A economia europeia deverá continuar a crescer no próximo ano, mas, a robotização pode por em causa empregos e salários.
A União Europeia e a zona Euro cresceram, no ano passado, ao ritmo mais rápido da última década. A tendência deverá manter-se este ano e no próximo. Será que a retoma veio para ficar?
O PIB é apenas um indicador. Será que todos os cidadãos da União Europeia vão tirar partido desse crescimento? Reunimos alguns elementos que nos poderão ajudar a prever o futuro da economia europeia.
Em primeiro lugar, vamos conhecer a análise da Comissão Europeia. De acordo com Bruxelas, o PIB vai continuar a aumentar no próximo ano. A confiança dos consumidores e das empresas cresce à medida que o PIB aumenta. A inflação global, que inclui o preço da energia e dos alimentos, deverá aumentar, mas, a inflação subjacente, que não inclui esses produtos, deverá manter-se baixa. O consumo deverá continuar a estimular o crescimento em 2018, favorecendo a indústria no conjunto dos setores e países.
O acesso ao crédito deverá ajudar as empresas, favorecendo o aumento do investimento. As empresas poderão exportar mais no mundo inteiro, apesar de o Euro permanecer forte, o que poderá levar, em teoria, ao crescimento do emprego. Em 2018, a riqueza deverá aumentar em todos os países da União Europeia. No entanto, há fatores de risco: o Brexit, as tensões geopolíticas e as mudanças na regulação do setor financeiro, entre 2018 e 2019.
Este resumo fornece uma visão da economia. Vamos conhecer outro ponto de vista, o de Angel Gurria, secretário-geral da OCDE, em Paris.
euronews: "Lançámos-lhe um desafio: trazer um ou dois objetos que simbolizem os desafios do crescimento económico na Europa. Pode explicar-nos o que significam?"
Angel Gurria: "É fácil subestimar a Europa mas é necessário olhar para o que está debaixo do andaime. Uma pessoa poupa dinheiro durante três anos para ir à Europa visitar a catedral de Notre Dame em Paris, o Duomo de Milão ou a catedral de Colónia e, quando chega, as catedrais estão cobertas de andaimes. Mas, quando regressa, três anos depois, as obras terminaram. É essa a visão da Europa que se reinventa e reforça em permanência, sempre a trabalhar de capacete e espátula na mão".
O caso irlandês
Em Dublin por todo o lado há gruas. Uma paisagem bem diferente da dos anos desoladores da crise financeira importada dos Estados Unidos em 2008. O setor da construção está em alta.
"No pico, a construção representou 25% do PIB. Quando estávamos em queda esse valor desceu até aos 3%. Atualmente estamos nos 6 ou 7%. Mas os economistas acreditam que deveríamos estar nos 12 ou 15%, por isso, ainda há um caminho a percorrer para atingir um nível sustentável", considerou Frank Kelly, vice-presidente da Federação da Indústria da Construção.
Na Irlanda, a retoma faz-se sentir ao nível das exportações, que bateram recordes no ano passado, e ao nível do consumo. O desemprego baixou para os níveis anteriores à crise. Para o setor da construção, o papel do setor público é fundamental.
"Reconhece-se que é importante haver um equilíbrio entre o desenvolvimento do setor privado e o setor público. As infraestruturas são absolutamente necessárias para sustentar tudo o resto", acrescentou Frank Kelly.
A Irlanda serve frequentemente de exemplo para outros países, mas, a economia irlandesa possui algumas especificidades que a tornam incomparável.
"Os números relativos ao crescimento da Irlanda são distorcidos pela presença de grandes multinacionais que se instalaram no país por motivos fiscais. Mas, mesmo subtraindo o valor dos contratos industriais que as multinacionais realizam fora do país, a taxa de crescimento do PIB irlandês é o dobro da média europeia", sublinhou Giovanni Magi, repórter da euronews.
A Irlanda enfrenta agora um novo desafio: o Brexit.
"Estamos perante o desconhecido com o Brexit, que é a maior fonte de incerteza e risco para a Irlanda. Se houver uma versão dura do Brexit, as consequências económica serão mais negativas. Mas, mesmo tendo em conta o impacto do Brexit no médio e no longo prazo, a economia irlandesa deverá continuar a crescer", afirmou Simon Barry, economista do Ulster Bank, na Irlanda.
O futuro do trabalho face à robotização
Menos certo é o futuro do trabalho. A robotização pode por em causa empregos e aumentos salariais. A visão de Angel Gurria, secretário-geral da OCDE, em Paris:
euronews: "No médio prazo, não se vê crescimento dos salários devido ao efeito da inflação. É um problema que se vai colocar?"
Angel Gurria: "A questão dos salários tem sido um problema no Japão, nos Estados Unidos, no México e na Europa. Porque a tecnologia vai sempre contra a criação de empregos. E porque as empresas tentam criar um clima favorável aos negócios quando há mão-de-obra qualificada que se adequa a essa procura. Nos próximos dez a quinze anos, entre 10 a 14% dos trabalhadores poderão ser obrigados a mudar de trabalho e 30% serão confrontados com alterações na forma como trabalham no dia-a-dia".
euronews: "Estamos a ver o surgimento de guerras comerciais. Considera que é um risco? A Europa deve depender mais da procura interna?"
Angel Gurria: "As guerras são sempre más. É preciso um diálogo para resolver os problemas, senão só trataremos dos sintomas e não da causa. A cada ano ou a cada dois anos seremos obrigados a lidar com a mesma coisa senão resolveremos os problemas. A Europa não enfrenta uma guerra comercial, neste preciso momento e esperemos que isso não aconteça. Mas a questão é como planear o futuro".
euronews: "Como pode a Europa fazê-lo se um dos estados membros mais importantes se vai embora? Quais são os maiores riscos? O Brexit, a relação com os Estados Unidos ou as duas coisas?"
Angel Gurria: "A relação com os Estados Unidos é fundamental porque eles são um cliente importante. O Brexit é um fator disruptivo. O Reino Unido será sempre um parceiro comercial importante para a Europa e a economia europeia vai continuar a ser importante. Perdemos uma década a lutar pela retoma económica e ainda sentimos os efeitos da crise, como o aumento das desigualdades e a queda da confiança nos governos e nas instituições".