Carlos Moedas: a inteligência artificial é "uma escolha política"

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A euronews entrevistou o Comissário Europeu para a Ciência, Investigação e Inovação, Carlos Moedas.

Nesta edição de Global Conversation, falámos com o Comissário Europeu para a Ciência, Investigação e Inovação, Carlos Moedas. Engenheiro civil e economista, o político português assumiu o cargo em 2014 sob a direção de Jean-Claude Juncker.

euronews: "Apresentou um orçamento de cem mil milhões de euros para 2021-2027, para gastar nas áreas da ciência, da investigação e da inovação. É muito mais do que os 77 mil milhões atuais. Onde vai gastar a soma suplementar?

Carlos Moedas: "Antes de mais, obrigada pelo convite. É algo único e mostra que a Europa quer investir no futuro. É a primeira vez que temos um aumento desta dimensão em termos absolutos. Vamos chegar aos 100 mil milhões para as áreas da ciência, investigação e inovação. Se pensarmos bem, os países não tem muitas opções. Se querem criar empregos, criar riqueza e pagar bons salários para que as pessoas possam viver bem, é preciso investir mais na ciência e na inovação.

euronews: "Há áreas específicas que quer explorar? Fala-se muito de Inteligência Artificial, por exemplo. É algo em que quer gastar mais?"

Carlos Moedas: "Sim, penso que é preciso diversificar o programa. Uma parte do dinheiro deve ir para a ciência fundamental. Ciência desenvolvida a partir da curiosidade. Trata-se de dar aos cientistas a liberdade para inventar e cruzar as diferentes disciplinas para criar coisas novas. Depois temos desafios globais. Quais são esses desafios? Para mim a inteligência artificial é uma das ferramentas para resolvê-los".

euronews: "Pensa que as pessoas entendem o que essa tecnologia implica para a próxima década?"

Carlos Moedas: "Penso que não, nem aqui, nem nos Estados Unidos ou na China. Estamos no início. Para mim, trata-se mais de uma escolha política do que de uma escolha tecnológica".

euronews: "O que quer dizer?"

Carlos Moedas: "É curioso que as pessoas pensem sempre na Inteligência Artificial como uma tecnologia. Penso que precisamos de escolhas políticas. Uma escolha política é algo muito claro: quero inteligência artificial que me ajude a ser melhor e que aumente a minha inteligência. Não quero que a inteligência artificial me substitua. Se as máquinas nos substituem nas tarefas, os humanos ocupam-se da ligação entre as tarefas. As máquinas não o fazem porque não têm vontade. As máquinas têm a vontade da pessoa que as fabrica. Temos de concentrar-nos na criação de novas profissões diferentes das que temos hoje e que serão essenciais para que as máquinas executem as tarefas. Se temos uma cidade onde há apenas carros autónomos sem condutor, haverá controladores de tráfego porque é preciso controlar o tráfego. Teremos vários tipos de profissões".

euronews: "Falou de escolhas políticas. O orçamento que apresenta esta semana, surge depois do Brexit. São cem mil milhões para 27 Estados-membros. Quem ganha no Brexit em termos de ciência e investigação".

Carlos Moedas: "É uma pergunta difícil porque ninguém ganha com o Brexit. Nós não ganhamos, o Reino Unido não ganha. Todos perdem. Temos de deixar de lado as emoções e fazer o melhor possível".

euronews: "Os cientistas europeus poderão trabalhar com investigadores britânicos?"

Carlos Moedas: "Sim, têm de fazê-lo".

euronews: "Pode garantir que isso acontecerá?"

Carlos Moedas: "Não, não tenho essa garantia. Mas temos a garantia de que as pessoas são mais fortes do que os políticos. Quando vai às universidades britânicas ou às universidades do continente europeu vê que os investigadores não têm fronteiras. As equipas têm pessoas do Reino Unido, da França, de Espanha, de Itália e da Letónia. É algo que os políticos não podem quebrar. A questão é saber quem vai pagar. Adoraria participar na criação de uma solução para juntar a Europa e o Reino Unido num programa científico. Hoje, não posso dar essa garantia, infelizmente. Mas penso que temos de lutar por isso".

euronews: "Vamos falar da atual situação. A Europa tem muitas PME's que participam em programas de investigação supervisionados pela comissão europeia, mas, não temos na Europa empresas como a Amazon, a Google, a Facebook. Não temos empresários como o Elon Musk. Porquê?"

Carlos Moedas: "Penso que às vezes somos muito negativos quando olhamos para a Europa porque somos os líderes na primeira vaga da Internet. O Tim Berners-Lee trabalhou na Suíça. A Nokia e a Siemens são europeias. Na segunda fase, a fase da Uber, do Facebook e do Elon Musk não fomos bem sucedidos e por isso estamos a falar disso, porque é a situação presente. Mas penso que, no futuro, a próxima vaga de inovação terá mais a ver com tecnologia e ciência fundamental. E aí a Europa tem uma nova oportunidade para voltar a liderar. O que temos de fazer, e daí a importância dos cem mil milhões, é centrar-nos no fundamental. A Inteligência Artificial, o Blockchain, a aprendizagem automática são áreas em que somos bons. Se olhar para o número de artigos publicados em ciência fundamental, onde há mais é na Europa. Por isso, não devemos preocupar-nos com o facto de não ter as 'Ubers' e os 'Facebook'. Temos é de pensar no que serão as 'Ubers' do futuro".

euronews: "Tem proposto projetos de grande ambição, como projetos sobre o Reator Termonuclear Experimental Internacional e a fusão nuclear, a cura para o cancro e o Alzheimer. Quais são as suas ambições nessa área. O que é exequível? Os investigadores europeus vão conseguir resolver esses grandes problemas?"

Carlos Moedas: "Penso que é importante criar um laço entre as pessoas e a Europa. Não é apenas ciência, é ciência direcionada para uma missão que as pessoas entendem. Hoje é muito difícil. As pessoas não entendem o que fazemos, no dia-a-dia. A ciência é tão complexa que não vêm o impacto na vida quotidiana. Por isso propomos essas missões que as pessoas podem perceber bem. Por exemplo, a Europa tem de ser a primeira a curar o Alzheimer ou a transformar o cancro numa doença crónica ou a ter o primeiro avião zero carbono. As pessoas entendem isso e aderem ao projeto. Deste modo temos uma ligação. Penso que a Europa perdeu a ligação com as pessoas e a ciência pode ser uma boa ferramenta para restabelecer essa ligação".

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