Com o passar do tempo, o sonho de Sarah, que já deveria estar no segundo ano da universidade, transformou-se num pensamento fugaz. Agora, só quer sobreviver com a família ao próximo bombardeamento.
Há dois anos, Sarah não sabia que um dia estaria sentada numa tenda em Khan Younis, no chão, longe da sua casa, da sua biblioteca e da sua vida que agora é história. Olha para os manuais escolares: o sonho de entrar na faculdade de medicina está agora fora de alcance.
A jovem, que era a melhor da turma na escola primária e preparatória, está como centenas de milhares de estudantes que foram deslocados pela guerra na Faixa de Gaza. Esta é a sexta vez que Sarah e a família se deslocam para escapar aos bombardeamentos e, à medida que o tempo passa, tudo o que tem atrás de si se torna mais distante: a sua casa de cinco andares destruída por um ataque aéreo israelita no ano passado, os seus cadernos, as suas canetas. "Não resta nada", diz.
Explica que estava a preparar-se para os exames do liceu, que teriam sido um ponto de viragem na sua vida, quando a guerra em Gaza rebentou, destruindo toda a segurança e estabilidade necessárias para completar a sua educação, sem salas de aula seguras, sem transportes e sem instituições viáveis.
Com o passar do tempo, os seus desejos - deveria estar no segundo ano da universidade - transformaram-se num pensamento fugaz. O máximo que pode esperar é que ela e a sua família sobrevivam aos bombardeamentos que os rodeiam, diz.
Em setembro, Sarah fará 19 anos e o seu destino, tal como o de centenas de milhares de estudantes palestinianos, dependerá do sucesso ou fracasso das negociações entre Telavive e o Hamas.
De acordo com o Fundo das Nações Unidas para a Infância (UNICEF), mais de 92% das escolas de Gaza foram total ou parcialmente destruídas pela guerra, com um relatório recente a indicar que 87% dessas escolas necessitam de uma reconstrução significativa antes de poderem voltar a funcionar.
Cerca de 658.000 estudantes foram privados do ensino regular pelo segundo ano letivo consecutivo, incluindo 39.000 estudantes que não puderam fazer os exames durante dois anos consecutivos.
Esta é a primeira vez em décadas que os estudantes do ensino secundário em Gaza são impedidos de fazer os exames Tawjihi - equivalentes aos exames nacionais em Portugal - segundo a UNICEF, que sublinhou que a grande maioria destes estudantes, tal como Sarah, estão deslocados e a travar uma batalha diária pela sobrevivência.
O Ministério da Educação palestiniano, em cooperação com a UNICEF e outras organizações de ajuda humanitária, está a tentar proporcionar algum tipo de educação às crianças através da criação de centenas de espaços educativos temporários, especialmente nos campos de deslocados e nas escolas que foram transformadas em abrigos, disse Mohammed al-Asouli, chefe do departamento de educação em Khan Younis.
O número de espaços educativos aumentou para mais de 600 durante as seis semanas de trégua, entre janeiro e fevereiro deste ano, proporcionando alguma forma de educação a cerca de 173.000 crianças.
Mas mais de 240 espaços educativos foram posteriormente encerrados depois de Israel ter retomado a guerra em março, privando milhares de crianças de uma educação.