Espanha afirma que o apagão de abril foi causado por falhas na rede e por um planeamento deficiente, refutando a hipótese de ciberataque. Relatório apresentado pelo governo espanhol aponta falhas à Red Eléctrica e a operadores privados.
"Uma origem multifatorial" que resultou em "episódios de sobretensão, oscilações e desligamentos de centrais elétricas". É este o resumo de uma explicação há muito esperada - e também exigida pela Comissão Europeia - sobre as causas do apagão maciço de 28 de abril na Península Ibérica. O governo espanhol aponta o dedo a algumas empresas energéticas que gerem o abastecimento em Espanha, bem como ao operador público-privado que gere a rede, a Red Eléctrica (REE).
Na terça-feira, a ministra da Transição Ecológica e do Desafio Demográfico, Sara Aagesen, apresentou as principais conclusões de um complexo relatório técnico elaborado após 14 reuniões de um comité de análise, entre outros grupos de trabalho, com o objetivo de determinar as causas do acontecimento.
A terceira vice-presidente apontou duas conclusões fundamentais do relatório, que foi tornado público esta tarde: não houve ciberataques, nem no operador nem a outros níveis, mas foram detetadas "vulnerabilidades, falhas ou má configuração das medidas de segurança que podem expor as redes a riscos futuros".
Quarenta e nove dias após o apagão, Aagesen reconheceu que o sistema não tem "capacidade suficiente de controlo da tensão". Este é um ponto importante, uma vez que a Red Eléctrica tem vindo a solicitar à Comissão Nacional dos Mercados e da Concorrência (CNMC) desde 2021 que modifique os regulamentos que regem este aspeto, que a REE já considerava obsoletos na altura. Em novembro de 2024, três anos após estas queixas, a CNMC apresentou uma proposta de resolução que ainda não foi adotada pelo governo.
Aagesen também atribui culpas à Red Eléctrica, considerando que a empresa fez um planeamento inadequado do sistema, depois de uma das centrais, cuja empresa-mãe permanece anónima, se ter declarado "indisponível" na véspera do apagão.
"A REE decidiu reprogramar, mas não substituir, as necessidades do parque técnico nas horas centrais do dia 28", afirmou.
Na sequência deste mau planeamento provocado pela retirada de uma das centrais, as empresas de eletricidade - mais uma vez, sob anonimato a seu pedido -"não absorveram toda a (energia) reativa que estava prevista", explicou a ministra.
Equilibrando a repartição de responsabilidades entre os intervenientes, Aagesen reconheceu também que várias companhias de eletricidade telefonaram à REE alertando para as variações de tensão que já estavam a ser detetadas. Um total de três episódios anteriores (às 12:03, 12:16 e 12:19) alertaram os responsáveis pelo sistema. Quando tentaram encontrar uma solução, como a ligação de uma central suplementar à rede, já era demasiado tarde.
O corte de energia começou pouco depois do meio-dia de 28 de abril em Espanha e Portugal, cuja rede elétrica está ligada e, muitas vezes, dependente da espanhola, durou até ao anoitecer, perturbando empresas, sistemas de trânsito, redes celulares, conetividade à Internet e outras infraestruturas críticas.
A Espanha perdeu 15 gigawatts de eletricidade, ou seja, cerca de 60% do seu abastecimento.
Apenas os territórios insulares dos dois países foram poupados.
Nas semanas que se seguiram ao apagão, cidadãos e especialistas interrogaram-se sobre o que teria desencadeado o acontecimento, numa região que não é conhecida pelos cortes de eletricidade.
O apagão desencadeou um aceso debate sobre se os elevados níveis de energia renovável em Espanha e a insuficiente produção de energia a partir de centrais nucleares ou a gás teriam alguma coisa a ver com a falha da rede, o que o Governo negou repetidamente.