Raila Odinga: "As eleições não devem ser guerras"

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Os quenianos estão a preparar um referendo. A 4 de Agosto decidem se aceitam ou não a nova Constituição.

O esboço da Magna Carta foi elaborado pelo actual presidente Mwai Kibaki e pelo primeiro-ministro Raila Odinga. Uma aliança entre os dois principais rivais das eleições de Dezembro de dois mil e sete, obrigados a chegar a um compromisso depois da violência pós eleitoral que matou cerca de mil e quinhentos quenianos.

Desde o início, Kibaki e Odinga concordaram em alterar a Constituição, com o objectivo de encontrar um novo equilíbrio entre os poderes e evitar a repetição da onda de violência que se seguiu às últimas eleições. A euronews encontrou o primeiro-ministro Odinga durante uma visita a França.

Olaf Burns, euronews: Pode explicar-nos quais as grandes mudanças que esta Constituição vai provocar no Quénia?

Raila Odinga, primeiro-ministro do Quénia: Pela primeira vez, os quenianos vão ter um sistema presidencial, um puro sistema de governo presidencial, onde o presidente é eleito em conjunto com um vice-presidente, o chefe de Estado nomeia então o governo, que terá de ser aprovado pelo parlamento.

É uma clara separação entre o poder executivo, o poder legislativo e o poder judicial. Por isso dizemos que, pela primeira vez, os quenianos vão ter uma estrutura governativa, que vai garantir que haja controlos e equilíbrios no sistema. Vai garantir que os abusos de poder, que vimos no passado associados ao autoritarismo e às presidências imperiais, fazem parte do passado.

euronews: Mas uma presidência forte não será, para um homem forte, uma tentação para monopolizar o poder?

Raila Odinga: Não necessariamente. No passado, o poder deixou a periferia e foi transferido para o centro, graças a emendas constitucionais que tornaram a presidência tão poderosa que diminuiu as instituições governativas, porque não havia outros controlos. Na actual proposição constitucional, em primeiro lugar, há um poder legislativo, o parlamento, a quem são dados poderes alargados.

Todas as nomeações presidenciais, para os principais cargos do Estado, ficam sujeitas ao veto do parlamento. Neste esboço da Constituição, os controlos previstos são semelhantes aos que constam na Constituição americana.

euronews: Se o Quénia criar uma presidência forte, alguém tem de ser escolhido para ocupar o lugar. Estão previstas eleições para breve?

Raila Odinga: Se a nova Constituição for adoptada serão realizadas até Agosto de 2012. Isso significa eleições gerais, ou seja, eleições autárquicas, regionais, senatoriais, legislativas e presidenciais.

euronews: Vai candidatar-se novamente à presidência?

Raila Odinga: Não sei se vou candidatar-me, porque temos um sistema multipartidário. Para que alguém possa candidatar-se tem de ser nomeado pelo seu partido político. Por isso, se o meu partido me nomear então estarei pronto a avançar. Se não, irei apoiar quem quer que seja nomeado.

euronews: Pensa que o perdedor vai estar preparado para aceitar a derrota?

Raila Odinga: É isso que estamos a tentar clarificar agora, que os perdedores estejam preparados para aceitar a derrota, porque as eleições vão ser justas. Tem acontecido que as eleições são, por vezes, fraudulentas e é, por isso, que, em muitos países africanos, as pessoas não conseguem aceitar a derrota.

Agora, estamos a tentar ensinar aos africanos, para que compreendam as lições de democracia, que em qualquer eleição, em qualquer concurso, tem de haver vencedores e vencidos. Mas se perder de forma justa não é o fim do jogo. O perdedor deverá apoiar o vencedor e acabará por ganhar um dia, no futuro. É assim que se constrói a democracia.

As eleições não devem ser guerras, devem ser apenas competições semelhantes a qualquer outro jogo, como o futebol. O vencedor deve estar preparado para apertar a mão ao derrotado.

euronews: A seca dos últimos anos provou que o Quénia é extremamente sensível às mudanças climáticas. O seu país pretende desempenhar o papel de líder para tornar África verde. Qual é a sua agenda ecológica?

Raila Odinga: A nossa agenda ecológica é razoavelmente abrangente. Estamos à procura de fontes de energia renováveis, em oposição ao uso dos combustíveis fôsseis. Neste ponto, as nossas opções são: primeira, a energia geotérmica. Acontece que somos um dos países afortunados, graças ao Vale de Rift e ao seu potencial geotérmico. Estima-se que existam sete mil megawatts no Vale de Rift.

Há depois o vento. Temos um mapa do vento do país e ele mostra que temos boas velocidades em várias partes do país. Estamos a tentar introduzir as turbinas eólicas para produzir electricidade. Está já a ser desenvolvido um projecto para 400 megawatts.

Há também o sol. Como sabe, o Quénia situa-se exactamente na linha do Equador, com uma base diária de 12 horas de sol. Esperamos que este seja o caminho para que África possa contribuir de forma importante para a luta contra o aquecimento global.

euronews: Para os cidadãos pobres de um país pobre será que as questões ambientais são uma prioridade? Não seria, antes, o desenvolvimento industrial?

Raila Odinga: Os países que hoje são industrializados foram pioneiros. Na altura não conheciam as consequências da industrialização. O que dizemos é que os países que estão em vias de desenvolvimento, conhecendo as consequências, não devem repetir os erros que foram cometidos no passado. Sim, dizemos que o objectivo é o desenvolvimento industrial, mas podemos consegui-lo através das energias renováveis.

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