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Cerca de 30 advogados unem-se para defender criança mutilada numa escola de Viseu

Criança de 9 anos é ataca por colegas de escola
Criança de 9 anos é ataca por colegas de escola Direitos de autor  Criança de 9 anos é ataca por colegas de escola
Direitos de autor Criança de 9 anos é ataca por colegas de escola
De Inês dos Santos Cardoso
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Uma criança de 9 anos, de nacionalidade brasileira, foi atacada por dois colegas numa escola em Viseu, e ficou sem dois dedos. Um grupo de advogados uniu-se para a defender e prestar apoio à família.

São já 27 os advogados que se uniram para defender a criança de nacionalidade brasileira, de 9 anos, que teve dois dedos amputados, após ser agredida por dois colegas na Escola Básica de Fonte Coberta, em Cinfães, no distrito de Viseu.

O grupo de advogados que está a tratar do caso encontra-se dividido por áreas: civil, penal e de assistência psicológica à família do menor. Em entrevista à Euronews, a advogada Ana Paula Filomeno, que está à frente da área civil, revelou que o caso está a ser tratado com "muita cautela" por ser tratar de uma "situação traumática", estando a ser disponibilizado apoio psicológico à criança e à sua família.

O episódio aconteceu na segunda-feira, dia 10 de novembro, mas segundo a mãe da criança, Nivia Estevam, já existiam antecedentes de violência contra o filho por parte de colegas de escola, como "puxões de cabelo, pontapés e enforcamento", lê-se na sua entrevista à revista Crescer, da Globo.

Criança foi trancada na casa de banho e mutilada

No dia 10 de novembro, duas crianças fecharam a porta de casa de banho da escola, entalando e decepando os dedos do filho de Nivia Estevam. Uma vez que este estava preso, não conseguiu pedir ajuda. Neste sentido, "perdeu muito sangue e precisou de se arrastar por baixo da porta com os dedos já amputados", explicou a mãe da vítima.

A criança teve de ser submetida a uma cirurgia de três horas no Hospital de São João, no Porto. Na entrevista à revista Crescer, da Globo, Nivia Estevam revelou que o filho está a tomar comprimidos para dormir, devido às sequelas psicológicas do incidente.

"Ele toma remédios para as dores e antibiótico de 12 em 12 horas. Passa o dia bem porque eu deixo-o mexer no telemóvel e ver televisão, mas quando chega a hora de dormir, ele volta aos acontecimentos do dia 10. Só chora e é preciso medicá-lo para ir dormir", contou Nivia Estevam.

Ana Paula Filomeno, uma das advogadas de defesa do menino, diz que o incidente configura um caso de bullying, mas que, uma vez que a situação ainda está a ser apurada, não é possível concluir se se trata também de xenofobia. Refere que pouco importa a origem do ato, "importa sim que houve danos, que o resultado foi muito mau". "Nós sabemos que é uma coisa que está a acontecer nas escolas em Portugal, não é um caso isolado", acrescenta.

Relativamente a possíveis responsabilizações, à Euronews, Ana Paula Filomeno destaca que o Estado e a escola falharam no que diz respeito à proteção das crianças.

"Quando uma criança não é levada à escola, ela tem faltas. A CPCJ [Comissões de Proteção de Crianças e Jovens] é imediatamente acionada pela escola porque a criança é obrigada a estar naquele ambiente. Não se pode ter um ambiente que não seja seguro, onde se seja obrigado a deixar o filho", esclareceu Ana Paula Filomeno.

A mãe da criança criticou, também, o facto de as funcionárias da escola terem limpo "todo o local do incidente", antes das autoridades chegarem. “A escola está a tratar isto como uma brincadeira que correu mal”, lamentou.

Violência é cada vez mais comum entre crianças mais novas

Mas o que é que leva uma criança a agredir outra e quais são os principais gatilhos? A psicóloga Melanie Tavares explicou à Euronews que "basta haver uma caraterística de vulnerabilidade para que uma criança se torne uma possível vítima de bullying". Neste episódio em específico, pode não estar em causa a nacionalidade da criança, mas sim "o aspeto físico, ou alguma dificuldade que a criança possa apresentar a nível social ou a nível cognitivo".

