Provedora de Justiça Europeia pede informações sobre acordo UE-Tunísia

A Presidente da Comissão Europeia, Ursula von der Leyen, deslocou-se em julho à Tunísia para concluir o controverso acordo.
A Presidente da Comissão Europeia, Ursula von der Leyen, deslocou-se em julho à Tunísia para concluir o controverso acordo. Direitos de autor AP/AP
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De  Jorge Liboreiro
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Artigo publicado originalmente em inglês

A Provedora de Justiça Europeia, Emily O'Reilly, pediu esclarecimentos sobre o controverso acordo entre a UE e a Tunísia, num contexto de preocupações crescentes sobre violações dos direitos humanos no país.

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O pedido de informações foi dirigido à Comissão Europeia, para que  explique que tipo de salvaguardas foram introduzidas no acordo para garantir que as autoridades tunisinas respeitam os direitos fundamentais nas suas operações para reduzir os fluxos migratórios irregulares com destino a países da União Europeia (UE).

A Comissão Europeia tem até 13 de dezembro para explicar se efetuou uma "avaliação de impacto" antes de concluir o acordo em nome de todos os Estados-membros da UE e como tenciona analisar esse impacto sobre os direitos humanos ao longo do tempo.

"A Provedora de Justiça também perguntou se a Comissão definiu critérios para suspender o financiamento se os direitos humanos não forem respeitados", afirmou, num comunicado de imprensa, observando que "foram levantadas preocupações sobre o acordo".

A carta surge um dia depois de a Tunísia ter recusado a entrada a uma delegação de cinco membros do Parlamento Europeu, o que aumenta ainda mais o escrutínio sobre o polémico acordo.

O acordo UE-Tunísia permite afetar mais de 700 milhões de euros em fundos europeus para ajudar a Tunísia a estabilizar a sua economia, gerir a migração e impulsionar as energias renováveis, e inclui a possibilidade de ser dado um montante adicional de 900 milhões de euros, para assistência macrofinanceira.

"Abusos documentados" contra os migrantes

Embora ainda não tenha sido transferido qualquer montante, o acordo foi objeto de críticas intensas por parte do Parlamento Europeu e de organizações da sociedade civil.

As autoridades da Tunísia, sob a liderança do presidente Kais Saied, têm sido acusadas de violações dos direitos humanos e orquestrado a deportação violenta de migrantes subsarianos, muitos dos quais foram encontrados abandonados no meio do deserto, perto da fronteira com a Líbia.

Pouco depois da assinatura do acordo, o organização não-governamental Observatório de Direitos Humanos publicou um relatório que descrevia em pormenor os "abusos documentados" que as forças policiais tunisinas tinham cometido contra os estrangeiros negros, tais como "espancamentos, uso de força excessiva, alguns casos de tortura, prisões e detenções arbitrárias, expulsões coletivas, ações perigosas no mar, expulsões forçadas e roubo de dinheiro e de pertences".

Saied tem sido particularmente alvo de críticas, em particular desde que expressou publicamente as suas opiniões racistas sobre os migrantes subsarianos e denunciou aquilo a que chama um "plano criminoso para mudar a composição da paisagem demográfica da Tunísia", palavras que ecoam a teoria da conspiração de extrema-direita conhecida como a "grande substituição".

Apesar destes relatos, a Comissão Europeia avançou com a assinatura do memorando, em julho passado,  argumentando que era necessário estabelecer uma parceria mais estreita com um país que representa uma porta de entrada para milhares de migrantes que, todos os anos, tentam entrar no bloco, principalmente viajando pelo mar Mediterrâneo para Itália, e pedem asilo.

A presidente da Comissão Europeia, Ursula von der Leyen, considerou o acordo como um modelo para acordos semelhantes com países vizinhos.

"Assinámos uma parceria com a Tunísia que traz benefícios mútuos para além da migração, desde a energia e a educação, às competências e à segurança", disse von der Leyen no seu discurso sobre o estado da União. "E agora queremos trabalhar em acordos semelhantes com outros países."

105 milhões de euros para a migração

Especificamente, o memorando atribui um envelope financeiro de 105 milhões de euros para as operações de combate ao contrabando, reforço da gestão das fronteiras e aceleramento do regresso dos requerentes de asilo cujos pedidos foram recusados.

As verbas, que são o cerne das preocupações da Provedora de Justiça, deverá ser fornecido às autoridades tunisinas já materializado em bens - tais como barcos de busca e salvamento, jipes, radares e drones -, e subsídios para as organizações internacionais que trabalham no terreno, tais como a Organização Internacional para as Migrações (OIM) e a Agência das Nações Unidas para os Refugiados (ACNUR).

Para fazer a trasnferência desses 105 milhões de euros é preciso criar um instrumento jurídico, disse um porta-voz da Comissão Europeia, e os Estados-membros serão consultados durante todo o processo.

"Cooperaremos com a Provedoria de Justiça e responderemos oportunamente", disse o porta-voz, na sexta-feira. "Em termos gerais (...) todos os contratos da UE têm, obviamente, cláusulas-tipo sobre direitos humanos", acrescentou.

Os altos funcionários da UE disseram, anteriormente, que os pagamentos não estariam ligados a qualquer objetivo numérico de readmissões anuais ou de redução de chegadas, e que não seria pedido à Tunísia que acolhesse no seu território cidadãos não tunisinos a quem tivesse sido negado asilo no bloco.

"Não se prevê que a Tunísia seja um ponto de recolha de migrantes em situação irregular", afirmou um alto funcionário da UE em julho, falando sob condição de anonimato.

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