação a determinar que a "utilização de cabos multiplamente desconformes com as especificações e restrições de utilização deveu-se a diversas falhas acumuladas no seu processo de aquisição, aceitação e aplicação" por parte da Carris.
No entanto, detalha o documento, visto que "cabos iguais estiveram em uso durante 601 dias no Ascensor da Glória", bem como "606 dias no Ascensor do Lavra", sem registo de incidentes, "não é possível neste momento afirmar se as desconformidades na utilização do cabo são ou não relevantes para o acidente".
As conclusões sobre a manutenção
No que diz respeito à manutenção do ascensor, registaram-se "evidências de que tarefas de manutenção registadas como cumpridas nem sempre correspondem às tarefas efetivamente realizadas, bem como de serem executadas tarefas críticas para a segurança de forma não padronizada, com parâmetros de execução e validação díspares". Apontando, desse modo, para que esses procedimentos tenham sido, de certo modo, falseados.
Além do mais, destaca-se que as "inspeções previstas para o dia do acidente e antecedentes estão registadas como executadas e o pessoal do prestador de serviço esteve presente". No entanto, "as evidências não suportam o período horário indicado nas folhas de trabalho para a sua execução".
Já no que diz respeito ao "modo específico de execução dos trabalhos especializados no ascensor", o GPIAAF esclarece ainda que "não há por parte do quadro técnico do prestador de serviços de manutenção qualquer orientação aos trabalhadores ou supervisão" no que diz respeito ao desempenho desta tarefa.
Ainda assim, indica-se que "neste momento da investigação não é possível afirmar se algum indício de anomalia no cabo poderia ou não ser observado algum tempo antes da rotura numa inspeção à parte visível junto ao trambolho", peça metálica robusta, de engate, entre o cabo do funicular e o veículo.
Sistema de frenagem das cabinas "não foi eficaz"
O relatório preliminar nota ainda, na sequência do incidente que provocou 16 vítimas mortais e 21 feridos, que "o sistema incorporado no Ascensor da Glória de deteção de rotura do cabo atuou devidamente, cortando a energia elétrica às cabinas a fim de desencadear nelas uma frenagem de emergência com vista à sua imobilização segura".
Mas, de forma contrastante, o "sistema de frenagem das cabinas não foi eficaz para as imobilizar, apesar de na cabina 1 [a que descarrilou] todos os existentes, automáticos e manuais, terem sido aplicados". Aponta-se ainda que não existe registo de que "alguma vez tenha sido testado o freio de emergência na situação de falha no cabo".
Com o relatório a concluir: "Entre diversos técnicos e trabalhadores da CCFL [Carris] ligados aos ascensores havia a perceção de que a segurança do sistema dependia inteiramente do cabo e que o sistema de freio não era eficaz para imobilizar as cabinas sem o cabo. Por este motivo, havia um elevado cuidado no controlo do cabo, nomeadamente limitando a sua utilização a 600 dias, muito abaixo da duração expectável para aquele componente. Mas esta perceção nunca se materializou organizacionalmente numa reavaliação das condições de segurança do sistema."
Segurança da operação da "exclusiva responsabilidade" da Carris
O GPIAAF, na sua avaliação preliminar sobre o acidente, revela ainda que " os aspetos de segurança da operação de ambos os ascensores encontravam-se à exclusiva responsabilidade da CCFL [Carris] enquanto entidade operadora". Pelo que os mesmos não eram "supervisionados por qualquer entidade independente, pública ou privada".
Segundo noticiado pela RTP, o diretor de Manutenção do Modo Elétrico da Carris foi demitido, embora a empresa tenha rejeitado a exclusiva responsabilidade pela segurança dos ascensores, como é o caso do Elevador da Glória. A Carris recordou, aliás, que esses procedimentos estiveram a cargo da MNTC, empresa de manutenção que operava como prestadora de serviços, desde 2019.
Já o presidente da Câmara Municipal de Lisboa, Carlos Moedas, citado pela CNN Portugal, considerou, com base nas conclusões do relatório, que "a infeliz tragédia do elevador da Glória foi derivada de causas técnicas e não políticas". Tendo criticado a "politização que alguns fizeram durante a campanha" para as eleições autárquicas, que decorreram no passado dia 12 de outubro.
De recordar que o Elevador da Glória, que faz o percurso entre os Restauradores e o Miradouro de São Pedro de Alcântara, descarrilou na calçada com o mesmo nome, em Lisboa. O acidente ocorreu pouco depois das 18:00, no dia 3 de setembro, com os serviços de emergência a terem sido mobilizados imediatamente para o local.