Uma Escócia independente?

Heráclito dizia “não há nada permanente na vida, exceto a mudança”. A Terra, o nosso planeta azul, deu-nos a confirmação literal da sabedoria do filósofo grego em novembro de 2013, quando uma erupção vulcânica, no meio do oceano, presenteou o Japão com uma nova ilha, um pequeno pedaço de território novo. Em 2014, a milhares de quilómetros do arquipélago japonês, esta ilha é a clara evidência do eterno devir de Heráclito.
No dia 18 de setembro de 2014, os residentes da Escócia com mais de 16 anos terão que responder “Sim” ou “Não” à questão “Deverá a Escócia ser um país independente?”. Se 50 por cento, mais um, dos participantes do referendo votar “sim”, a Escócia coloca um ponto final aos 306 anos de união com a Inglaterra, torna-se independente no dia 24 de março de 2016 e a partir daí, pode forjar um futuro sozinha.
A contagem decrescente começou para o principal defensor da secessão, o Partido Nacional Escocês (SNP).
Num vigoroso bloco de papel branco com 670 páginas, que contém a planificação mais detalhada e completa da independência alguma vez publicada, o SNP declarou o seu caso. Uma Escócia independente manteria a rainha como monarca e a libra como moeda. Edimburgo encarregar-se-ia das próprias finanças, fixaria os impostos e gastaria como bem lhe conviesse as receitas de petróleo e de gás do Mar do Norte. Atualmente, cerca de 90% da extração de combustíveis fósseis no Reino tem lugar ou gira em torno da Escócia. As fronteiras com o Reino Unido pode permanecer aberta, a cidadania pode ser compartilhada e as dívidas nacionais distribuídas.
A liderar a campanha “NÃO”, “Melhor Juntos”, estão os três grandes partidos políticos do Reino Unido que argumentam: Uma Escócia independente de 5 milhões de pessoas seria menos próspera e menos segura.
E, até agora, a maioria dos escoceses concorda com eles. Uma sondagem realizada em novembro de 2013, mostra que 47% dos moradores da Escócia queriam manter a união, 38% queriam a independência e 15% estavam indecisos. Mas o percurso até ao referendo em setembro de 2014 é longo, e um “Sim” não é de todo impossível. Se um evento deste calibre se tornasse realidade, as ondas de choque provocadas seriam sentidas além das margens do Reino Unido.
A Escócia não é única região centrífuga da Europa. Há fortes movimentos separatistas em outras duas regiões históricas – a Catalunha, em Espanha e Flandres, no norte da Bélgica – defenderam, de forma feroz, o direito à independência política.
Se a lógica da independência dos separatistas escoceses é um sentimento de identidade cultural e filosófica distinta, os catalães e flamengos separatistas fazem-no por questões económicas. A persistente crise acentuou o fosso entre o crescimento rápido e próspero na Flandres e na Catalunha e as economias mais letárgicas de regiões como Valónia e Andaluzia.
Enquanto os separatistas de Flandres perderam terreno nas últimas sondagens, em Espanha, a recusa do governo central em reconhecer o direito à independência da Catalunha exacerbou as tensões entre o governo madrileno e o catalão, em Barcelona, e reforçou a popularidade dos secessionistas.
E quanto a Europa, como um todo? De que forma afectam a União Europeia estes potenciais divórcios nacionais? Será que a família da UE abre alegremente os braços a um 29º Estado-membro, a Escócia, e a um 30º, a Catalunha?
Os secessionistas escoceses e catalães são europeus comprometidos que reclamam a adesão à UE, caso as suas campanhas de independência sejam bem sucedidas. De acordo com a página de internet da campanha “Sim”, “a Escócia já faz parte da UE – por isso não há dúvida de que cumprimos todos os requisitos de estatuto de associado.
Com a nossa energia e os nossos recursos de pesca é claramente senso comum. E, nos interesses da UE, a Escócia continua a ter um lugar”. Mais devagar, responde José Manuel Barroso em Bruxelas. O presidente da Comissão Europeia revelou que uma Escócia independente não herdaria automaticamente a quota de adesão do Reino Unido e que teria de se candidatar a membro.
Parece-lhe um cenário inquietante empurrar a UE em águas desconhecidas, então imagine este: uma Escócia independente candidata à adesão, algures em 2016, e um Reino Unido decidido a retirar-se da União Europeia, algures entre as eleições gerais de 2015 e 2017 – ganha pelos conservadores de Cameron.
Não seria irónico!? Há um velho ditado escocês que diz: “Whit’s fur ye’ll no go by ye!” – O que está para acontecer irá acontecer! Por isso, se tal como Heráclito, está convencido de que a mudança é a única coisa permanente na vida, fique atento! Na Europa, o melhor ainda está para vir!