A Mafia é uma ameaça para toda a Europa, e não só para alguns países. A votação de quarta-feira, no Parlamento Europeu, em Estrasburgo, estabelece a necessidade de contraste, como exigido no relatório da Comissão Europeia antimafia.
A ‘Ndrangheta é uma das mafias mais poderosas do mundo e a sua riqueza é, neste momento, uma grave ameaça para a democracia. Depois de uma breve análise, falamos com o maior especialista nesta área, o procurador-adjunto Nicola Gratteri, em Reggio Calabria.
Perto de uma pizzaria desta cidade alemã, seis italianos foram abatidos num ajuste de contas entre clãs de San Luca, os Pelle-Votari e os Nirta-Strangio.
Para gerir a investigação, criou-se uma unidade especial italo-alemã, que conseguiu prender, em San Luca, os assassinos e os cúmplices.
Subestimada e considerada, durante muito tempo, uma organização rural, muito menos importante do que a Mafia siciliana, a ‘Ndrangheta ou “Onorata Società” fortaleceu-se e passou a ser uma ameaça global.
Da Calabria original, no sul de Itália, conseguiu estender os tentáculos a outros países, aproveitando-se das comunidades de italianos emigrantes para criar bases no estrangeiro.
Atualmente, a ‘Ndrangheta opera na Europa, na Alemanha, na Espanha, na Holanda, na França, na Bélgica e na Suíça. Também chegou ao Canadá, aos Estados Unidos e à Colômbia, tendo ainda ramificações na Austrália.
Numa das operações anti-droga descobriu-se o seu alcance e potencial. Realizada simultaneamente, em setembro de 2008, na Itália, nos Estados Unidos e na América Latina, saldou-se em 200 detenções e a apreensão de 57 milhões de dólares e mais de 16 toneladas de cocaína.
O narcotráfico é o seu principal negócio. Especialmente o de cocaína.
Dos 44 mil milhões de euros que a ‘Ndrangheta encaixa anualmente, 62% é produto da venda de cocaína.
Mas a ‘Ndrangheta também acedeu à economia legal. Um dos setores em que está presente é o da gestão de resíduos, que oferece importantes lucros com baixo risco. A organização tem uma enorme capacidade para corromper e beneficiar de fundos públicos.
Também investe no setor imobiliário, útil para a lavagem de dinheiro. No entanto, a este nível as autoridades podem recorrer à confiscação de bens, o que se está a tornar menos atraente.
Nicola Gratteri, procurador-adjunto em Reggio di Calabria, e o maior especialista em ‘Ndrangheta, alerta para o perigo que representa esta organiza4ão para a democracia em geral.
euronews – Como se pode explicar o que é a quem ignora?
NG – Atualmente é muito mais difícil lutar contra o crime organizado, porque os mafiosos lograram chegar aos altos cargos públicos, ao mundo dos negócios, a toda a economia. Quando os meus colegas dizem que estamos a derrotar a Mafia, que a Mafia está com problemas, eu peço-lhes para se calarem, para o feitiço não se virar contra o feiticeiro.
euronews – A ‘Ndrangheta controla o tráfico de cocaína na Europa. Pode quantificar-se o seu poder económico?
NG – Hoje, adquire-se cocaína com uma pureza de 98% na Colômbia ou na Bolívia, a 1000 euros o quilo, e depois corta-se até obter uns quatro quilos e meio, para se venderem nas ruas de Europa a 50 euros por grama. Não há nenhuma atividade, lícita ou ilícita, que seja mais rentável.
Depois, todo esse dinheiro é investido desde Roma até à zona mais rica da Europa, na Alemanha, na Bélgica, na Holanda, especialmente no setor imobiliário.
Quando, em qualquer rua de Europa, a ‘Ndrangheta compra um hotel, um restaurante, uma pizzaria, a organização zela para não acontecer nada nessa rua, por duas razões: para não suscitar a curiosidade da polícia e, porque se algo ocorrer, o bem pode desvalorizar.
Por isso a opinião pública não sabe nada, vê apenas que é uma rua ou uma cidade tranquila e que tudo corre bem, mas não é verdade.
euronews – Porque acha que a lavagem de dinheiro é uma ameaça para a democracia?
NG – E se essa gente, que já está a comprar no setor imobiliário e a investir no setor serviços, começa também a comprar, ou já tem, jornais e canais de televisão?
É óbvio que esses meios de comunicação podem influir no modo de pensar, na cultura ou na ideologia das pessoas. Pode haver manipulação mafiosa sem que o público se dê conta.
Por exemplo, sobre a especulação imobiliária, podem bombardear a população com mensagens que sirvam os seus interesses, mesmo através de uma televisão local ou um jornal. Este é o tipo de manipulação da informação que a Mafia faz.