Melanie Tavares admite que os casos de bullying têm vindo a aumentar em idades cada vez mais precoces, nos últimos anos. O GAAF (Gabinete de Apoio ao Aluno e à Família), serviço especializado que se destina a apoiar alunos, famílias, professores, funcionários e a comunidade, tinha 4620 alunos sinalizados devido a casos de violência no ano letivo 2020/2021, enquanto em 2024/2025 havia 7804, segundo dados fornecidos pelo mesmo. Isto significa que o número de alunos sinalizados em 2024/2025 foi de 11%, face ao total de alunos dos Agrupamentos que dispunham deste gabinete neste ano letivo.

"Os miúdos estão com muita dificuldade em gerir e controlar os impulsos mais agressivos. A agressividade é algo inerente ao nosso desenvolvimento, faz parte da condição humana, é o que nos protege de alguns perigos. Mas quando a agressividade é mal gerida, temos casos de violência, de bullying ou até de comportamentos autolesivos", explica Melanie Tavares.

Recreios das escolas cada vez mais "desumanizados"

A forma como as crianças se sentem na escola e como olham para as autoridades que atuam nas instituições de ensino, nomeadamente os professores e restantes funcionários, também é crucial no seu desenvolvimento. De acordo com a psicóloga Melanie Tavares, a relação que a criança vitimada tem com a escola mudou para sempre, uma vez que este "deveria ser um espaço de segurança", que lhe deixou "sequelas físicas para a vida".

"Aquilo a que assistimos é que os miúdos se sentem mais inseguros no espaço escolar porque efetivamente não lhes são dadas condições para que sintam ali uma segunda casa. Os miúdos têm recreios completamente desumanizados em que depois o recurso são brincadeiras muitas vezes violentas. Se for um recreio com árvores, com terra, os adultos não os deixam ir para lá. Não os deixam brincar, não os deixam explorar a natureza. Mas depois também não os deixam jogar à bola, e eles apenas têm o corpo, são uns contra os outros", defende a psicóloga.

Um dos principais sinais de alerta que indica que uma criança está a ser vítima de bullying na escola é a falta de vontade para brincar, refere Melanie Tavares. A psicóloga diz que também é importante os pais estarem atentos a recusas a ir à escola, a doenças psicossomáticas que aperecem ao domingo à noite ou na segunda-feira de manhã - dores de barriga, vómitos ou até frebre - e a comportamentos mais agitados, que são frequentemente confundidos com hiperatividade. "O fulcral é perceber se o padrão da criança foi alterado. Também é preciso estar atento caso a criança não seja convidada para convívios com os colegas, como festas de aniversário, se não tem amigos ou se não se relaciona com ninguém".

"Se a criança era mais sossegada e, de repente, está mais agitada, ou vice-versa, isso pode ser um sinal de alerta. Alterações no padrão do sono também são um indicador. E depois, obviamente, há os sinais físicos: nódas negras, arranhões, material escolar perdido ou estragado", acrescenta.

Para identificar possíveis crianças agressoras, os pais devem estar atentos às dinâmicas que têm com outras pessoas, isto é, o tipo de relação que tinham e o que passaram a ter. De acordo com Melanie Tavares, "é mais difícil identificar os agressores do que as vítimas".

Escola abriu inquérito para apurar a situação

O Agrupamento de Escolas de Souselo, ao qual pertence a Escola Básica de Fonte Coberta, abriu um inquérito interno para apurar em que situação o aluno perdeu as pontas de dois dedos. O diretor do agrupamento, Carlos Silveira, explicou que "A direção teve conhecimento da situação (ocorrida na segunda-feira) e abriu um inquérito interno para apurar os factos", tendo os seguros sido acionados no dia seguinte, pode ler-se no Público.

Carlos Silveira garantiu que "os socorros foram prontamente chamados" e esclareceu que em Cinfães apenas à GNR, e não PSP. Assim, quando é acionado o INEM (Instituto Nacional de Emergência Médica), se este "considerar que é uma situação grave, automaticamente entra em contacto com as forças de segurança", acrescentou.

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