Os membros do Parlamento Europeu (PE) tiveram, terça-feira, um aceso debate sobre o controverso acordo entre a UE e a Tunísia, na sessão plenária, em Estrasburgo.
Durante um debate acalorado, eurodeputados de todas as bancadas afirmaram que o número de migrantes que entram na Europa a partir deste país do Norte de África aumentou desde que o acordo foi assinado, em julho.
"O acordo apenas conduziu a mais repressão, mais mortes e ainda mais migração", afirmou Tineke Strik, eurodeputada alemã dos verdes.
"Dois meses após a cerimónia de assinatura, não vemos grande implementação", acrescentou Jeroen Lenaers, eurodeputado neerlandês do centro-direita. "As chegadas continuam a aumentar e no terreno, na Tunísia, vemos poucos desenvolvimentos", acrecsentou.
O acordo polémico prevê 105 milhões de euros de ajuda da UE para travar a migração irregular através da repressão das operações de contrabando e do reforço da gestão das fronteiras. Inclui, ainda, cerca de 600 milhões de euros de apoio orçamental e investimentos estratégicos na economia tunisina.
Manfred Weber, o líder da bancada de centro-direita, considerou normal haver um aumento de migrantes imediatamente após a assinatura do acordo, mas disse acreditar que os números acabarão por diminuir.
A Comissão Europeia estimou, em julho, que 45 mil requerentes de asilo tinham deixado a Tunísia em direção à Europa, este ano, o que representa um forte aumento em relação aos anos anteriores.
Destes, estima-se que cerca de cinco mil sejam de origem tunisina, num sinal de que o país é procurado por pessoas de outras nacionalidades, nomeadamente de países da África sub-sahariana, para fazer a viagem pelo mar Mediterrâneo até à Europa.
Direitos humanos em risco
Vários eurodeputadis criticaram a Comissão Europeia por não ter reconhecido as evidências apresentadas por ativistas e agências da ONU sobre casos de tratamento abusivo contra os migrantes, por parte das autoridades tunisinas, incluindo expulsões ilegais, ódio racial e violações dos direitos humanos.
No início de agosto, 27 migrantes foram encontrados mortos em território líbio, perto da fronteira tunisina, dias depois de o ministro do Interior, Kamel Fekih, ter admitido que pequenos grupos de migrantes estavam a ser empurrados para a região desértica que faz fronteira com a Líbia e a Argélia.
"Todos nos lembramos da imagem dos cadáveres de uma mãe e da sua filha no deserto, pago pelo dinheiro europeu", disse Sophie in 't Veld, eurodeputada neerlandesa liberal.
"Isto é preocupante porque é uma das muitas tentativas inúteis de externalizar o controlo das fronteiras europeias, com grandes riscos para os direitos humanos", disse Brando Benifei, eurodeputado italiano do centro-esquerda.
"A UE que faz isto é uma UE perdida. É uma UE decadente. É uma UE que não defende a democracia e os direitos humanos", acrescentou Malin Björk, eurodeputada sueca da esquerda radical.
Esta não é a primeira vez que os eurodeputados criticam duramente a Comissão Europeia por se aproximar do presidente da Tunísia, Kaïs Saïed, que já abraçou conspirações de extrema-direita segundo as quais os imigrantes querem alterar a composição demográfica do país.
"Amanhã, neste mesmo sítio, a presidente Ursula von der Leyen vai afirmar, com palavras fortes, que defende, ferozmente, a democracia contra a autocracia", disse Tineke Strik, "mas, ao mesmo tempo, apresenta orgulhosamente acordos sujos com um ditador implacável".
A Europa "sonâmbula" numa crise migratória
Outros eurodeputados defenderam o acordo da Comissão Europeia como essencial para apoiar a gestão das fronteiras da UE face aos elevados níveis de migração, incluindo para travar a ação dos contrabandistas.
"Precisamos de cooperação externa. O Acordo UE-Tunísia é essencial para manter um controlo rigoroso das fronteiras da UE, para a nossa própria segurança e por razões humanitárias", afirmou Sara Skyttedal, eurodeputada do centro-direita sueca.
"Precisamos de trabalhar de forma decisiva a longo prazo e em todas as frentes. Precisamos de pôr em prática uma política de migração sustentável e comum e precisamos de aprofundar a cooperação com países como a Tunísia. Juntos, podemos fazer a diferença e salvar vidas que se perdem tragicamente no mar devido a uma política de migração hipócrita", acrescentou.
A migração deverá ser uma questão fundamental nas eleições europeias de 2024, bem como nas próximas eleições legislativas na Polónia (15 de outubro) e nos Países Baixos (11 de novembro).
A Comissão Europeia afirmou que pretende que o acordo de migração com a Tunísia se torne um modelo para acordos semelhantes com outros países do Norte de África.