Na Alemanha, o carvão engole aldeias. As aldeias não querem mais

Access to the comments Comentários
De  Hans von der Brelie  & Euronews
Witness
Witness   -  Direitos de autor  euronews

Garzweiler II é uma das maiores minas a céu aberto do mundo. Fica na Renânia, região alemã de subsolos ricos em linhite, um tipo de carvão fóssil do qual o país ainda depende do ponto de vista energético. Enquanto em Berlim se discute a transição para energias mais limpas, várias aldeias estão a ser dizimadas para dar lugar à extração. No local, habitantes e ativistas uniram esforços para travar as escavadoras.

A poucos dias da cimeira COP26, em Glasgow, os partidos políticos reúnem-se em Berlim para formar um novo governo de coligação. Mas o futuro do carvão, em cima da mesa de negociações, ainda divide Social-Democratas (SPD), Verdes e Liberais (FDP).

Protestos na mina

Ao longo dos últimos anos, os verões quentes alternados com chuvas torrenciais, acordaram parte do país para uma nova realidade: os efeitos da climática estão cada vez mais próximos e recorrentes.

Se todas as centenas de milhões de toneladas de linhite fossem extraídas e queimadas, a Alemanha não cumpriria o seu objetivo climático. Atualmente a data limite para o país abandonar o carvão é 2038. Mais de 15 anos que os ativistas não querem esperar.

Para pôr fim à extração no local, um protesto secreto tomou conta de Garzweiler, durante a noite. Uma enorme escavadora e duas empilhadoras foram paralisadas por 21 ativistas, que, divididos em três grupos, se esgueiraram até ao local e imobilizaram as máquinas. Alguns, acorrentaram-se no topo.

Em vídeos feitos pelos próprios manifestantes, ouve-se um membro do grupo gritar "Fim do carvão, já!", para grande entusiasmo dos restantes.

Aldeias engolidas por escavadoras

Fora da mina, a aldeia de Lützerath acolhe um acampamento de protesto. A localidade é uma das seis sob séria ameaça de deixar de existir para dar lugar à expansão da mina. 

Lara e Sarah estão entre os manifestantes e concordam em colocar-nos em contacto direto, via telefone, para uma uma breve entrevista aos ativistas ainda acorrentados às escavadoras.

Perguntamos o que pretendem com este protesto.

"As nossas exigências são obviamente que o carvão seja eliminado o mais rapidamente possível. Não é aceitável que a eliminação progressiva do carvão esteja prevista para 2038 e aldeias como Lützerath continuem a ser destruídas", respondem.

Lützerath já quase não tem habitantes. Muitos dos que vivem nestes locais na mira da atividade mineira acabam por aceder a ofertas de expropriação e ser realojados. Igrejas são desconsagradas, hospitais demolidos, cemitérios transladados.

Assim aconteceu com a povoação de Immerath, onde, no entanto, há quem defenda a manutenção do carvão. A alguns preocupa a perda de postos de trabalho, Johannes Ermisch, realojado na nova Immerath. pura e simplesmente não concebe um futuro próximo movido a outro tipo de energia.

"Deixamos o carvão e depois? Confiar na energia eólica para alimentar as nossas casas e os nossos carros a eletricidade não vai funcionar. Sugiro que se adie a eliminação progressiva durante o maior tempo possível", afirma.

A esperança é a última a morrer

Em Lützerath, os ativistas param um camião e bloqueiam a estrada. A polícia pede reforços adicionais, mas o chefe de operações acaba por decidir enviar agentes para falar com os manifestantes, numa tentativa de acalmar os ânimos.

Habitantes locais juntam-se aos ativistas e optam por dar um passeio pela aldeia. O protesto termina de forma pacífica, mas a incerteza mantém-se. Sobreviverá Lützerath à fome demolidora das escavadoras?

O ritmo lento do abandono do carvão pela Alemanha abrandou a transição energética europeia. Mas a situação ainda pode mudar. Os partidos do provável executivo de coligação estão a discutir um documento exploratório preliminar para o seu futuro contrato governamental, mencionando pela primeira vez 2030 como uma opção para o país deixar de lado o carvão.

Na assinatura desse documento reside uma réstia de esperança para todos os ativistas pelo clima e para muitos dos habitantes de Lützerath, Keyenberg, ou Kuckum, que esperam que as suas aldeias permaneçam de pé sobre as camadas de linhite.