Vítimas do fisco satisfeitas com queda do governo de Mark Rutte

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De  Francisco Marques com AP
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Executivo dos Países Baixos vai manter-se em gestão até às eleições de março, mas atual primeiro-ministro continua a liderar as sondagens do sufrágio e continuar a governar

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O governo dos Países Baixos vai manter-se em gestão até às eleições de março após a demissão precipitada pelo escândalo na gestão dos abonos que prejudicou mais de 25 mil famílias.

Entre os prejudicados, Janet Ramesar, hoje com 35 anos, viu-se obrigada a devolver o apoio recebido durante cinco anos para a creche do filho, foi acusada de fraude, multada pelo fisco, teve de deixar de estudar, perdeu o emprego numa agência de serviços financeiros porque era incompatível com o facto de se ter endividado e acabou por perder também a custódia do filho.

Janet Ramesar acusou Mark Rutte de ter prejudicado a vida a muitos "pais enganados, filhos e netos" -- "alguns já são avós", escreveu no Twitter -- e de ter contribuído para "três gerações de miséria".

Agora, diz ser "muito importante" para ela este desfecho porque “confirma quem de facto errou" diz que "o governo deve ser responsabilizado por isso” porque "não se tratou de um pequeno erro”.

“Se não se demitissem iria parecer que estavam de bem com o sucedido e que tudo iria passar com um pedido de desculpa, mas para isto tem de haver consequências”, acrescenta esta mãe, assumindo-se também vítima de descriminação racial, num processo que a afeta há quase 10 anos.

Tenho o meu ficheiro, onde podemos ler coisas como 'mãe solteira' e a minha etnicidade está assinalada como indiana, apesar de ter nascido nos Países Baixos e os meus pais serem do Suriname.

"Sempre acreditei em mim mesma, mas o racismo está aqui e vê-lo magoa.
Janet Ramesar
Vítima do fisco dos Países Baixos

Os serviços tributários holandeses admitiram que cerca de 11 mil famílias com dupla nacionalidade tinham sido especialmente escrutinadas .

Janet Ramesar faz parte de um grupo de quase duas dezenas de queixosos contra cinco altos responsáveis deste e dos anteriores dois governos liderados por Mark Rutte, primeiro-ministro dos Países Baixos desde 2010.

Cerca de 10 mil famílias afetadas vão ser compensadas com cerca de €30 mil pelos prejuízos sofridos, de um fundo de compensações de €500 milhões criado pelo governo em março, mas para muitas das vítimas os danos foram muito superiores.

Janet Ramesar admite já ter sido "parcialmente indemnizada", mas acrescenta ter "ainda de comparecer perante uma comissão para discutir os danos materiais e imateriais" provocados pelo processo do fisco.

Roger Derikx, de 49 anos, foi outra vítima e chegou a tal ponto de desespero que em dezembro de 2019 invadiu uma sessão no Parlamento holandês para acusar a autoridade tributária de lhe ter destruído a vida, ao persegui-lo por causa de €60 mil de abonos para os dois filhos e isso lhe ter destruído o casamento.

"Os serviços de impostos contactaram os clientes da minha empresa e eu fui despedido. Eles tiraram-nos tudo e isto não pode voltar a acontecer. Queremos justiça, queremos a nossa dignidade de volta e queremos o nosso dinheiro devolvido", afirmou Roger Deriks, citado pelo DutchNews.

Kristie Rongen, de 45 anos, também faz parte do grupo de queixosos, tem três filhos e a dívida total em que se afundou chegou aos €92 mil.

Tive de entrar num programa de alívio de dívida e fui apelidada de 'burlona'. Fiquei sozinha e sem trabalho durante dois anos.

"Precisei de ajuda psiquiátrica e a minha filha mais nova ameaçou suicidar-se. Por vezes tive de mandar os meus filhos para a cama apenas com pão e manteiga no estômago porque não tínhamos nada mais para comer.

"Fui quase despejada, mas o meu empregador pagou-me a renda.
Kristie Rongen
Vítima do fisco dos Países Baixos

"O que nós, pais, queremos é que Mark Rutte se demita e que não volte", defendeu Kristie Rongen, mas esse desejo no parece alinhado com as estrelas.

Mark Rutte assumiu de facto a responsabilidade e demitiu o Governo, mas as sondagens indicam que em março poderá voltar a ganhar as eleições e formar um novo executivo para continuar a governar os Países Baixos.

Outras fontes • DutchNews, De Telegraaf

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