O executivo de Luís Montenegro justifica que há "falta de condições jurídicas, materiais e organizacionais para a execução rápida e eficaz de afastamentos coercivos em Portugal" e pede consenso parlamentar para o país alcançar uma política de imigração regulada.
Os migrantes marroquinos intercetados em agosto no Algarve foram libertados, por ter sido ultrapassado o prazo máximo de detenção, ainda que o processo de afastamento se mantenha em curso.
De acordo com o comunicado conjunto dos ministérios da Presidência e da Administração Interna, 37 dos 38 cidadãos marroquinos que entraram ilegalmente em Portugal, em 8 de agosto, foram libertados dos Centros de Instalação Temporária (CIT) em que se encontravam.
A lei portuguesa estabelece um prazo máximo de detenção em CIT de 60 dias e, findo esse prazo, o Estado é obrigado a libertar as pessoas, ainda que o processo de afastamento se mantenha em curso, esclarece a mesma nota.
"Neste período, dois dos cidadãos aceitaram o abandono voluntário, sendo que um deles desistiu antes da respetiva concretização. Os demais cidadãos têm recorrido a expedientes dilatórios previstos na lei vigente, com o fim de protelar o seu afastamento coercivo", frisa o Governo.
"Para o efeito, apresentaram pedidos de asilo ou proteção internacional, recursos judiciais com efeitos suspensivos e não apresentaram documentação (o que dificulta a aceitação do retorno no país de origem)", acrescenta.
O Governo sublinha que as autoridades judiciais e administrativas, PSP e Agência para a Integração, Migrações e Asilo (AIMA), atuaram "com a celeridade possível, mas dentro das limitações impostas pela lei vigente, incluindo na detenção e no indeferimento dos pedidos de asilo".
A AIMA terá aberto os processos de afastamento de território nacional "nos dias imediatamente seguintes à apresentação ao juiz e indeferiu os pedidos de asilo em menos de 7 dias".
Na altura, o tribunal decidiu que os cidadãos marroquinos que desembarcaram no Algarve tinham de abandonar o país, mas que até lá ficariam sob custódia das autoridades num pavilhão multiusos em Sagres.
O executivo salienta ainda, na nota de imprensa, que tem alertado no último ano para "a falta objetiva de condições jurídicas, materiais e organizacionais para a execução rápida e eficaz de afastamentos coercivos em Portugal". E atira assim culpas para os "maiores partidos da oposição", apontando que a sua "conivência no Parlamento", nas votações no final de 2024, "atrasou seriamente a resolução deste problema".
Em concreto, o Governo identifica três "estrangulamentos à celeridade do afastamento", começando pela extinção do SEF (Serviço de Estrangeiros e Fronteiras), que fez com que a tarefa de retorno ficasse atribuída à AIMA, a ausência de capacidade nos CIT, e ainda o facto de o regime jurídico de retorno vigente "induzir e permitir grandes demoras no processo, com prazos demasiado longos, duplicação de fases processuais e com recursos administrativos e judiciais que podem ser utilizados de forma dilatória".
Os ministérios sublinham também que têm atuado para resolver os estrangulamentos, apontando como exemplo a transferência da competência de retorno da AIMA para a UNEF da PSP, isto apesar de "a primeira tentativa legislativa do Governo para acelerar o regime do afastamento de imigrantes ilegais foi também chumbada pelo Parlamento no final de 2024, de novo, com votos dos dois maiores partidos da oposição".
"Como o Governo vem apelando, é fundamental que nesta nova oportunidade os partidos assumam outra responsabilidade e contribuam para os consensos parlamentares suficientes para que Portugal tenha uma política de imigração regulada, também no domínio do afastamento de imigrantes em situação ilegal", lê-se no comunicado.
Na mesma nota são ainda deixadas críticas à anterior gestão socialista: "A incapacidade de realizar afastamentos coercivos com celeridade e eficácia, e os incentivos incorretos ao recurso a expedientes dilatórios e uso inapropriado do regime de asilo, são mais dois exemplos graves da pesada herança de oito anos de uma política de imigração desregulada".
Ventura diz que libertação de marroquinos "envergonha o país"
Em reação a este desfecho, o líder do Chega considerou que a libertação dos migrantes marroquinos intercetados em agosto no Algarve "envergonha o país" e alertou para eventuais riscos de segurança.
"Já não bastava os prazos terem sido ultrapassados, como a Segurança Social está-lhes a pagar a pensão para ficarem e a alimentação que têm", condenou, afirmando que "isto não dignifica o país" e que é "uma abertura ao crime e à desorganização".
"O que temos agora é estes indivíduos que sinceramente não fazemos ideia de quem são, acabaram de ser postos em liberdade, podem andar por Portugal, por Espanha, por Itália, por onde forem. Isto é um risco de segurança para nós, é um risco de segurança para a Europa, a Europa olha para nós como se fôssemos verdadeiramente tontos em matéria de imigração, e isto é um risco significativo", sublinhou.
O líder do Chega defendeu a necessidade de garantir a expulsão de estrangeiros que cheguem ao país de forma irregular, bem como alterações à "lei do asilo, que não pode ficar dependente de recursos destas pessoas que abusam dos recursos simplesmente para beneficiar da Segurança Social".
"O Governo só não resolveu este assunto porque não quis. O PS não quis resolver este assunto, mas era uma opção política; este Governo não quis resolver por ineficácia e inoperacionalidade", criticou, acrescentando que há condições no Parlamento "para resolver isto".