Futuro da Commonwealth ameaçado pela passado negro da monarquia

Commonwealth entre um passado negro e um futuro menos britânico
Commonwealth entre um passado negro e um futuro menos britânico Direitos de autor Andrew Matthews/PA
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Organização de 56 países representa mais de 2 500 milhões de pessoas e Carlos III tem a difícil tarefa de cortar com o passado

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Quando Carlos III se tornou rei do Reino Unido, assumiu também a liderança da Commonwealth. O cargo não é hereditário, mas os chefes de Estado e Governo da organização já o tinham designado como sucessor durante a cimeira de Londres, em 2018, acedendo a um pedido da rainha Isabel II.

Após a subida ao trono, Carlos III tornou-se no terceiro líder da organização desde a sua criação, em 1949, após Jorge VI e Isabel II. A função é largamente simbólica e cabe ao soberano representar os 56 países que pertencem atualmente à Commonwealth. A representação do Reino Unido fica a cargo do primeiro-ministro britânico.

Apesar da limitada esfera de ação, o desafio não deixa de ser enorme para Carlos III, como destaca o historiador Martin Farr:

“_Uma das questões centrais na monarquia britânica nos últimos 30, 40 anos era saber se o apoio que tinha, quer no Reino Unido, quer a nível internacional, se devia pessoalmente à Rainha Isabel II ou à instituição. Existiam receios que quando o reinado acabasse, se registasse um renascimento do republicanismo._”

A tendência começou além-fronteiras, ainda com Isabel II no trono. A 30 de novembro de 2021,Barbados tornou-se oficialmente uma República e Sandra Mason tornou-se na primeira Presidente na história do país, independente desde 1966. Também aqui a mudança teve lugar a 30 de novembro.

A transição de uma monarquia constitucional para uma república não beliscou o estatuto de Barbados na Commonwealth, que manteve o seu lugar entre os 56 países que pertencem à organização. Reduziu no entanto para 14 o número de países que mantêm o soberano do Reino Unido como chefe de Estado. Martin Farr acredita que esse número vai continuar a baixar:

“_É inevitável uma diminuição dramática desse número. Em breve a Austrália irá realizar um segundo referendo, a Nova Zelândia também irá submeter a questão a referendo. No Canadá há menos pressão para isso acontecer mas suspeito que países como a Jamaica se tornem uma república em breve. É inevitável que os países se tornem repúblicas, continuando a fazer parte da Commonwealth._”

O império contra-ataca

A família da Commonwealth cresceu em 2022 com a entrada de Togo e Gabão, duas antigas colónias francesas. São agora quatro os países na organização sem qualquer ligação histórica ao império britânico. Moçambique (o primeiro a entrar, em 1995) e Ruanda são os restantes. Outros aguardam a sua oportunidade.

Martin Farr considera que o futuro da organização depende da sua capacidade para se tornar numa “_associação livre de países, alguns com ligações históricas, outros não_” e para cortar as amarras com o passado colonial.

Lembra que ainda existe hostilidade para com o Reino Unido em alguns países mas que a Commonwealth não deixa de ser uma “_excelente ferramenta de “soft power” para Londres, no sentido de promover os valores britânicos e atrair visitantes para o Reino Unido_”.

Nesse aspeto em particular, Martin Farr afirma que a rainha Isabel II foi o maior trunfo que o país alguma vez teve em termos de “soft power” e que Carlos III terá muitas dificuldades para ter o mesmo impacto, não só porque tem menos tempo mas também porque há muito trabalho pela frente na sequência do Brexit.

Ironicamente, Martin Farr sublinha que quanto mais pronunciado for o papel do Rei na liderança da Commonwealth, maior será a dificuldade para separar a instituição do seu passado, limitando desta forma o seu crescimento.

O Rei com opinião

O passado negro da monarquia britânica pode assombrar o futuro da Commonwealth mas nem por isso Carlos III parece disposto a condená-lo ao esquecimento. Antes pelo contrário.

Antes de assumir o trono, manifestou-se contra “_o período mais doloroso na história do país_” e lamentou-se profundamente pelo “_sofrimento de tantas pessoas_” em referência ao passado esclavagista do império britânico. Foi na cimeira da Commonwealth de 2022, no Ruanda, em que disse ainda que tinha chegado o momento de ter esta conversa.

Agora Carlos III é Rei e manda a tradição que o monarca britânico não tenha opinião nem se envolva em assuntos públicos. Para Martin Farr, o problema é que as opiniões de Carlos III são bem conhecidas uma vez que nos 50 anos em que preparou para assumir o trono, “_como não tinha responsabilidades reais, tornou-se num ativista_”.

Por enquanto o Reino Unido ainda não efetuou qualquer pedido de desculpa pelo papel desempenhado na escravatura, mas a porta está aberta. As posições do Rei são bem conhecidas e Buckingham já prometeu investigar o envolvimento da casa real britânica no tráfico de escravos.

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