Newsletter Boletim informativo Events Eventos Podcasts Vídeos Africanews
Loader
Encontra-nos

Alice Oliveira, porta-voz das prostitutas do Ceará: "Quem vai ganhar com a Copa não é o brasileiro"

Alice Oliveira, porta-voz das prostitutas do Ceará: "Quem vai ganhar com a Copa não é o brasileiro"
Direitos de autor 
De Euronews
Publicado a
Partilhe esta notícia Comentários
Partilhe esta notícia Close Button

Alice Oliveira é a porta-voz da Associação dos Trabalhadores do Sexo da Região do Ceará, no nordeste do Brasil. Em conversa com a nossa repórter, ela fala do impacto do Mundial de Futebol na vida dos brasileiros e acusa a FIFA de ser a única vencedora da Copa. Uma FIFA que, inclusive, muda até as leis do país.

Alice Oliveira (transcrição integral em Português Brasileiro): Quem vai ganhar com a Copa não é o brasileiro! Não é! Ah… porque o estádio vai ficar, porque as ruas vão ficar… Mas isso teria de ficar de qualquer jeito! A mobilidade do Brasil tem de ser desenvolvida, independentemente de ter Copa ou não ter Copa. A questão do turismo também tem de ser, porque é uma das vias do Brasil, que tem lugares belíssimos e que tem de se investir no turismo. Porque há uma indústria.

Agora o que não se pode permitir é que saia um avião lá da Europa, lotado de homens, para vir para cá, simplesmente com um único foco: não é conhecer as praias, não é conhecer o Sertão; conhecer as serras que o Ceará, aqui, tem, ou qualquer outro local do Brasil. É para conhecer as mulheres!

Eles saem de lá já com os livros – os “books” – onde escolheram as meninas com quem vão ficar! Há um mercado muito grande, sim. Pessoas ganhando muita grana, sim. Agora, não são pessoas que estão a um nível mais baixo. São pessoas muito poderosas, para manter esse esquema. E aí, como é que você desmonta esse esquema?! Você não consegue desmontar. Então, essas pessoas estão ganhando.

Mas a população brasileira não está ganhando. Quem está ganhando é a FIFA. Esta é a Copa da FIFA. A propagando, inclusive, diz isso: a Copa da FIFA. Então é da FIFA, é a FIFA que vai ganhar; são os empresários que vão ganhar. São os empresários do futebol que estão ganhando.

Existe uma cultura aqui no Brasil… Por exemplo: vai ter um grande ‘show’, um grande evento, alguma coisa, e as pessoas que estão no trabalho informal, que têm os carrinhos delas, montam atrás como se fosse um pequeno restaurantezinho – ali vende cachorro quente, vende sanduíche… Aqui, na beira-mar, se você passar à noite, está lotado disso. E está toda o mundo se preparando: ‘a Copa vem, vou poder colocar’! Mas há uma lei que diz que não pode ficar, que só pode fazer alguma coisa a – se não me engano – dois ou três quilômetros do estádio.

E aqui, sem ser Copa, você encontra, naquelas áreas… o torcedor está chegando para ver um jogo, está com fome e passa ali e compra um cachorro quente quase na porta do estádio.

Mas este tipo de trabalho, não vai ter! Quem queria estar se preparando – comprando suas bebidas, comprando as coisas antecipadamente -, pensando na Copa, se fizer isso ainda corre o risco de ser preso.

E aí, que benefício é que nós temos?! Por exemplo, se [o dono de] um bar qualquer aqui da beira-mar quiser reunir aqueles clientes que são ‘habitués’ daquele local e pôr um telão para passar o jogo, ele corre o risco de ser preso. Ele só pode fazer isso se pagar alguma coisa para a dona, a FIFA. Quem ganha?!

Todos os investimentos que estão sendo feitos, o Brasil não precisaria ter estádios da maneira que estão sendo colocados hoje, por conta da Copa, se fosse um processo normal. Se fosse um processo normal, não precisaria ter. O Castelão funcionava muito bem. Poderíamos fazer algumas reformas: recentemente tinha passado por uma reforma! Claro que, para a chegada da Copa, precisava.

Nós já tivemos a experiência do que foi a Copa das Confederações. E as pessoas já conseguiram perceber que ninguém, o público, a população cearense, por exemplo, que queria, que achava que podia ganhar alguma coisa, se beneficiar não pode!

Os táxis: algum táxi vai poder ficar próximo?! Não pode, não! São táxis credenciados [que vão poder]. Tem todo um esquema montado. Para você pegar um credenciamento, você tem de pagar uma pipa de grana.

Quem é que vai ganhar nisso tudo? Com certeza não é o povo brasileiro! Com certeza, não é! É lamentável.

Essa discussão toda deveria ter sido feita e aprofundada quando se pensou que se pudesse concorrer à vinda da Copa. ‘Vamos ver, se é possível, se não é…’ A comunidade toda, participar…

Estão aí, as manifestações todas contra a vinda da Copa. E as coisas vão complicar-se. Vamos ter muitas prisões, vamos ter mortes, pessoas feridas… porque as manifestações vão acontecer. E a polícia está se preparando para uma guerra. Claramente é isso: está se preparando para uma guerra!

Tem uma manifestação estudantil como teve ontem à noite e a polícia de choque estava toda montada, encurralando os estudantes que queriam a questão do ‘passe livre’ – que ‘e um direito.

O país tem uma Constituição, mas no período da Copa a Constituição está no lixo! Ela está no lixo! O que vale é a constituição-FIFA. A FIFA mudou leis! Tem uma semana que foi aprovada uma lei que para qualquer turista, qualquer estrangeiro, ele não precisa passar pelo consulado, não precisa passar por lado nenhum: vai na internet, preenche na internet toda a documentação e ele entra no país! Cadê o controle?! Onde que está?! Quem é essa pessoa que está vindo?! Ou seja, perdemos todas as leis, perdemos respeito por nós mesmos. Em função do quê?!

Sabe? Para mim, a Copa não é legado deixar um estádio, deixar a famosa mobilidade… Isso é obrigação do governo! O governo tem que dar mobilidade, tem que dar estrutura, tem que dar todas as condições para todos os brasileiros poderem se sentir bem no seu próprio país. E para quem vem de fora – que será sempre muito bem-vindo – respeitar o que está aqui dentro. Acho que isso é fundamental. E não fazer como está se fazendo: o governo rasgou todas as suas leis e pôs dentro do saco do lixo. Então eu não vejo ganho nisso. Nem um pouco!

Ir para os atalhos de acessibilidade
Partilhe esta notícia Comentários

Notícias relacionadas

França depois dos atentados de 2015

A questão central das eleições alemãs é a transição energética

Certificação do queijo halloumi suscita controvérsia entre UE, cipriotas gregos e turcos