Catalunha independente: sonho ou realidade?

Catalunha independente: sonho ou realidade?
De  Euronews
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Numa altura em que um vento de separatismo sopra na Europa, o debate sobre a independência está ao rubro na Catalunha. A 25 de novembro há eleições antecipadas e o presidente do governo regional, Artur Mas, promete referendar a independência da região em caso de vitória.

O sentimento independentista levou um milhão e meio de pessoas para as ruas de Barcelona em setembro. O debate sobre a autodeterminação ganhou fôlego após a recusa do primeiro-ministro espanhol em renegociar o regime fiscal entre a Catalunha e o Estado central.

A crise exacerbou os nacionalismos e as iniciativas separatistas ganharam protagonismo. Sant Pere de Torelló foi o primeiro município da região a declarar-se “território catalão livre”, no início de setembro.

Jordi Fabrega Colome, alcaide de Sant Pere de Torelló, diz que o fenómeno se está a alastrar: “Neste momento, há 180 municípios na Catalunha que têm a bandeira independentista sempre hasteada nas varandas.”

A Catalunha é a comunidade autónoma mais endividada da Espanha. Os separatistas reclamam autonomia fiscal e denunciam o peso dos impostos pagos ao Estado central.

Jordi Fabrega Colome denuncia: “Estamos numa situação de emergência nacional, com uma taxa de desemprego de 22,5 por cento da população. Na Catalunha, pagamos todos os anos ao Estado espanhol 16 mil milhões de euros que nunca se traduzem em investimento na Catalunha. No entanto, face a esta situação, acreditamos que temos de fazer pressão sobre o Governo espanhol.”

O caminho para a independência da Catalunha passa por um referendo, que só poderia ser feito com autorização de Madrid. No entanto, o primeiro-ministro Mariano Rajoy já declarou a iniciativa como inconstitucional.

Mesmo assim, se for reeleito presidente do governo regional, Artur Mas garante que vai levar a cabo uma “consulta popular” para que os catalães digam se querem ou não continuar a fazer parte de Espanha.

Um cenário que implicaria mudanças na Constituição, relembra Francesc de Carreras Serra, professor de Direito Constitucional. Por outro lado, haverá muito trabalho pela frente, avisa o professor. “Se a Catalunha se tornar independente, naturalmente será um Estado fora da União Europeia e terá de pedir a entrada na União Europeia. Se for aceite e se não houver oposição nem mesmo de um único país, todo o processo vai ser longo.”

Oriol Amat, professor de economia na Universidade Pompeu Fabra, em Barcelona, considera que se não houver um veto da Espanha, não será difícil para a Catalunha seduzir a União Europeia. “Não imagino que a União Europeia queira excluir uma região que tem dinheiro e que é muito europeísta. No passado, a União Europeia investiu muito na Catalunha.”

A questão preocupa os empresários que temem os efeitos de uma eventual saída do euro e a degradação das relações comerciais com Espanha.
Alguns grupos já ameaçaram sair de Barcelona se a Catalunha for independente. Todavia, nenhum dos diretores dessas empresas aceitou falar com a euronews sobre o tema.

Apenas Javier Baratech, diretor de uma editora de pequena dimensão, decidiu revelar-nos os seus receios em relação à independência. “Mais ou menos 80 por cento da faturação da empresa corresponde a vendas feitas ao resto de Espanha. Poderíamos perder todos estes clientes, o que levaria ao encerramento da empresa”, afirma. “Além disso, estando fora de Espanha e da União Europeia haveria taxas aduaneiras. Falei com alguns clientes que me disseram que caso a Catalunha se torne independente, procurariam outros fornecedores que fossem do próprio país”, conclui.

Um nacionalismo económico que não assusta uma pequena estamparia que ganha com a vaga independentista. A bandeira catalã é o produto mais vendido, revela a gerente Laura Fenoy. “Houve um grande aumento. Todos os anos temos stocks de bandeiras, mas este ano houve um recorde. Há pessoas que fazem fila diante da empresa para comprar uma bandeira”, descreve.

Apesar das incertezas políticas, a imagem de marca da região não parece afetada. A Catalunha continua a ser o principal destino turístico de Espanha, com Barcelona no topo das preferências.

Marian Muro i Ollé, responsável pela pasta do turismo na Catalunha, explica: “Nestes primeiros meses do ano, os dados que temos são satisfatórios, com um aumento do turismo internacional de 11,4 por cento, mas o que é mais importante é o aumento dos gastos de turistas.
Em relação aos investimentos estrangeiros, a direção geral do turismo tem vários projetos. Nenhum dos investidores mostrou qualquer tipo de preocupação nem deu sinais de que as questões políticas possam travar ou paralisar estes projetos porque negócios são negócios.”

Apesar das receitas do turismo, o cenário económico da Catalunha não é animador. A região tem uma dívida que supera os 40 mil milhões de euros e uma taxa de desemprego de 22,5 por cento. A independência política faz temer o afastamento dos investidores, por um lado, e o boicote comercial de outras regiões de Espanha, por outro.

O economista Oriol Amat prefere ver o lado positivo: “A pergunta que se deve fazer é: um estado com 7 milhões e meio de habitantes – que é o número de habitantes na Catalunha – pode ser viável? Se olharmos para os 20 países mais competitivos do mundo, há 14 que têm menos de 7 milhões e meio de habitantes.”

Ainda que os empresários estimem que o regime fiscal prejudica a competitividade da região, as opiniões não são tão unânimes quanto às vantagens da independência.

As energias deviam concentrar-se na luta contra a crise, considera o economista Salvador Guillermo Vineta. “Com ou sem independência, os problemas de financiamento e os problemas de maior pressão fiscal vão manter-se. É nisto que nos vamos concentrar e é nisto que queremos ajudar a classe política para tirar o país da crise.”

Há empresários que se anteciparam ao cenário da autodeterminação e a um eventual boicote da parte dos comerciantes espanhóis. É o caso de Xavier, produtor de cava, o vinho espumante catalão. Ele limita-se a vender na região e fora de Espanha.

“Se nos separássemos da Espanha”, diz Xavier, “seria como um desafio: se corresse bem, poderíamos continuar; se houvesse problemas, a culpa seria nossa e não de Madrid”. Além disso, deixa um conselho. “Para ultrapassar os momentos difíceis, recomendo um copo de cava porque anima e ajuda a ver a vida com filosofia e com alegria e, de certeza, que vamos sair desta situação problemática que agora temos de aguentar.”

A independência não agita apenas as terras espanholas. A Escócia conseguiu negociar um referendo com o primeiro-ministro britânico para 2014. Ventos separatistas que despertam receios de uma implosão política da União Europeia.

O professor Francesc de Carreras Serra avisa: “Do ponto de vista da União Europeia, a independência seria prejudicial porque a Catalunha passaria a ser um exemplo a imitar para outras minorias nacionais e provocaria a divisão de uma comunidade que já está demasiado dividida.”

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