Os quatro portugueses que estiveram detidos em Israel chegaram a território português e foram recebidos por uma multidão no aeroporto de Lisboa. Todos relatam abusos, “muitos”, que segundo Mariana Mortágua dão “uma ideia do grau de impunidade das forças israelitas contra palestinianos”.
Partiram como ativistas e chegaram como heróis: Mariana Mortágua, Sofia Aparício, Miguel Duarte e Diogo Chaves regressaram na noite de domingo a solo português. Após quatro dias em cativeiro, foram recebidos no aeroporto de Lisboa por uma multidão em êxtase, que entoava frases e cânticos pró-palestina.
Nas primeiras palavras em Portugal, arrancadas a ferro tal era a dificuldade em chegar até aos portugueses, embrulhados num cordão de segurança da polícia e a multidão, relataram os abusos sofridos em solo israelita.
Privados de água e comida durante várias horas, alguma violência e ainda jaulas ao sol, foi assim que os portugueses descreveram o período em que estiveram sob custódia de Israel. Mariana Mortágua afirmou que a experiência reflete uma realidade eufemizada do que é o dia a dia de um palestiniano numa prisão israelita.
“Uma coisa que foi muito presente em todos nós é que percebemos, naquela prisão, a diferença entre ser europeu e ser palestiniano. Por muito que tenha sido difícil para nós, e foi, e por muito que tenha havido abusos, e houve, muitos, isso deu-nos uma ideia do grau de impunidade das forças israelitas contra palestinianos”, explicou a deputada do Bloco de Esquerda.
"Todos nós temos experiências muito semelhantes nesta detenção na prisão israelita. Temos experiência em ver camaradas a serem espancados e levados (...). Tivemos experiências de várias horas algemados e de sermos provocados por um ministro israelita", relatou Mariana Mortágua. “Se eles nos fazem isto a nós, imaginem o que eles não fazem a prisioneiros palestinianos”, reforçou.
Assinaturas falsificadas, jaulas ao sol e "camaradas espancados"
Os relatos de episódios de abusos durante o tempo de detenção são comuns: “Todos nós passámos fome e sede, fomos algemados e vendados” explicou Miguel Duarte à comunicação social, reforçando que passaram os dias em "celas sobrelotadas".
"Temos camaradas com diabetes que ficaram três dias sem receber insulina, fomos postos em jaulas ao sol durante muito tempo", explicou ainda.
Já a atriz Sofia Aparício denunciou os episódios em que tentaram obter assinaturas em documentos "escritos em hebraico". Segundo os ativistas, essa documentação descrevia que as detenções teriam sido feitas de forma legal, um cenário corroborado pelo ativista Miguel Duarte.
"Os documentos diziam que nós aceitávamos que Israel tinha-nos capturado legalmente e trazido para Israel de forma legal", explicou. "Recusámo-nos a assinar e vimos um soldado israelita com os nossos passaportes a falsificar as nossas assinaturas para mostrar que nós aceitámos ser intercetados legalmente".
"Não somos heróis"
A detenção dos ativistas da flotilha humanitária gerou uma onda de apoio global, com protestos a favor da causa palestiniana a decorrerem em várias cidades do mundo. A receção no aeroporto de Lisboa - onde estiveram, nomeadamente, Francisco Louçã e a eurodeputada Catarina Martins, antigos líderes do Bloco de Esquerda, foi mais uma demonstração de apoio aos que as pessoas ali reunidas apelidaram de heróis.
Um título que Mariana Mortágua recusa.
"Não somos heróis, estamos a fazer o que os nossos governos não estão a fazer", afirmou a deputada.
"Isto não é sobre nós. A nossa crítica não é o apoio consular que foi dado aos cidadãos portugueses que estavam na prisão israelita. (…) A nossa crítica é ao Governo português que não aplica sanções a Israel", acrescentou.
Sobre a receção, Mariana Mortágua agradeceu, terminando com as palavras que, globalmente, motivaram o protesto: "Palestina Livre".
"Não sabíamos que receção teríamos e queremos agradecer-vos e dizer que estamos juntos e vamos continuar esta mobilização. Palestina livre”, disse Mortágua.